Correção: Diego Gabriel da Silva tem 29 anos e não 30 como publicado entre 18h04min de 13 de junho e 11h46min de 1º de agosto. O texto abaixo está corrigido.
A probabilidade cada vez mais evidente de que Samuel Eberth de Melo, 41 anos, tivesse sido vítima de um crime levou a Polícia Civil do RS a assumir um compromisso com a família do empresário de Minas Gerais: empreender todos os esforços para encontrar o corpo da vítima. Após conseguir cumprir a promessa — o cadáver foi localizado no último fim de semana na área rural de Santo Antônio da Patrulha, no Litoral Norte — a investigação do desaparecimento entra numa segunda fase. O intuito agora é detalhar o que está por trás do assassinato e qual a participação de cada um dos suspeitos.
O sumiço de Melo chegou ao conhecimento da polícia gaúcha na manhã do sábado, dia 3. Na tarde anterior, ele tinha parado de responder mensagens de amigos e familiares. A partir de então, os policiais passaram a tentar descobrir o paradeiro do mineiro, que viajou ao RS para encontrar um parceiro comercial em Novo Hamburgo, no Vale do Sinos. Diego Gabriel da Silva, 29, tornou-se suspeito do desaparecimento e foi preso. Um outro homem, investigado como possível comparsa, também foi identificado e detido. Os dois tiveram prisão preventiva decretada pela Justiça. A defesa deles nega que tenham envolvimento no crime.
Um dos intuitos da investigação no momento é entender a participação de cada um deles no crime. Quando foi ouvido, Silva alegou que esteve com o empresário, mas que depois Melo teria viajado para a Serra — a versão foi descartada pela polícia. Num segundo momento, quando foi indagado novamente, apresentou contradições, conforme a polícia, e não quis mais colaborar com a apuração. Essa postura aumentou as suspeitas sobre uma possível participação do parceiro comercial no sumiço de Melo.
— O empresário gaúcho tinha a confiança da vítima. Ficou naquele momento um cenário inclinado de participação dele no sumiço do empresário mineiro — afirma o diretor do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), delegado Mario Souza.
Ainda durante a apuração, foram localizadas imagens nas quais um homem aparece comprando duas pás, uma enxada, três metros de lona e um par de luvas às 15h15min do dia 2, numa loja de Santo Antônio da Patrulha. Os investigadores identificaram esse comprador como sendo Silva. A nota da compra, no valor de R$ 234,20, foi apreendida.
A polícia suspeita que neste momento o empresário já pudesse estar morto — desde o começo da tarde ele não respondia mais ao telefone. A lona adquirida tem exatamente a mesma metragem da que enrolava o cadáver, segundo a polícia. As pás foram encaminhadas para análise pericial.
Além disso, durante as buscas na casa do suspeito foram apreendidos dois carregadores de pistola com munição. No mesmo dia, foi realizada análise do Instituto-Geral de Perícias (IGP) em dois veículos, nos quais foram encontrados vestígios compatíveis com sangue.
Em relação ao investigado como possível comparsa, a polícia não detalhou até o momento como chegou ao nome dele — que não foi divulgado. A função dele no sumiço e no crime ainda é apurada.
R$ 5 milhões em veículos
Até o momento, a polícia descobriu que Melo e Silva se conheceram durante a negociação de veículos e acabaram se tornando amigos e parceiros comerciais. Silva teria adquirido a confiança do empresário mineiro. Em razão disso, veículos passaram a ser enviados ao RS para que fossem negociados por ele.
— Eles se visitavam. O mineiro veio algumas vezes ao Estado. Eles teriam ido a alguns eventos juntos, se tratavam bem, almoçavam juntos. Tinham uma relação de confiança, que envolvia uma alta quantia de dinheiro — explica Souza.
Nesta segunda fase, a polícia busca localizar todos os veículos que foram encaminhados pelo empresário mineiro ao parceiro comercial no RS. A informação inicial era de que se tratava de 44 carros, cujos valores somados chegariam a cerca de R$ 5 milhões. Os automóveis variam entre modelos populares e de luxo. A polícia não descarta, no entanto, que o número de carros seja maior.
— Já sabemos de vários veículos onde estão. Os donos das garagens (onde estão alguns carros que seriam comercializados) estão colaborando para a entrega. Nossa linha agora é entender essa parte econômica, financeira. Vamos conferir se havia dinheiro dele (da vítima) em algum local no RS, e apurar também se há possível lavagem de dinheiro ou crime tributário por parte do empresário gaúcho — afirma o delegado.
A motivação para o assassinato ainda é averiguada. Conforme Souza, o parceiro comercial tinha passagem policial por estelionato. Uma das suspeitas é de que o mineiro possa ter sido vítima de um golpe, do qual não tenha se dado conta. A hipótese é que Silva não estivesse repassando o valor obtido com a venda dos carros e que isso teria gerado um desacerto entre eles. Uma das possibilidades apuradas é a de que o crime possa ter sido cometido como forma de extinguir a dívida que o suspeito teria com Melo.
— A compra da lona mostra que ele (Silva) se preocupou em ocultar o cadáver, tentou enterrar e, possivelmente, o chão era muito duro. A segunda fase vai trazer todos os detalhes em relação a essas possibilidades. É provável que ele tenha planejado esse crime — afirma o delegado Souza.
O inquérito tem prazo de 10 dias para ser concluído, a contar da data da prisão do investigado, mas a polícia deve pedir a prorrogação. Além dos dois presos, a investigação apura se há participação de outras pessoas no crime.
Como a polícia localizou o corpo
Quando Melo desapareceu, a polícia foi informada por meio do relato de familiares que ele havia se hospedado em Novo Hamburgo, e tinha deixado de responder as mensagens na tarde da sexta-feira, dia 2. A informação inicial era de que ele tinha viajado ao Estado para buscar 11 veículos com um parceiro comercial. Uma das primeiras medidas foi refazer o trajeto dele no RS. O fato de ele não ter familiares e nem uma rotina estabelecida no Estado tornava a apuração mais complexa.
O empresário chegou ao RS de avião, então uma das possibilidades era de que ele estivesse usando um dos veículos que havia enviado para comercializar ou estivesse se deslocando na companhia do parceiro comercial. Por meio de imagens de câmeras, a polícia descobriu que eles realmente estiveram juntos, chegaram a almoçar e visitaram algumas garagens onde havia carros à venda. Em áudios enviados à família, o mineiro deixou transparecer que estava descontente com a situação que havia encontrado em Novo Hamburgo. Naquele primeiro momento, o foco da polícia era encontrar Melo.
Quando foi ouvido, Silva alegou que o mineiro havia viajado para a Serra. Ao longo da apuração, segundo a polícia, ele parou de colaborar. A possibilidade de um sequestro, por exemplo, perdeu força, já que não houve pedido de resgate. As equipes foram divididas entre uma que fazia as buscas ao empresário e outra com foco num possível crime. Silva foi preso ainda no primeiro fim de semana após o sumiço, na casa que mantinha em Santo Antônio da Patrulha. Logo depois, foi preso o homem apontado como comparsa.
Ainda assim, os policiais seguiam sem respostas para o paradeiro do empresário. A operação de busca, que chegou a reunir mais de cem policiais, contou com apoio da Brigada Militar e do Corpo de Bombeiros. Uma das informações recebidas apontava para uma casa abandonada em Santo Antônio da Patrulha. Todas as casas nessa situação foram reviradas e, dentro de uma delas, foi encontrado um par de óculos. Um dos agentes identificou o acessório como sendo o mesmo usado por Melo. As buscas seguiram ao longo dos dias, mas nenhuma outra pista foi achada.
No fim de semana, quando as equipes já estavam exaustas, houve a decisão de fazer uma nova procura, focada no entorno da casa onde tinham sido encontrados os óculos. Já durante a noite, um dos policiais deparou com uma lona, oculta sob caliças e telhas, próximo de um riacho. Com a chegada do IGP, houve a confirmação de que se tratava do corpo de Melo.
O empresário, que era pai de três filhos, foi sepultado no início da tarde desta terça-feira no cemitério Parque da Colina em Belo Horizonte, Minas Gerais. A família dele até o momento optou por não falar com a imprensa.
Contraponto
A advogada Thais Rodrigues, que representa os dois presos, nega que eles tenham participação no desaparecimento. Em relação a Diego Gabriel da Silva, diz que ele "se declarou inocente de todas as imputações" e que "afirma que não possuía nenhum desacordo comercial com a vítima".
Sobre os antecedentes por estelionato, a advogada confirmou que o cliente possui passagens por esse tipo de crime. Alegou, porém, que "esses processos estão ainda em curso" e que "Diego não possui condenação por nenhum crime; portanto ele é tecnicamente primário".
Em relação ao outro preso, argumenta que "este rapaz nunca realizou nenhum tipo de negócio com a vítima e também se declarou inocente".