Após quase 11 horas, foi encerrado na noite desta quarta-feira (22), o primeiro dia do julgamento de três réus acusados da morte de Ronei Wilson Jurkfitz Faleiro Júnior, de 17 anos. O júri ocorre em Charqueadas, na Região Carbonífera, cidade onde o adolescente vivia na época do crime. Em 1º de agosto de 2015, o estudante morreu após ser agredido, inclusive com garrafadas, na saída de uma festa na qual arrecadava fundos para a formatura do Ensino Médio. Foram ouvidas quatro pessoas: o pai da vítima, um casal de amigos e o delegado que investigou o caso.
São julgados neste primeiro de três júris os réus Peterson Patric Silveira Oliveira, Vinicius Adonai Carvalho da Silva e Leonardo Macedo da Cunha. A primeira etapa do dia foi o sorteio dos jurados: quatro homens e três mulheres. O juiz Jonathan Cassou dos Santos, da 1ª Vara Judicial da comarca, é quem preside o júri. Na sala de audiências, somente familiares, representante da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a imprensa do Tribunal de Justiça acompanham a sessão. O julgamento é transmitido em tempo real pela internet.
O primeiro a depor no fim da manhã, num relato bastante emocionado, foi Ronei Wilson Jurkfitz Faleiro, pai do adolescente. O engenheiro também consta no processo como uma das vítimas de tentativa de homicídio. Ele lembrou que foi ao local para dar uma carona para dois amigos do filho, quando os agressores partiram para cima deles. O pai relatou que seu primeiro movimento foi tentar sair de carro, mas as portas eram forçadas e garrafas eram lançadas. Ele contou que conseguiu descer do veículo, mas não interromper as agressões, que seguiram até que ele conseguiu partir do local com o filho e os dois amigos direto ao hospital. O pai descreveu aquelas que foram as últimas palavras de Ronei Júnior:
— Ele olhou para mim e disse: "jura pra mim que tu não está machucado". Essa foi a última frase do meu filho — narrou.
Ao ser questionado pelo juiz sobre a madrugada do crime, o pai afirmou:
— Meu filho foi julgado, sentenciado e executado na calçada — disse, aos prantos.
Além de falar sobre as agressões sofridas pelo filho, o engenheiro relatou como ele e a esposa, a mãe de Ronei Júnior, enfrentam o drama da perda do adolescente. Disse que após o crime eles se mudaram de Charqueadas e, na nova casa, reproduziram o quarto do filho, com os objetos deixados por ele. O relato do pai se estendeu por mais de duas horas, até pouco depois das 14h.
Amigos ouvidos
Um casal de amigos que acompanhava Ronei Júnior na madrugada em que ele foi morto foram ouvidos durante a tarde. Os dois, assim como o pai do adolescente, são considerados vítimas de tentativa de homicídio, por também terem sido agredidos. O primeiro a depor foi Richard Saraiva de Almeida, que começou a falar pouco antes das 16h, após o intervalo para o almoço. Este depoimento não foi transmitido pelo Tribunal de Justiça a pedido da própria vítima. Na época do fato, Richard era namorado de Francielle Wienke, colega de escola de Ronei Júnior. O depoimento dele durou cerca de uma hora. Logo depois, após intervalo de cerca de 10 minutos, teve início o depoimento de Francielle.
Assim como Richard, a jovem também pediu que seu relato não tivesse transmissão em áudio e vídeo. No Twitter do TJ, trechos do depoimento dela foram transcritos.
— A gente não pensou que ia acontecer uma coisa ruim — disse a jovem sobre a realização da festa.
Ela contou que tanto ela, como Ronei Júnior, faziam parte da organização do evento que arrecadaria fundos para a formatura deles no Ensino Médio. Sobre o momento das agressões, ela relatou que na saída da festa, no final das escadas do Clube Tiradentes, ouviu um grito e pessoas se aproximando. A jovem se emocionou e chorou ao narrar os fatos daquela madrugada. Ela precisou tomar água antes de seguir como o depoimento.
— Era muita gente correndo na minha direção, e corri para dentro do carro para me proteger — descreveu sobre o momento em que ingressou no carro do pai de Ronei Júnior, que havia ido buscar o filho e os amigos dele na saída da festa.
Francielle afirmou que no momento em que o carro arrancou o veículo ainda estava com uma porta aberta. Com o término do depoimento da jovem, por volta das 18h20min foi realizado intervalo de 30 minutos. Com a fala dela, encerraram-se os relatos das vítimas e o julgamento passa agora para a oitiva de sete testemunhas – houve desistência de parte das pessoas que estavam arroladas para serem ouvidas.
Investigação
Às 19h, passou a ser ouvido o delegado Rodrigo Reis, que foi o responsável pela investigação do crime na época. O delegado iniciou o depoimento narrando como as testemunhas descreveram as agressões. Segundo o policial, tanto Ronei Júnior, como o casal de amigos e o pai dele tentaram escapar correndo para dentro do carro e chegaram a se refugiar dentro do veículo, mas, mesmo assim, foram cercados e agredidos, com garrafadas, voadoras, chutes e socos.
— Todos os nove acusados e mais sete adolescentes arremessavam garrafas, desferiam chutes, voadoras, tudo que é tipo de agressão que podiam cometer naquele momento, cometiam contra todas as vítimas. O pai do Ronei Júnior tentava partir para fora, era arrancado para fora, era agredido — narrou o delegado, com base no depoimento das testemunhas ouvidas durante a apuração.
Reis afirmou ainda que em seu entendimento o fato foi premeditado, já que no momento em que Ronei Júnior e os amigos ainda estavam dentro da festa os réus já estariam do lado de fora se preparando para agredir Richard.
— A motivação do fato ficou bem cristalino. Era uma rixa existente entre os moradores de Charqueadas e São Jerônimo e o Richard era morador de São Jerônimo. Já iniciaram as ameaças dentro da festa e depois resultaram nas agressões do lado de fora — afirmou.
O delegado disse ainda que os réus integravam um grupo chamado Bonde da Aba Reta, que já havia se envolvido em outros delitos no município e em brigas dentro de festas.
— Todo morador de Charqueadas sabia que mais cedo ou mais tarde, eles iam acabar matando alguém, como aconteceu com o Ronei Júnior — disse o policial.
Reis relatou ainda que no dia posterior ao crime a polícia fez levantamento junto ao veículo do pai de Ronei Júnior e foi encontrado sangue no veículo. Para o delegado, isso denota a gravidade das agressões praticadas contra o adolescente. Ainda conforme o policial, a morte da vítima se deu por traumatismo craniano e hemorragia em razão das lesões.
— Não havia diálogo, só pancadaria — afirmou.
Houve ao fim do depoimento do delegado uma pergunta realizada pelos jurados se havia algum motivo para que Ronei Junior e o pai tenham sido agredidos.
— Nada que tivesse havido na festa ou antes que justificasse que Ronei ou Ronei Junior fossem agredidos — disse o policial.
O depoimento do delegado foi o último ouvido na noite desta quarta-feira, quando a sessão foi encerrada por volta das 21h.
O júri deve ser retomado na manhã de quinta-feira (23), às 9h com os depoimentos de outras testemunhas. Até sexta-feira, devem ser ouvidas pelo menos 10 pessoas, entre vítimas e testemunhas. Depois, serão interrogados os três réus. A previsão é de que na sexta-feira, os sete jurados decidam se os três réus são ou não culpados pelos crimes.
Os demais júris estão marcados para 4 de julho (réus Alisson Barbosa Cavalheiro, Geovani Silva de Souza e Volnei Pereira de Araújo) e 11 de julho (réus Matheus Simão Alves, Cristian Silveira Sampaio e Jhonata Paulino da Silva Hammes), ambos também com previsão de duração de três dias. Há, ainda, um décimo réu, que foi acusado posteriormente e responde por homicídio em processo separado.
O que dizem as defesas
Peterson Patric Silveira Oliveira
O advogado Diander Rocha enviou nota a GZH:
“A defesa de Peterson Oliveira tem boas expectativas em relação ao júri. Confiamos que a sociedade de Charqueadas ouvirá a nossa versão atentamente mais uma vez, assim como foi feito em 2020. Foram três dias de trabalho intenso e o corpo de jurados se manteve trabalhando arduamente. A atuação da defesa estará focada em analisar e confrontar as informações, provas e narrativas apresentadas pelo Ministério Público para que o processo tenha um desfecho justo”.
Leonardo Macedo da Cunha
O réu é representado pela defensora pública Tatiana Boeira. Ele sustenta que o óbito só ocorreu em razão de dois motivos:
— Morreu pelas garrafadas porque ele tinha uma doença e o atendimento no hospital foi inadequado — afirma Tatiana, que disse ter elementos suficientes para convencer os jurados desses argumentos.
Vinícius Silva
Para o advogado Celomar Cardozo, o caso não é de assassinato.
— Não se trata homicídio, mas sim de lesão corporal seguida de morte — sustenta o advogado, ao também citar a doença autoimune de Ronei.