Em 2020, as polícias que atuam no Rio Grande do Sul já registram grandes apreensões de drogas. Em uma das instituições, por exemplo, o número já é superior, mesmo em agosto, a todo ano de 2019, e em outras, atingiu quase 80% do total apreendido no ano passado inteiro. E também há polícias que estão focando suas atenções na desarticulação e descapitalização de organizações criminosas.
Todas as instituições são unânimes em dizer que o investimento em tecnologias, serviço de inteligência e treinamento de efetivo para esse tipo de ação têm feito com que as abordagens não sejam mais trabalhos aleatórios das polícias, mas, sim, apreensões que têm por trás uma investigação detalhada e cada vez integrada. Todos descartam também que o aumento das apreensões de entorpecentes tenha ligação com a pandemia. Neste caso, a única alteração se deu até agora pelo aumento das telentregas de drogas.
A Polícia Rodoviária Federal (PRF), por exemplo, já chegou – até agora – a um total de 19,4 toneladas de drogas apreendidas no Estado. Isso é três vezes mais do que todo o ano de 2016, e 26% maior do que o total de todo o ano passado. A Brigada Militar (BM), por sua vez, já retirou das mãos de traficantes quase oito toneladas de entorpecentes de janeiro a julho, o que é cerca de 70% do que foi apreendido em 2019. E a Polícia Civil, também até a metade do ano, apreendeu cerca de cinco toneladas, tendo o Departamento de Investigações do Narcotráfico (Denarc) realizado a maior apreensão da história em 2020. A maconha foi a droga mais apreendida.
A Polícia Federal (PF), assim como a Civil, também tem como alvo os líderes das facções criminosas e o combate à lavagem de dinheiro para descapitalizar os investigados. Mesmo assim, a PF dobrou o número de apreensões de cocaína, por exemplo, no primeiro semestre de 2020 em relação ao mesmo período de 2019.
Números expressivos
Para o sociólogo e professor Rodrigo Azevedo, especialista na área de segurança, os números apresentados pelas polícias são significativos.
– Isso é um fenômeno a ser examinado, mas ainda difícil relacionar com consumo. Está mais relacionado a como a polícia se organiza, como o setor de inteligência age. Mas essa é apenas uma pequena parte do que circula, me referindo à apreensão de drogas. Quando aumenta a quantidade de entorpecentes localizada, esta ação está vinculada mais com a forma de atuação dos agentes do que com a demanda – ressalta Azevedo.
Sobre a hipótese da demanda ser maior em virtude da pandemia, o sociólogo diz que isso precisa ser aferido mais detalhadamente. Segundo Azevedo, em uma análise inicial, a forma como as polícias estão trabalhando está fazendo a diferença. São as operações e abordagens com informação apurada pelos setores de inteligência.
PRF
O inspetor Felipe Barth, da PRF, diz que houve investimentos em tecnologia e treinamento dos policiais nos últimos anos. Essas medidas fizeram com que os agentes – tanto em operações quanto em ações do dia – atuem cada vez mais orientados e com abordagens mais focadas.
– Apesar das drogas serem transportadas cada vez mais escondidas, o investimento no treinamento dos policiais os capacita ainda mais para encontrá-las – afirma Barth, destacando que, além da grande quantidade de maconha localizada, também ocorre apreensão de cocaína, e houve elevação no número de prisões.
Segundo a PF, muitas das apreensões da PRF também foram resultado da integração — por parte da investigação — entre as duas polícias.
Brigada Militar
Até o mês de julho, se for contabilizar apenas cocaína, a BM já apreendeu pouco mais de 650 quilos, o que é 27% maior do que o total de 2019, quando foram localizados cerca de 510 quilos. Para o comandante-geral, coronel Rodrigo Mohr, houve aumento considerável nas apreensões, principalmente por terra e em decorrência da covid-19 não permitir também outras formas de transporte, como, por exemplo, pelo ar.
– É também uma forma de prevenção a homicídios e a outros crimes que têm várias vezes origens no tráfico. A Brigada Militar tem feito várias abordagens, intensificando inclusive, e ainda realizando prisões – diz Mohr.
Segundo ele, o Comando Rodoviário da corporação tem se destacado em 2020 porque praticamente dobrou o número de apreensões de entorpecentes e prisões de traficantes. Mohr diz que são sempre grandes quantidades de drogas localizadas em uma só vez ao invés de pequenas quantidades.
Polícia Civil
Segundo o Departamento de Comunicação da Polícia Civil, foram apreendidas 4,8 toneladas de drogas até junho, o que representa 78% do total apreendido no ano passado e 40% do total apreendido em 2018, que foi o período de maior apreensão nos últimos cinco anos. Mas se for separar por tipo de droga, o número de cocaína apreendido pela instituição nos seis primeiros meses de 2020 é 55% superior ao que foi localizado pelos agentes em 2019. Até junho deste ano, foram apreendidos 620 quilos de cocaína, e em 2019 inteiro, pouco mais de 400 quilos. Também foi maior a quantidade de crack encontrada pelos agentes neste ano em comparação com os 12 meses de 2019.
Além disso, até junho de 2020, foram recolhidos 29,8 mil comprimidos de ecstasy, número 45% superior ao que foi encontrado em todo ano passado, quando os policiais contabilizaram 20,4 mil. O diretor de Investigações do Denarc, delegado Carlos Wendt, destaca que o órgão teve a maior apreensão de maconha e de ecstasy da sua história neste ano. Em relação à droga sintética, por exemplo, foi também a maior apreensão de toda a Polícia Civil.
– Só de maconha, já apreendemos 2,2 toneladas até julho, representa 100% de acréscimo da quantidade que o Denarc apreendeu em todo ano de 2019. Mas isso é em função do trabalho de inteligência, já que não notamos um consumo maior em razão da pandemia. O que notamos, sim, foi a forma como chega a droga ao consumidor com o aumento do uso de telentregas – ressalta Wendt.
Wendt lembra que a apreensão do Denarc nos primeiros meses do ano já representa também 200% do montante de 2018, demonstrando uma evolução após investimentos realizados. Em agosto, já foram apreendidos mais 200 quilos de maconha.
Polícia Federal
A PF também realizou apreensões, mas os dados contabilizados somam também o que PRF e até BM localizaram, já que as drogas recolhidas por estas instituições são encaminhadas para polícias judiciárias, como a PF e a Polícia Civil. O delegado Alessandro Maciel Lopes, da Delegacia Regional de Investigação e Combate ao Crime Organizado, também confirma que investimentos na preparação do efetivo e em tecnologia têm auxiliado para grandes apreensões de entorpecentes. Mas ele ainda diz que estas abordagens são resultados de apuração detalhada, por isso, o principal foco da instituição é desmantelar e descapitalizar o traficante, principalmente em crimes de lavagem de dinheiro.
– Temos priorizado investigações contra os grandes líderes do narcotráfico. A droga apreendida é o risco do negócio realizado pelo criminoso, já tem percentual no faturamento para isso, e entendemos que só a apreensão não é suficiente. É importantíssima, mas vai voltar a ocorrer novo transporte e temos que atacar com inteligência o responsável pelo envio – ressalta Lopes.
Sobre números, a PF revela que, apesar de contabilizar parte do que é enviado pela PRF e BM, também realiza apreensões e elas aumentaram nos primeiros seis meses do ano em relação ao mesmo período de 2019. Até o dia 24 de junho, a PF contabilizou 1,1 tonelada de cocaína e crack, contra pouco mais de 400 quilos até junho do ano passado. Em relação à maconha, passaram de 2,1 toneladas no primeiro semestre de 2019 para 2,8 toneladas de janeiro a junho de 2020.