Responsável por fiscalizar 11 mil quilômetros de rodovias estaduais no Rio Grande do Sul, o Comando Rodoviário da Brigada Militar (CRBM) enfrenta a maior defasagem de pessoal de sua história. E os reflexos são escala apertada, acúmulo de serviço, demora no atendimento de acidentes de trânsito e fragilidade na segurança dos policiais que guarnecem os postos nas estradas.
O número de servidores previsto para 2017 era de 1.530, mas a realidade é outra. O órgão encerrou o ano passado com 616 militares para atuar, em três turnos, nos 38 pontos de vigilância dos três batalhões divididos setorialmente pelo Rio Grande do Sul — defasagem de 60%. De acordo com o comandante do CRBM, coronel Nelson Alexandre de Moura Menuzzi, para calcular o número ideal de policiais leva-se em consideração a população do Estado e o tamanho da frota, entre outros fatores.
Os dados foram obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação. Foram necessárias três solicitações para obter o levantamento. Após negativas do comando rodoviário e da BM, a informação só foi repassada ao Grupo de Investigação da RBS (GDI) depois de determinação do secretário estadual da Segurança Pública, Cezar Schirmer.
De acordo com a corporação, os números não eram tabulados antes de 2010. Naquele ano, havia 826 policiais atuando na fiscalização de trânsito nas estradas. A defasagem chegava a 37% do previsto, que era de 1.313 servidores. Em 2013, o CRBM atingiu o recorde de 909 policiais. Mas como a projeção de efetivo ideal aumentou para 1.451, a diferença entre a teoria e a prática se manteve. A partir de 2014, a defasagem na equipe só aumentou. Enquanto isso, nestes oito anos, a frota de veículos no Estado cresceu 30%, segundo o Departamento Estadual de Trânsito (Detran-RS).
Apesar da diminuição considerável no número de servidores, as rodovias estaduais vêm registrando menos acidentes, mortes e multas. Em 2010, 453 pessoas perderam a vida no trecho de responsabilidade do CRBM. Esse número reduziu para 305 em 2017. Os acidentes caíram de 11.938 em 2010 para 5.247 no ano passado. Já a quantidade de multas registradas encolheu de 275 mil em 2010 para 160,4 mil em 2017.
Ainda assim, conforme relatos de policiais, que preferem não ter seus nomes revelados por medo de represálias, os servidores são obrigados a escolher qual acidente irão atender. Há relatos de vítimas que ficaram de duas a três horas aguardando a chegada de uma viatura.
Silvana Beatriz de Vargas é mãe de um adolescente que se acidentou na altura da parada 89 da RS-020, em Gravataí. Ruan Carlos Viana, 17 anos, estava carona da moto de um amigo quando houve colisão contra uma caminhonete. Segundo Silvana, o fato ocorreu por volta das 17h e policiais do posto que atende a região, na RS-040, em Viamão, só chegaram ao local às 19h30min porque antes estavam em outra ocorrência.
— É inaceitável. Ele poderia ter morrido. Só não foi mais grave porque um caminhoneiro apareceu e atravessou o veículo na pista para barrar o trânsito, protegendo eles. As autoridades responsáveis deveriam tomar uma atitude urgente. Quando os policiais chegaram, tudo foi organizado rápido. Eles estão fazendo falta — reclama a mãe.
O acidente aconteceu em setembro de 2017 e Ruan passou pela última sessão de fisioterapia no mês passado. O amigo, que sofreu fratura exposta, terá de passar por mais uma cirurgia nos próximos dias.
O coronel Menuzzi reconhece o problema. Credita a situação principalmente à transferência de policiais que atuam no CRBM para outros órgãos de governo. Além disso, a ida para a reserva de aproximadamente 200 servidores reduziu ainda mais a capacidade de atendimento de ocorrências. O coronel admite que há situações em que motoristas do noroeste do Estado precisam aguardar até três horas pela chegada de uma viatura no local dos acidentes:
— Nossa orientação é que se vá atender uma ocorrência, não importa o quanto demore.
Menuzzi diz que tem tratado sobre o aumento de efetivo com a cúpula da BM. O pedido foi reforçado ao novo comandante-geral da corporação, coronel Mario Ikeda. A expectativa é receber mais 30 policiais em junho.