Há um ano e meio, a pandemia afeta, em diferentes escalas e formas, a sociedade como um todo. Foi nesse contexto desafiador que pais, filhos, cuidadores e educadores precisaram ser resilientes para se adaptar e seguir em frente.
É exatamente um recorte dessa nova realidade, que servirá de cenário para a Escola de Pais 018, que chega a sua quarta edição. Neste ano, quatro palestrantes abordarão temas como socialização, desenvolvimento infantil e importância de olhar para a saúde mental da família.
As aulas ocorrem em setembro, outubro e novembro e estão disponíveis em dois formatos: presencialmente, com redução no número de participantes, no Instituto Ling, em Porto Alegre, e também online. A primeira apresentação está programada para a próxima terça-feira (14) e os ingressos para acompanhar o ciclo de palestras estão à venda (leia mais ao fim deste texto).
A reportagem conversou com a médica Mariela Silveira, especialista em nutrologia e fundadora da Mente Viva, ONG de mindfulness para crianças e adolescentes. A especialista vai apresentar, no dia 30 de setembro, o tema “Acalmando a mente: teoria e prática para o bem-estar de pais e filhos”.
— Pensamos que esse tema é bem propício para o momento. Estamos vivendo um mundo diferente, passando por essas adaptações todas. As pessoas estão com a necessidade de encontrar o equilíbrio para si e também para os relacionamentos — justifica Mariela.
"Pais e filhos precisam parar e olhar para dentro de si"
Por telefone, a médica Mariela Silveira adiantou tópicos de sua palestra na Escola de Pais, no dia 30 de setembro:
O que será abordado na sua palestra da Escola de Pais?
Muitas vezes a gente falou em como ajudar a criança, o adolescente, o filho, os alunos, em como eles podem se sentir melhores. Mas nesse período de pandemia, mais do que nunca, a gente tem certeza de que isso só é possível de acontecer se todo mundo da volta, o “ecossistema”, estiver ajudando, acalmando também a mente do adulto, do cuidador. Então, o que estamos abordando é a importância de trazermos um pouco mais de calma para esse momento e como se consegue fazer isso juntos. Vou mostrar evidências científicas sobre quais são as formas para isso acontecer melhor, para que tenha resultado de redução de ansiedade, de sintomas de depressão, de estresse e burnout, de insônia. Como tenho experiência desde 2007 com meditação, vou dar ênfase de como ela pode ser útil e quais maneiras dá para realizá-la nos diferentes contextos e ambientes.
Como parar e, de fato, acalmar a mente?
Primeiro, vale dizer que, normalmente nos períodos de mais ansiedade, há uma tendência de tirar da lista de afazeres algumas atividades que são protetoras, como exercício e a meditação. Mas é nesse momento que elas são mais importantes. O que a gente precisa entender é que não é um tempo desperdiçado, mas é um tempo que será sobreposto em uma produtividade maior, melhoria da saúde. portanto, inicialmente é necessário sensibilizar cada um da importância de manter essas atividades. Depois, que haja um tempo realmente reservado na agenda para sair do projeto. Existem formas diferentes, e há trabalhos que sustentam técnicas com resultados bem positivos. Por exemplo, a meditação transcendental, feita duas vezes ao dia, por 10 minutos. Ela tem resultados bem bons nesses quesitos que falei (ansiedade, estresse). Ou 20 minutos juntos, uma vez ao dia. Tudo isso é embasado cientificamente. Mas, de repente, uma pessoa que está começando e vai achar que esse tempo é muito, então pausas de um minuto que ela faça concentrada na respiração diafragmática, por exemplo, trazem uma melhora para a pressão arterial, para a frequência cardíaca. A pessoa já vai compreendendo que ela consegue. Talvez para uma pessoa que seja extremamente agitada parar por 20 minutos vá gerar uma frustração. Logo, deve-se começa com tempo bem reduzido e vai aumentando. Essas pequenas pausas podem ocorrer no meio do trabalho, onde isso seja viável. Outra dica é que se estabeleça uma rotina: que se ela seja feita no mesmo horário. Pode ser cedo, ao acordar, ou antes de dormir.
Como fazer meditação com as crianças?
Claro que depende da personalidade, do temperamento, da idade também. Com crianças bem pequeninhas a gente não faz a meditação em si. Até os seis anos, fazemos técnicas de relaxamento, com musicalização, trabalhamos valores, mas sem a meditação. Nos maiores, isso já pode ser treinado. Também funciona com a rotina. Uma das coisas que pode ser útil, dependendo da família, é que isso seja feito com os pais. Um momento em que toda a família vai parar um pouquinho e isso já vai sendo educado. Eles vão entendendo que o “mundo de fora” é importante, mas que esse “mundo de dentro” também precisa ser respeitado. Quando um pai chama uma criança para meditar junto, significa que “Opa! Em coisas importantes aqui que estão fora daquilo que a gente está vendo”. Ter esse hábito de chamar a criança para sentar junto, em um ambiente bem tranquilo, e fazer a meditação vira uma coisa muito boa. Mas para ter efeito, isso tem que ser diário, quase como se fosse medicamentoso. Isso é o que faz diferença no desfecho.
E no caso de crianças muito ativas?
Para as mais agitadas, o que pode funcionar é que ela primeiro faça uma meditação ativa, ou seja, como uma corrida, por exemplo. Mas ela precisa colocar toda a atenção naquela atividade que está fazendo. Atenção plena. Pode ser uma brincadeira, um jogo físico, para voltar toda a atenção para o corpo, isso já ajuda e faz com que o cérebro se conecte de uma forma diferente quando ele é recrutado para essa atenção. Depois que a criança se sentir mais cansada, para-se alguns segundos e questiona: “Como está o corpo, o que estás sentido? Como está o coração? E a respiração?”. Gostamos muito e vemos benefício, principalmente para os mais acelerados.
O que é preciso cuidar?
Apesar dos benefícios ocorrerem quando há rotina, isso não pode ser algo obrigatório, que seja maçante para a criança. Caso contrário, ela não vai querer fazer. Mas quando a criança consegue perceber o benefício, ela quer fazer. Quem treina a atenção sabe que estar com atenção é algo muito satisfatório, prazeroso. Naturalmente, quem vai fazendo fica com desejo de seguir. E isso, do ponto de vista comportamental, também é interessante, afinal, a gente só sustenta aquilo que é prazeroso. Qualquer hábito que a gente for incorporar vai ter muito mais chance de dar certo se for realmente bom. Não é diferente com essa rotina do relaxamento, que tem que ser leve, legal, divertida.
Além da meditação formal, qual outra forma de se conectar?
Ter uma vida um pouco mais atenta seria outro exercício. Por exemplo, em uma brincadeira, estar realmente ali. Presente verdadeiramente, sem telefone ou outra interferência. É uma brincadeira mindfulness, plenamente atenta. Isso tem um valor imenso porque a criança se sente cuidada e valorizada. É a hora de olhar nos olhos, de sentir, de perguntar como a criança está. Essa troca empática tem grande valia. E a gente começa a perceber que isso se estende para vida toda, isto é, não só para aquele momento.
Escola de Pais 2021
As palestras serão de setembro a novembro. Os ingressos estão à venda em bit.ly/2021escoladepais. O pacote para os quatro encontros custa R$ 449,50 (modalidade online) e R$ 899 (presencial, no Instituto Ling, em Porto Alegre). Confira as palestras:
14/9 – Sua família está “languishing” (definhando)? Como cuidar de sua saúde emocional
Com a psicóloga Carolina Lisboa, doutora em Psicologia (UFRGS) com estágio na Universidade do Minho (Portugal). Terapeuta Cognitiva pela Federação Brasileira de Terapias Cognitivas e professora da pós-graduação em Psicologia da PUCRS.
“Languishing é essa sensação de estagnação, de vazio, que não chega a fechar com todos os critérios para ser considerada uma depressão. É um processo que tem sido observado e estudado a partir da pandemia. O que observei em vários pacientes desde março de 2020 foi que eles estavam desanimados, entediados, não achavam graça em nada, mas não estavam necessariamente desesperançosos. Languishing pode advir também do conflito de querer socializar novamente e sentir temor, preguiça e perda de habilidades.”
30/9 – Acalmando a mente: teoria e prática para o bem-estar de pais e filhos
Com a médica Mariela Silveira, especialista em Nutrologia/USP, pós-graduada em Acupuntura Médica/PUCRS e Terapia/USP. Fundadora da Mente Viva, ONG de mindfulness para crianças e adolescentes. Embaixadora do Dia Global do Bem-Estar no Brasil.
19/10 – Cérebros conectando com cérebros: por que as crianças precisam tanto de convívio social?
Com o neurologista e neurocirurgião André Palmini, pós-doutor em neuroimagem funcional e epilepsia, pela Katholieke Universiteit Leuven, na Bélgica, e em epileptologia clínica, pela University College London.
“Por que as crianças são seres sociais e por que isso é tão importante? Porque, na verdade, todo o desenvolvimento do nosso cérebro se dá em conexão com outros cérebros, ou seja, se dá em conexão com a sociedade, com o microcosmos da criança que vai se expandindo na medida em que ela cresce: primeiro tem pai e mãe, depois irmão, tios, depois vai para a escola e, com isso, ela vai ampliando, como se fosse uma espiral, o seu raio e incluindo cada vez mais pessoas, e, portanto, mais cérebros, com quem ela se conecta.”
30/11 – Como o seu estilo de vida pode definir o desenvolvimento saudável?
Com o pediatra Daniel Becker, especialista em homeopatia e mestre em saúde pública, com 30 anos de experiência em consultório no Rio. Conferencista reconhecido internacionalmente em temas como saúde da criança e da família, já atuou em colaboração com a a Organização Mundial da Saúde (OMS), o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e os Médicos Sem Fronteiras.
“Os filhos vêm nos desafiar a sermos melhores desde sempre, desde antes da gente planejar ter filhos. Mas o estilo de vida de uma pessoa não é definido apenas pelas suas escolhas: é também moldado pela cultura, pela publicidade, pela classe social, pela política, por políticas públicas, e tudo isso tem influência no desenvolvimento.”