A baixa adesão à vacinação no Brasil, especialmente na faixa etária de crianças e adolescentes, tem acendido o alerta para a possibilidade de retorno de doenças consideradas erradicadas. É o caso da poliomelite. Segundo dados do DataSus, do Ministério da Saúde, a cobertura vacinal contra a paralisia infantil caiu de 96,55%, em 2012, para 67,71%, em 2021, levando em conta as três doses que são dadas ainda nos primeiros meses de vida.
De acordo com a médica pediatra Heloisa Ihle Giamberardino, que é membro do Departamento de Imunizações da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), o Brasil era considerado um exemplo para o mundo em relação à vacinação devido, especialmente, ao Programa Nacional de Imunizações (PNI). Desde 2018, entretanto, uma queda na busca por vacinas é percebida pelas autoridades de saúde — um movimento que se intensificou durante a pandemia – e faz a política pública brasileira receber críticas.
— A gente observou nesses dois anos que tivemos uma queda muito maior na questão da vacinação. Temos crianças com calendários dois, quase três anos atrasados. Quem tava um pouco atrasado em 2019 continuou em 2020 e 2021. Agora que está sendo observado uma pequena tendência (de crescimento), mas mesmo assim em um ritmo muito lento — afirmou Heloisa em entrevista ao programa Gaúcha Atualidade, da Rádio Gaúcha, na manhã desta quarta-feira (23).
Segundo a especialista, a causa desse movimento é multifatorial, mas um dos impulsionadores é a desinformação, com a disseminação de fake news a respeito dos imunizantes, situação potencializada com as redes sociais.
— As vacinas são vítimas do próprio sucesso. As pessoas acabam não vendo mais as doenças que aconteciam com grande frequência e chegam a essa conclusão equivocada de que não é necessário manter os calendários vacinais em dia — alertou.
Na entrevista, a especialista ainda chamou a atenção para a vacinação contra a covid-19. No caso do Rio Grande do Sul, dados da Secretaria Estadual da Saúde (SES-RS), apresentados em reportagem por GZH, mostraram que o comparecimento para a segunda dose é menor quanto mais jovem é o público. Em todo o Estado, 663,5 mil pessoas estão com a segunda dose atrasada - destas, 108,5 mil são crianças de cinco a 11 anos e cerca de 110 mil são adolescentes.
— Se falou muito em vacina nesses dois anos. Em março de 2020, com a obscuridade que a gente vivia em termos de ciência, sem dados sobre o Sars-Cov-2 , a nossa esperança foi a vacina. E, agora, nós temos a vacina e mesmo assim temos dificuldade na faixa etária pediátrica e da adolescência de ter uma adesão tão forte quanto se falava lá em 2020, que todo mundo estava aguardando ansiosamente uma vacina. É um pouco incoerente – afirma.
Esforço conjunto
Para a médica pediatra, a solução para reverter esse quadro parte de um empenho coletivo, que inclui pais, escolas e entidades de saúde. As campanhas de vacinação, mobilizadas por órgãos do governo e instituições médicas, têm força, pois chamam a atenção e motivam à vacinação, entretanto, têm efeito temporário.
Nesse caso, o que pode auxiliar de forma contínua são as escolas, atuando como fonte de informação segura para os pais de crianças e adolescentes. A médica pediatra citou o exemplo do Paraná, onde uma resolução dispõe sobre a obrigatoriedade da apresentação da carteira de vacinação dos alunos de até 18 anos durante a matrículas, seja em escola pública ou privada.
— E, claro, tem a vontade dos pais. Porque eles têm essa parcela de contribuição. É um esforço conjunto. As vacinas são acessíveis, a grande maioria está disponível na rede pública, de forma gratuita. Então o acesso existe. Agora, a gente precisa da contrapartida das famílias.