O desenvolvimento de um medicamento é um processo longo e complexo que envolve diversas etapas. Da concepção da pesquisa à aprovação regulatória, para garantir a qualidade do produto e a segurança do paciente, costuma levar mais de uma década até a chegada do remédio às prateleiras das farmácias e aos hospitais.
Professora de Farmácia na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), Fernanda Morrone ressalta que o processo, ainda que demorado, é essencial:
— Nestas etapas, avaliamos a segurança e a eficácia dos medicamentos, além de estabelecer as doses e avaliar os principais efeitos adversos que podem surgir. Se seguirmos as etapas, vamos proteger os pacientes e teremos resultados mais efetivos.
Etapas do desenvolvimento
As principais etapas da produção incluem pesquisas, ensaios, autorizações e monitoramento. Elas consistem em:
- Pesquisa e Desenvolvimento (P&D): descoberta e identificação de compostos que possam ter potencial terapêutico
- Testes pré-clínicos: envolve estudos in vitro (testes com células), estudos in vivo (testes em animais) e estudos utilizando bioinformática, para avaliar a segurança e eficácia da medicação
- Autorização: com resultados positivos, busca-se autorização de comitê de ética e pesquisa, da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa e da Anvisa para conduzir ensaios clínicos
- Ensaios clínicos:
- Submissão à Anvisa: sendo eficaz e seguro, submete-se para a aprovação, sendo necessário apresentar todos os dados dos ensaios clínicos e estudos pré-clínicos, além de rótulo e bula, à agência reguladora. A avaliação, classificação e registro pela Anvisa pode variar de seis meses a dois anos, a depender da complexidade
- Regulação econômica pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED): órgão do governo que regula o preço dos medicamentos no Brasil, incorporação no SUS e por planos de saúde
- Comercialização: acesso após a aprovação
- Fase 4: ocorre pós-comercialização, para monitorar a segurança e eficácia a longo prazo dos medicamentos já registrados. A farmacovigilância faz o monitoramento contínuo. Se surgirem novos efeitos adversos graves ou se houver problemas, a Anvisa pode retirar o medicamento do mercado ou impor restrições
- Fase 1 - testes iniciais em um pequeno grupo de voluntários saudáveis para avaliar a segurança e os efeitos colaterais e determinar a dosagem
- Fase 2 - estudos em um grupo maior de pacientes, com a condição, para avaliar a eficácia e a segurança e monitorar efeitos colaterais. Geralmente tem o propósito de estabelecer o intervalo de dose tolerável em humanos
- Fase 3 - estudos mais longos e em larga escala (com centenas ou milhares de pacientes) para confirmar a eficácia, monitorar efeitos colaterais e comparar com tratamentos existentes – um grupo recebe o medicamento, e o outro, placebo ou tratamento convencional, por meio de randomização e duplo-cego. Os estudos são a base para a futura bula do medicamento
Pode levar de 10 a 20 anos desde o desenvolvimento da ideia do produto até a conclusão da fase 3 – o que também exige investimentos.
— Todas essas etapas devem ser cumpridas diante das normas de boas práticas de pesquisa clínica, visando sempre a segurança do paciente — frisa Carolina Fischinger Moura de Souza, chefe do Serviço de Pesquisa Clínica do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA).
Nesse sentido, se um número grande de indivíduos teve um evento adverso grave, o produto, provavelmente, não será aprovado, explica Carolina:
— Se temos muitos eventos adversos graves, é uma medicação que não vai adiantar. E, assim, nem o próprio patrocinador submete.
Submissão à Anvisa
De acordo com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), para a concessão de registro sanitário de medicamento, o interessado na fabricação e comercialização do produto deve apresentar documentação administrativa e de comprovação de qualidade, de segurança e de eficácia do medicamento. Isso inclui documentos relativos ao processo produtivo e aos estudos realizados. Conforme previsto na Lei nº 6360/197, devem ser apresentados dados técnicos e estudos que comprovem que o medicamento é seguro, eficaz e tenha qualidade para a finalidade proposta.
Os dados são analisados pelos setores técnicos da Anvisa, divididas por área de conhecimento. “O processo de análise segue padrões definidos internacionalmente e é bastante semelhante ao que é praticado pelas principais autoridades sanitárias internacionais”, ressalta a agência.
Além disso, o registro de um medicamento não é estático: o produto é acompanhado e regulado, com medidas de farmacovigilância e fiscalização. Eventuais mudanças no produto precisam passar por nova análise, dependendo do impacto potencial para o paciente, segundo a Anvisa.