Nos últimos dias, o debate sobre a exigência de comprovante de vacinação contra o coronavírus para permitir o acesso a determinados locais, eventos ou o exercício de atividades profissionais específicas ganhou impulso no Estado.
O tema é um dos mais frequentes nas reuniões do Conselho das Secretarias Municipais de Saúde do Rio Grande do Sul (Cosems/RS). Uma das possibilidades em discussão seria estabelecer, a critério de cada prefeitura, obrigatoriedade de vacinação em setores mais sujeitos à aglomeração de pessoas como serviços e cultura. Líderes de entidades empresariais também cogitam orientar afiliados para que exijam a imunização, pelo menos, de empregados que lidam com o público.
— Esse assunto vem sento pauta nas reuniões do Cosems, principalmente na área de serviços e cultura: na retomada de alguns eventos culturais e de serviços que, por sua natureza, acabem reunindo muita gente, mais de cem pessoas, por exemplo. Em situações como essas, poderia se cobrar a carteira de vacina. Esse debate vem tomando a agenda nos últimos dias — revela o presidente do conselho e titular da saúde em Canoas, na Região Metropolitana, Maicon Lemos.
Ainda não há detalhes sobre a abrangência das medidas e para quais situações específicas elas seriam eventualmente sugeridas. A entidade que reúne gestores da saúde deverá formular uma recomendação técnica às prefeituras com esses esclarecimentos, respeitando a independência de cada município para acatar ou não as orientações.
— Estamos trabalhando em uma possível orientação geral, mas, como entidade municipalista, sempre respeitando a autonomia de cada prefeitura — complementa Lemos.
O passaporte vacinal seria adotado em atividades que envolvam público, como as ligadas à data Farroupilha, em setembro. Canoas, por exemplo, pretende solicitar comprovante de imunização em atrações programadas para os festejos farrapos. Entre as preocupações dos secretários de saúde está a adesão dos mais jovens à imunização, justamente a parcela da população que mais circula e frequenta eventos.
Procurados por GZH, o governo estadual e a prefeitura de Porto Alegre não confirmaram tratativas para implantar esse tipo de estratégia até o momento. A Secretaria Municipal da Saúde (SMS) chegou a cogitar a implementação de um passaporte vacinal na cidade, mas o prefeito Sebastião Melo rechaçou a ideia após repercussões negativas em sua base de apoio. Conforme a assessoria de comunicação da SMS, o tema não foi retomado.
A Câmara de Vereadores da Capital ainda avalia se impõe o passaporte para quem trabalha no local. A decisão deverá ser tomada na quarta-feira (18), após ser concluída uma pesquisa que busca medir a proporção de imunizados no legislativo municipal.
No setor privado, o tema também ganha fôlego. O Sindicato dos Lojistas do Comércio de Porto Alegre (Sindilojas) avalia divulgar uma orientação aos afiliados recomendando a exigência de vacinação, pelo menos, para os funcionários que mantêm contato com o público.
— Independentemente da posição pessoal que cada um tenha em relação às vacinas, no caso de quem lida com o público, elas se tornam uma questão fundamental de saúde coletiva. É possível que divulguemos, em breve, uma posição formal em relação a isso — afirma o presidente do Sindilojas, Paulo Kruse.
A hipótese de uma obrigatoriedade mais ampla, que cobre a imunização de praticamente toda a população, encontra mais resistências. Maicon Lemos entende que não haveria como impor as doses de forma generalizada pelo fato de não existir essa previsão na legislação brasileira até o momento.
Embora existam opiniões de que uma ação mais drástica favoreceria a ampliação dos índices de proteção contra o coronavírus, o presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), Juarez Cunha, avalia que uma obrigatoriedade ampla não seria a melhor estratégia em termos de saúde pública em um país como o Brasil, onde a grande maioria da população já tem tradição de aderir às campanhas de prevenção.
Cunha observa que o percentual de pessoas que rejeitam sistematicamente se submeter às aplicações fica ao redor de 5% — menos do que em muitos outros países, mesmo desenvolvidos.
— Tornar obrigatório pode acabar tendo um efeito contraproducente. A melhor saída seria fazer uma grande campanha nacional de esclarecimentos sobre a segurança e os benefícios da vacinação, desmentido fake news, como ainda não foi feito no país — afirma Cunha.
Cunha entende que seria mais proveitoso cobrar a imunização em situações específicas, como entre profissionais de instituições de saúde, onde há risco elevado de transmissão e pessoas vulneráveis. Um dos receios é o de que a imposição generalizada estimule o crescimento de movimentos mais organizados de oposição aos imunizantes como se vê até em países como a França e os Estados Unidos.
O governo do país europeu vem exigindo a apresentação de certificado de imunização para um número crescente de atividades. Desde que essa estratégia foi adotada, a taxa de imunização aumentou de ritmo, mas também tem resultado em manifestações de protesto nas ruas.