Nesta sexta-feira (26), o Instituto Butantan apresentou a ButanVac, vacina contra a covid-19 100% nacional produzida pelo Brasil em parceria com o Vietnã e a Tailândia. Com a mesma tecnologia usada nas vacinas da gripe ou influenza produzidas pelo instituto, a técnica já é uma velha conhecida do Butantan.
Para sua sintetização, é utilizado o vírus Newcastle, que causa gripe aviária, mas não afeta os humanos, explica Luciano Goldani, infectologista do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA):
— O vírus é geneticamente modificado para produzir a proteína S (Spike), sendo inoculado em ovos embrionários para se multiplicar após um período de incubação. O líquido alentoico (material que envolve o embrião) é extraído, agora, com grande quantidade de vírus e proteína S, é inativado e, a partir daí, utilizado como imunizante.
O infectologista do HCPA complementa.
— Ou seja, o vírus é destruído e fica-se somente com a proteína. No caso, com a proteína Spike, e ela é inserida nesse vírus inofensivo para as pessoas. Quando entram no corpo, o sistema imunológico identifica o vírus e produz uma resposta a essa ameaça. É uma tecnologia similar a utilizada para produção da vacina da influenza. Relativamente simples e eficaz, na qual o Butantan já possui experiência. Muito importante esse passo, porque, se der certo, não vamos precisar importar tecnologia. Ela tem grandes chances de ser segura, em razão desse histórico com a influenza, a grande dúvida é em relação a eficácia — observa.
Goldani destaca ainda que essa vacina pode ser atualizada com facilidade e apontou que já podem ser usadas as cepas mutantes, como a P1, em sua confecção. Inclusive, Covas afirmou que a ButanVac conseguirá neutralizar a variante P1 do coronavírus.
Para o professor de imunologia da Pontifícia Universidade Católica do RS (PUCRS) Moisés Evandro Bauer, se for comprovada a eficácia da vacina ao fim do período de testes, a principal vantagem será a independência brasileira de insumos de outras nações para a produção do imunizante contra a covid-19.
— Na CoronaVac, o cultivo do vetor viral contendo a proteína S é feito em células renais de macaco, processo que é feito na biofarmacêutica chinesa Sinovac, que envia para o Brasil o vírus inativado. O que fazem tanto a Fiocruz quanto o Butantan neste momento é envasar. Agora, na ButanVac, todas as etapas vão ser feitas aqui e, com isso, ficaremos independentes na produção de vacinas, o que é fabuloso — afirma Bauer.
Aferição de segurança e eficácia
Na coletiva de imprensa, o diretor do Butantan afirmou que os estudos clínicos em humanos serão necessários para que se possa precisar quantas doses da vacina serão necessárias e qual o intervalo entre elas. Ressaltou ainda que o imunizante pode ser de dose única.
O infectologista do HCPA afirma que a fase de ensaios – dividida em três etapas – levaria, no mínimo, seis meses, mesmo que os diferentes estágios ocorram concomitantemente. Já a previsão do governo de São Paulo é mais otimista. Eles esperam que, após a liberação da Anvisa para a realização dos testes, todo o processo leve, no máximo, três meses. Vale frisar que o Butantan solicitou que as fases 1 e 2 sejam feitas de forma paralela.
O professor Moisés Bauer acredita na possibilidade de resultados das fases 2 e 3 dentro de quatro meses, mas teme excesso de otimismo por parte do governo de São Paulo.
— Com muita sorte, leva-se cerca de quatro meses para haver resultados das fases 2 e 3. Na fase 2, de 1,2 mil a 2 mil pessoas têm que ser testadas. Na fase 3, é necessário aumentar para cerca de 10 mil a 15 mil pessoas. Isso leva tempo, talvez estejam sendo muito otimistas ao esperarem ter resultados tão rápidos — pondera Bauer.
Perfil dos voluntários ainda não foi definido
Foi afirmado pelo Instituto Butantan que o imunizante será ministrado naqueles que não foram incluídos no Programa Nacional de Imunização (PNI). Quer dizer, isso já exclui da lista de possíveis voluntários profissionais de saúde que já receberam as vacinas e idosos que foram vacinados. Contudo, Covas não detalhou o perfil dos voluntários que serão necessários para dar início aos testes.
Veja quais são as etapas de teste de uma vacina
O processo exige que sejam vividos os seguintes momentos de monitoramento do imunizante:
Fase 1
Tenta-se comprovar a segurança da vacina nas pessoas. Ou seja, é avaliado se ela não provoca efeitos colaterais e se o sistema imunológico responde à presença do vírus produzindo anticorpos.
Fase 2
Procura-se avaliar se ela produz resposta imune contra a doença e também é estudada a melhor forma de aplicação do imunizante. Quer dizer, define-se o número de doses e o intervalo de tempo entre elas. Nestes dois momentos, serão necessários 1,8 mil voluntários.
Fase 3
Afere-se a eficácia do imunizante e, aí, até 9 mil pessoas irão participar do ensaio.
* Colaborou Letícia Paludo