
Os últimos 15 dias foram considerados críticos por autoridades estaduais e de Porto Alegre para definir os rumos do combate à pandemia no Rio Grande do Sul após a adoção de medidas mais restritivas de circulação na Capital e de uma rodada de bandeiras do distanciamento controlado que chegou a deixar metade das regiões gaúchas em nível de alto risco — abrangência revista após recursos das prefeituras.
As medidas legais e os apelos emocionados feitos pelo governador Eduardo Leite e pelo prefeito Nelson Marchezan não surtiram o efeito esperado: o isolamento social recuou a níveis inferiores ao registrado duas semanas atrás, enquanto a média diária de novas mortes por covid-19 cresceu 75% no Estado e 35% no município nesse período.
Houve ainda um avanço galopante nas internações por coronavírus em Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) (veja gráfico abaixo) que resulta na ameaça de colapso da rede de atendimento. O consenso social esperado pelos gestores públicos para frear esses números não progrediu, e especialistas em saúde apelam por medidas novas e mais efetivas do que as adotadas até aqui.
— O número de casos e mortes segue aumentando e pressionando o sistema de saúde principalmente em Porto Alegre, na Região Metropolitana e na Serra. É importante que os gestores façam apelos, mas a questão é até que ponto isso é eficiente. Ainda temos uma baixa adesão ao isolamento social que seria necessário, ao redor de 60%, 70% — afirma o infectologista Ronaldo Hallal, consultor do Comitê Covid-19 da Sociedade Rio Grandense de Infectologia.
Na média dos sete dias anteriores à vigência do decreto mais restritivo da Capital, imposto em 7 de julho, o isolamento social havia ficado em 46,4%. Essa taxa subiu um pouco na semana seguinte, mas, agora, caiu para 44,9%. O cenário se repetiu em nível estadual: a média estava em 43,5% 15 dias atrás, se elevou para 44,3% e voltou a recuar para 41,6%.
Hallal defende a adoção de mecanismos que aumentem esses números para inibir a circulação do coronavírus, além da adoção de políticas de testagem que permitam identificar e isolar casos de covid-19 e as pessoas com quem tiveram contato. Recentemente, a Capital ampliou sua política de exames para incluir pessoas sem sintomas que se aproximaram de doentes com coronavírus, mas os números da pandemia seguem em alta.
O número de internações por em UTI saltou 56% em Porto Alegre de 7 de julho até a tarde desta quarta-feira (22), e 32,8% em todo o Estado. O número de leitos também aumenta, mas em ritmo muito inferior — na média de todas as regiões gaúchas, o vírus avança seis vezes mais rápido do que a ampliação de vagas para tratamento intensivo.
Busca por consenso encontra dificuldades
Um dos obstáculos na busca por uma saída para o agravamento da pandemia no Rio Grande do Sul é conseguir um consenso sobre o caminho a ser seguido. O governador Eduardo Leite, prefeitos, gestores hospitalares e representantes do empresariado ainda não encontraram um caminho comum.
O prefeito da Capital, Nelson Marchezan, voltou a se reunir com dirigentes hospitalares e representes de empresários nesta quarta (22), para pedir ampliação de vagas em UTI e apoio a um lockdown que permita reiniciar o processo de reabertura da economia poucas semanas depois. É uma repetição do que fez na semana anterior, mas encontra resistência de empresários e de parte dos gestores de hospitais.
— É mais fácil ter um grande acordo em que todos aceitam reduzir a circulação da cidade por duas semanas, e a gente tenta reiniciar algumas atividades ali adiante — sustenta Marchezan.
Parte dos dirigentes da área médica, como a presidente do Clínicas, Naudine Clausell, apoia a estratégia. Outros preferem adiar medidas mais drásticas, embora quase todos reconheçam a dificuldade de abrir novos leitos. Presidente do Sindilojas Porto Alegre, Paulo Kruse avalia que não é adequado fechar ainda mais a economia:
— Defendemos a união da sociedade e que as pessoas se deem conta do que está acontecendo. Que aumentem o isolamento, mas sem necessidade de lockdown.
O governador Eduardo Leite também resiste a adotar ações mais radicais, seja para abrir ou fechar a economia, e cogita dar liberdade para os prefeitos acatarem ou não as regras que acompanham as bandeiras de alerta. O presidente da Federação das Associações de Municípios do Estado (Famurs), Maneco Hassen, entende que o Estado precisa continuar liderando o modelo de distanciamento e pede mais afinidade entre os diferentes setores públicos e privados:
— Temos de recuperar a união. Nenhuma norma vai suprir o que precisamos, e as divergências têm passado uma imagem ruim para a sociedade. Precisamos dialogar mais, e entendo que o governo estadual tem de liderar esse processo. A saída é aprimorar o modelo que temos.