A presidente do Hospital de Clínicas, Nadine Clausell, afirmou nesta sexta-feira (17) que Porto Alegre está indo em direção a um colapso do seu sistema de saúde. Em entrevista ao Gaúcha+, na Rádio Gaúcha, a profissional de saúde afirmou que é necessário reduzir a circulação de pessoas para diminuir a velocidade de contágio do coronavírus.
— Eu gostaria de me manifestar enquanto gestora do hospital que tem o maior número de pacientes da covid-19: Porto Alegre caminha para um colapso do seu sistema de saúde, apesar dos esforços repetidos e continuados da expansão de leitos de terapia intensiva e de enfermaria para esses pacientes. As previsões todas têm se mostrado muito certeiras em relação ao que vai acontecer em Porto Alegre nos últimos dias e semanas e, se nada for feito para mudar essa curva, nós vamos caminhar para o caos — disse. — Não tem mais como expandir a quantidade de leitos porque existem limitações de equipes, de ventiladores, de medicamentos. Então tem que mudar a circulação das pessoas para diminuir o contágio do vírus, e precisa ser adotada uma atitude mais rígida o mais rápido possível.
A profissional de saúde tomou como exemplo outros locais do mundo que, embora tivessem boa infraestrutura, também entraram em colapso.
— Veja bem, Nova York entrou em colapso, Itália, Espanha, países de primeiro mundo. Estamos indo bem, mas tem um limite para isso. Então, agora, estamos pegando o inverno. Na nossa visão técnica, nós vamos ter que fazer o que foi feito na Espanha ou em Paris. As pessoas ficaram confinadas três, quatro meses dentro de casa, e são países muito bem preparados. Essa pandemia é uma coisa que não aconteceu, a última pandemia dessa natureza foi em 1918. Isso é uma coisa que tem proporções que sãodifíceis de compreender — afirmou.
Ouça, abaixo, a entrevista na íntegra:
Questionada sobre quanto tempo seria necessário manter um lockdown para que a medida fizesse efeito, Nadine lembrou que teria de durar, no mínimo, duas semanas.
— O que se sabe sobre as medidas de intervenção de circulação, seja lockdown, seja as coisas que se faz para tentar ver resultado, nada se mede antes de duas semanas — explicou. — Nós estamos numa espiral muito rápida dessa curva. A cada dia a gente vê um incremento absoluto de seis, sete pacientes precisando de UTI em Porto Alegre, de acordo com os números da prefeitura.
A presidente do Hospital de Clínicas também disse crer que é possível conversar com a população para que mantenha o distanciamento social, a fim de evitar um colapso total no sistema de saúde:
— Eu prefiro pensar que a gente precisa explicar melhor para a população, que a gente tem que mostrar os dados e que a gente tem que tentar o bem comum, para evitar que a medida do lockdown seja por desespero, como aconteceu em outros lugares. Mas eu não sei, só o tempo vai dizer. É muito difícil fazer um controle de comportamento dessa natureza e dessa gravidade. Mas a gente também sabe que em algum momento a população, infelizmente, vai sentir a dureza na pele das coisas e vai ficar com medo de circular. Porque vai ter, infelizmente, algum ente querido que vai ter o corona e vai sofrer. Nós estamos trabalhando com muitos pacientes internados e estamos vendo como as famílias estão vivenciando isso. É muito triste, os pacientes ficam isolados.
Além disso, Nadine lembrou que Porto Alegre tem, tradicionalmente, um percentual de pacientes que vem de toda a Região Metropolitana. Sendo assim, seria necessário estender as medidas de distanciamento de forma igualitária para as cidades vizinhas.
— Porto Alegre tradicionalmente tem um percentual de pacientes da Região Metropolitana, entre 40% e 50%, e agora não é diferente. O discurso pró-isolamento, lockdown, diminuição de circulação tem que ser homogêneo, para além das fronteiras da cidade, especificamente de Porto Alegre, senão, não é justo — defendeu
A profissional de saúde também relatou que dentro do hospital já estão sendo tomadas medidas a contragosto. Por conta da pandemia, foi necessário diminuir o movimento do bloco cirúrgico de procedimentos eletivos, por exemplo. Transplantes também estão "zerados", de acordo com ela, porque não há doadores.
— Tem paciente com câncer que a gente está tentando manter o máximo possível a periodicidade das quimioterapias e as cirurgias oncológicas, que são importantes para o controle de tumor. Câncer também não espera passar a pandemia. E nós cuidamos de tudo isso. E ainda somos uma maternidade de alto risco, as mamães tendo nenéns que também não esperam para nascer. Como que não vai cuidar das mães, das gestantes? Tudo isso é um dilema diário — relatou.