Nos últimos anos, os avanços tecnológicos têm revolucionado a área da saúde, promovendo inovações que transformam o atendimento médico e ampliam o acesso a cuidados de qualidade. Mas até onde a tecnologia pode ir sem comprometer a relação humana entre médico e paciente? Para responder a essa questão, o presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio Grande do Sul (Cremers), Eduardo Neubarth Trindade, compartilha insights sobre o cenário atual e os desafios futuros.
A tecnologia como aliada, não substituta
Em 2023, a oferta de serviços online aos pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) cresceu significativamente, conforme a pesquisa TIC Saúde 2023, conduzida pelo Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic) do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC). Os dados demonstram que, entre 2022 e 2023, as teleconsultas no SUS passaram de 15% para 21%. O setor privado também percebeu um aumento, visto que duas em cada dez unidades disponibilizaram alternativas como telediagnóstico e a teleconsulta.
Contudo, o presidente do Cremers reforça que estes avanços não devem indicar a substituição da consulta presencial, uma vez que a telemedicina deve ser vista como uma ferramenta complementar.
— Na visão do Cremers, a teleconsulta não substitui a consulta presencial. Pelo contrário, é recomendado que o primeiro contato entre o médico e o paciente seja presencial, permitindo um olhar mais completo sobre o contexto do paciente — aponta.
Uma pesquisa da Universidade de Stanford publicada em 2023 confirma essa visão: pacientes que tiveram consultas presenciais antes de migrarem para o formato online relataram maior satisfação e confiança no tratamento.
Democratização do acesso com teleconsultas
No Rio Grande do Sul, a telemedicina tem mostrado grande potencial para superar desafios de logística e desigualdade no acesso à saúde. Em evento na Feira Hospitalar de 2024, a secretária de Informação e Saúde Digital, Ana Estela Haddad, argumentou que uma evidência disso é o aplicativo Meu SUS Digital, que está caminhando para disponibilizar aos médicos o prontuário do paciente na palma da mão.
Segundo ela, os avanços e investimentos na tecnologia vão possibilitar que os médicos consultem no aplicativo todos os documentos de saúde dos pacientes, como o certificado de vacinação, agendamentos, exames, posição na fila de transplante, medicamentos prescritos e retirados, entre outras informações. Com os avanços da tecnologia, o Cremers defende a teleconsultoria como um dos usos mais eficazes.
— Imaginemos um médico generalista atendendo em Esmeralda que precisa discutir um caso com um especialista em Porto Alegre. A teleconsultoria evita o deslocamento do paciente e garante um atendimento mais ágil e especializado — exemplifica.
Esse modelo é especialmente relevante em regiões rurais ou cidades menores, onde a presença de especialistas é limitada. Dados do IBGE mostram que cerca de 30% dos municípios brasileiros enfrentam dificuldade para fixar profissionais médicos em suas localidades.
Inteligência artificial e otimização de recursos
Outra frente importante é o uso de sistemas inteligentes para triagem e diagnósticos. Tecnologias baseadas em inteligência artificial (IA) podem ajudar a identificar casos urgentes com maior precisão, aliviando emergências sobrecarregadas. Por estar cada vez mais no centro dos debates, o estudo TIC Saúde de 2023 incluiu pela primeira vez indicadores sobre a aplicação de IA no setor.
No ano em questão, aproximadamente 3.200 estabelecimentos de saúde contaram com os recursos de IA tendo o maior uso na parte privada (cerca de 2.800). Se por um lado, as ferramentas mais utilizadas foram voltadas para a automatização de processos de trabalho (46%), reconhecimento de fala (33%), mineração de texto e análise de linguagem escrita ou falada (32%), por outro, melhorar a segurança digital (45%), apoiar a organização de processos clínicos e administrativos (41%) e aumentar a eficiência dos tratamentos (38%) eram as principais metas ao utilizar a tecnologia.
— Essas ferramentas otimizam recursos e liberam os médicos para se concentrarem no atendimento humanizado — destaca o presidente do Cremers.
Estudos recentes do MIT apontam que soluções de IA podem reduzir em até 20% o tempo gasto em triagens, permitindo maior foco nos casos de mais complexidade.