A transferência de parte dos serviços do Hospital São Lucas da PUCRS para o Hospital Materno-Infantil Presidente Vargas (HMIPV), ambos em Porto Alegre, deve ser concluída até 10 de junho. De acordo com o Hospital São Lucas, o cronograma segue mantido até o julgamento do recurso da mantenedora União Brasileira de Educação e Assistência (Ubea) e a Secretaria Municipal da Saúde (SMS) contra a liminar que suspendeu o contrato entre as instituições.
No último dia 22, a juíza Andreia Terre do Amaral, da 3ª Vara da Fazenda Pública do Foro Central de Porto Alegre, determinou a suspensão da transferência do setor materno-infantil. A magistrada atendeu a pedido liminar do Ministério Público (MP), que alega que prefeitura firmou o convênio e começou a transferência antes da manifestação do Conselho Municipal de Saúde (CMS).
De acordo com o diretor do Hospital São Lucas, Leandro Firme, a instituição não tem condições financeiras de manter o serviço de obstetrícia e pediatria. Isso porque o hospital acumula uma dívida de R$ 300 milhões, além de um déficit de R$ 75 milhões por ano.
— Infelizmente, se o contrato for suspenso em definitivo, não temos como manter esses serviços. O endividamento é muito crítico. Lamentaremos muito se isso ocorrer, pois todo nosso esforço até agora foi voltado para a manutenção do atendimento à população — observa.
De olho no futuro e na saúde financeira, o São Lucas lançou um reposicionamento em que prioriza os atendimentos de alta complexidade.
— Em nove anos, o Rio Grande do Sul terá a pirâmide invertida em número de idosos e crianças. Será o primeiro Estado no Brasil (a atingir esse patamar), ou seja, o sistema de saúde tem apenas nove anos para se adaptar. Esse movimento que fizemos com a prefeitura tinha esse propósito central no começo, sermos protagonistas de um movimento necessário de transformação de todo o sistema para prevenir e tratar as doenças que assumem o topo da lista das causas de mortalidade nos país — argumenta.
Segundo Firme, o cenário nacional de queda da natalidade fez com que dezenas de hospitais brasileiros encerrassem maternidades entre 2014 a 2019.
— Nós não queríamos simplesmente encerrar os serviços e desassistir a população. Por isso buscamos, junto à SMS, uma solução para esse impasse. Com o apoio da prefeitura, conseguimos a transferência do serviço para o Presidente Vargas, cuja expertise é o atendimento materno-infantil — destaca.
Já a diretora do HMIPV, Adriani Galão, espera que o convênio seja mantido.
— Para nós é benefício completo, é uma próspera aproximação. Estamos aguardando a decisão e torcendo que se resolva da melhor maneira possível — afirma.
Segundo Adriani, o Presidente Vargas já recebeu 16 leitos de pediatria e seis de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) pediátrica oriundos do São Lucas. Outros seis leitos de psiquiatria devem ser abertos nos próximos dias. Ao todo, o contrato prevê a migração de 82 leitos.
— No início de maio, iniciamos uma reforma em quatro frentes: ampliando a recepção da emergência psiquiátrica; começamos a obra no serviço de nutrição; a reforma do 12º andar para receber 20 leitos de UCI (Unidade de Cuidados Intermediários); e as obras no nono andar, que ficará voltado apenas para a UTI, com 25 leitos — comemora.
Todas essas obras são custeadas pelo Hospital São Lucas, como contrapartida para a assinatura do convênio. Com isso, a capacidade de leitos vai aumentar em 89%.
— O Presidente Vargas é um hospital muito antigo, com 67 anos. Ele era um hotel e depois foi transformado em um hospital. Uma obra executada pela PUCRS consegue agilizar. Além disso, vamos ter a vinda de vários colegas, como médicos, enfermeiros, administrativos — destaca.
MP questiona contrato
Para a promotora Liliane Pastoriz, da Promotoria de Justiça de Defesa dos Direitos Humanos da Capital, a prefeitura assinou o convênio antes de consultar o CMS, o que viola a legislação do próprio município. Além disso, o MP alega que a transferência de leitos de uma instituição para a outra terá impacto negativo nos cofres públicos. Isso porque, segundo a promotora, o repasse mensal da SMS pelo serviço de maternidade era de R$ 847 mil e passará para R$ 969,5 mil, sem levar em conta outros custos previstos no contrato.
Em nota, a SMS afirmou que a “Promotoria demonstra desconhecimento dos fatos” e que “a ação é embasada somente na palavra de sindicatos, que levam em conta interesses particulares”. A prefeitura ainda argumenta que, caso o contrato seja suspenso por definitivo, “implicará em graves prejuízos aos serviços de saúde e à população”.
CMS critica negociação
Em nota, o CMS afirmou que a SMS não só obstruiu as atribuições legais do conselho, ferindo frontalmente a legislação do Sistema Único de Saúde (SUS), como autorizou repasse de recursos de outras ações e serviços sem justificativa, aprovação e previsão orçamentária de um volume de R$ 16 milhões. “Também autorizou a ampliação de gastos com redução de 57 leitos, comparado aos 115 leitos contratualizados no termo firmado anteriormente com o HSL/PUC, e, ainda, destinando incremento de recursos referentes à Operação Inverno, divergente do que estabelece a Lei nº 12.696, de 23/03/2020, no seu artigo 3º sob a forma de recrutamento de pessoal pelo município”, afirma, em nota.
Convênio acadêmico com a Santa Casa
Em março, estudantes e professores da PUCRS protestaram contra o fechamento do setor materno-infantil no Hospital São Lucas. Segundo eles, a decisão iria prejudicar suas formações, além de diminuir o atendimento disponível na Capital. Em 13 de maio, a universidade firmou um convênio com a Santa Casa de Porto Alegre para que os alunos da área da saúde realizem atividades práticas no complexo hospitalar. Confirme o reitor da PUCRS, Evilázio Teixeira, a parceria atuará em quatro frentes: ensino, pesquisa, gestão e inovação:
— Viemos discutindo, dentro do planejamento estratégico, um reposicionamento do hospital. O São Lucas estava recebendo em torno de 180 partos por mês. Temos alguns estudos sobre o perfil da saúde do Rio Grande do Sul, que (indicam que) o número de partos diminuiu significativamente. Em Porto Alegre baixou, nos últimos 10 anos, cerca de 150%. No São Lucas, tínhamos um número pequeno de partos que poderiam ser garantidos com mais qualidade por outros hospitais do SUS. Estamos buscando otimizar o sistema, dando a melhor resposta à comunidade.
Acréscimo de leitos no HMIPV
Pediatria - de 10 para 50
Psiquiatria - 18 para 24
UTI Neonatal - de 10 para 25
UCI Neonatal - de 12 para 20
UCI Canguru - de zero para um
UTI Pediátrica - de seis para 16