O Ministério Público (MP) solicitou a suspensão da transferência da maternidade e do centro obstétrico do Hospital São Lucas da PUCRS para o Hospital Materno-Infantil Presidente Vargas (HMIPV), ambos localizados em Porto Alegre. Para a promotora Liliane Pastoriz, da Promotoria de Justiça de Defesa dos Direitos Humanos da Capital, a prefeitura assinou o convênio antes de consultar o Conselho Municipal de Saúde (CMS), o que viola a legislação do próprio município.
Além disso, o MP alega que a transferência de leitos de uma instituição para a outra terá impacto negativo nos cofres públicos. Isso porque, segundo a promotora, o repasse mensal da Secretaria Municipal da Saúde (SMS) pelo serviço de maternidade era de R$ 847 mil e passará para R$ 969,5 mil, sem levar em conta outros custos previstos no contrato.
"Relevante considerar que o serviço que será transferido não se restringe à área materno-infantil, posto que serão transferidos seis leitos de psiquiatria. Assim, o Hospital São Lucas está transferindo mais de um serviço para o HMIPV", destaca Liliane no texto da ação civil pública.
O pedido do MP está em análise no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS). O primeiro magistrado a receber a solicitação se manifestou suspeito por já ter se pronunciado sobre o tema anteriormente. Com isso, outro juiz deve ser sorteado para apreciar o processo.
Em nota, a SMS afirmou que a “Promotoria demonstra desconhecimento dos fatos” e que “a ação é embasada somente na palavra de sindicatos, que levam em conta interesses particulares”. A prefeitura ainda argumenta que, caso o contrato seja suspenso, “implicará em graves prejuízos aos serviços de saúde e à população”.
Região desassistida
Na ação civil pública, a promotora Liliane Pastoriz destaca que a transferência da maternidade do São Lucas deixará uma parte da comunidade porto-alegrense desassistida. Segundo ela, Porto Alegre terá quatro maternidades num raio de dois quilômetros. “As comunidades envolvidas, Restinga/Extremo Sul, Partenon, Lomba do Pinheiro, Leste/Nordeste, que tinham o Hospital São Lucas como referência obstétrica e neonatal, não foram consultadas sobre o fechamento desse serviço. O Conselho Distrital da Restinga sempre lutou para ter uma maternidade no Hospital Restinga, mas a gestão alegava que já havia cobertura do atendimento pelo Hospital São Lucas”, destaca o pedido do MP.
Contrato assinado com urgência
Para o Ministério Público, o convênio que permite a transferência do serviço do Hospital São Lucas foi assinado antes do Conselho Municipal de Saúde (CMS) se manifestar. De acordo com a promotora, a prefeitura informou, em audiência no dia 20 de abril, de que o contrato foi assinado na data em que ficou pronto, dia 15 de abril. “Impedindo a análise pelo CMS”, destaca a Promotoria.
Entenda o caso
Em março, o Hospital São Lucas confirmou que estava em estudo o fechamento do setor materno-infantil. A instituição, na época, alegou que o serviço não era rentável, e que o hospital estava se dedicando a procedimentos de alta complexidade para driblar o déficit financeiro.
No dia 17 de abril, a prefeitura assinou convênio prevendo que a instituição fizesse transferência de mobiliário e de equipamentos e remanejasse a equipe médica para o Hospital Materno-Infantil Presidente Vargas (HMIPV). Conforme previsto em contrato, espaços do HMIPV deveriam ser reformados para receber a ampliação dos serviços e alguns, desativados há anos, seriam reabertos.
Ainda em abril, o Ministério Público solicitou a suspensão do contrato de transferência alegando prejuízo à população e aos cofres públicos, além de o Conselho Municipal de Saúde (CMS) não ter sido consultado.
Confira integra da nota da SMS
“A solicitação da Promotoria de Justiça de Defesa dos Direitos Humanos demonstra desconhecimento dos fatos. A ação é embasada somente na palavra de sindicatos, que levam em conta interesses particulares de uma categoria, e não do interesse público. A Secretaria Municipal de Saúde dedica boa parte do tempo a responder diariamente a centenas de perguntas aos membros do Ministério Público, o que muitas vezes atrasa e prejudica as atividades essenciais das equipes de trabalho de assistência à saúde ou de alta direção. Causa estranheza esta posição da Promotoria, no momento em que o município justamente age na defesa da estrutura pública e garante a manutenção de todos os leitos e ainda qualifica a estrutura do Hospital Materno Infantil Presidente Vargas (HMIPV). O órgão municipal ressalta que a medida amplia a estrutura do HMIPV, praticamente dobrando a operação, sem nenhuma redução de serviços dentro da rede de saúde do município. A Secretaria destaca a necessidade de garantir sustentabilidade a um hospital de alta complexidade crucial para o atendimento de cidadãos da capital e do interior e a conjunção de esforços que viabilizou o ganho de escala na área materno-infantil. Diferentemente do alegado na petição, o convênio foi enviado antes mesmo da assinatura para apreciação pelo Conselho Municipal de Saúde (CMS), mas devido à urgência e à garantia de continuidade dos serviços, não foi possível aguardar a manifestação do CMS previamente à assinatura. Por fim, informa-se que as pretensões da Promotoria de Justiça de Defesa dos Direitos Humanos, se deferidas judicialmente, implicarão em graves prejuízos aos serviços de saúde e à população, de forma a preterir o rigor do formalismo à proteção dos direitos humanos.”