"Não podemos ficar com a sensação de que a pandemia já terminou"
Dia 31 de agosto: 22h18min
"Nos últimos dias, temos ouvido falar e temos visto algumas estatísticas demonstrando que o número de pacientes com covid-19 está diminuindo, mas as unidades de terapia intensiva (UTIs) ainda estão cheias, com mais de 300 pacientes internados em Porto Alegre. Portanto, nosso platô continua muito alto.
Aumentou também, obviamente, até em virtude de toda a situação e do inverno, o número de pacientes não covid. Estamos em um limite muito delicado e muito perigoso.
Embora se tenha uma sensação de que as coisas estão voltando ao normal e apesar de estarmos, paulatinamente, sendo liberados do isolamento social, não podemos baixar a guarda. A situação ainda é muito crítica porque nosso platô é muito alto.
A tendência é de que esse número de pacientes não vá diminuir tão rapidamente. Então, é importante não nos descuidarmos de todos os cuidados preconizados e, porque o distanciamento social está sendo mais liberado, não ficarmos com a sensação de que a pandemia já terminou."
"É impactante a alegria do paciente quando ele consegue olhar para o céu"
Dia 24 de agosto: 21h14min
"As restrições impostas pela covid-19 são realmente impactantes, não só para as pessoas que não estão doentes — pelo isolamento ou distanciamento social —, mas especialmente para os doentes, que ficam afastados das famílias. Nós, na medida do possível, tentamos minimizar alguns desses efeitos negativos.
Alguns dias atrás, levamos um paciente a uma área externa contígua ao CTI Adulto do Hospital Moinhos de Vento. É uma área que foi projetada justamente para que os pacientes que estão internados no CTI possam olhar para a rua, olhar para o céu. É uma forma de minimizar todo esse isolamento, mesmo fora da pandemia, quando o paciente está internado há algum tempo.
É impactante a alegria do paciente quando ele consegue olhar para o céu, olhar para a rua, sem ser exposto a nenhum tipo de risco. Foi muito gratificante vê-lo se conectar um pouco com o ambiente de fora, mesmo estando no CTI.
Que nós consigamos compartilhar, cada vez mais, momentos de alegria, e que nós possamos mostrar aos pacientes outro lado do CTI, que não só o lado sombrio do isolamento e do risco que esses pacientes correm."
"Entendemos que a proibição de visitas aos pacientes é uma questão muito, muito difícil"
Dia 11 de agosto: 7h02min
"A covid-19 é uma doença que tem particularidades. O vírus se espalha muito facilmente, contamina muitas pessoas. Isso tem uma magnitude maior no impacto dessa doença.
Além do mais, nós já estamos desde março em um processo de distanciamento social, de muito trabalho dentro dos hospitais, porque os pacientes são mais graves. Isso afeta tanto o nosso lado emocional quanto o físico.
Um aspecto muito importante que tem se tornado difícil é a questão dos familiares visitando os pacientes. Isso não pode acontecer, e não é uma determinação individual, de cada um de nós ou de cada hospital, é por uma questão de segurança assistencial, segurança para todos — para quem visita, para quem é visitado, para todas as pessoas que trabalham ali.
O nosso objetivo é diminuir o trânsito de pessoas dentro das estruturas hospitalares para que o hospital continue sendo também um lugar seguro para quem precisa de atendimento e não tem a covid-19.
Recebemos diariamente muitas queixas e entendemos que é muito difícil, muito difícil. Precisa haver uma aproximação maior entre o médico assistente, aquele que está diretamente relacionado ao paciente, e as famílias. E, mesmo assim, nós entendemos a dificuldade que é o familiar não conseguir visitar o seu ente querido.
Temos a visita virtual, que é interessante. Ela minimiza, mas não resolve a questão da afetividade. Esperamos que as coisas comecem a voltar ao normal o mais breve possível para o bem de todos — o bem físico, emocional, psíquico e social."
"Ter um colega como paciente foi uma experiência difícil e dolorosa, mas com final feliz"
Dia 3 de agosto: 21h34min
"O Leandro Cruz Campos, 38 anos, é nosso enfermeiro intensivista. Ter tido ele como paciente foi uma experiência difícil, dolorosa, mas com final feliz.
E nada melhor do que as palavras dele para expressar e dar significado a toda essa experiência e a esse momento pelo qual ele passou. A alta dele, que está plenamente recuperado, nos dá mais força ainda e nos engrandece como equipe."
Depoimento do enfermeiro intensivista Leandro Cruz Campos, 38 anos, internado no CTI Adulto do Hospital Moinhos de Vento por agravamento do quadro de infecção por coronavírus:
"Trabalho no Hospital de Clínicas de Porto Alegre e no Hospital Moinhos de Vento, nos dois CTIs que recebem pacientes com covid-19. Acabei contraindo o vírus de alguma forma e fiquei internado no Moinhos, no CTI onde trabalho. Foram momentos muito difíceis. Acabei ficando internado 40 dias.
Quando comecei a acordar da sedação, depois de mais de 20 dias sedado, fiquei muito angustiado porque entendia tudo o que estava acontecendo. A equipe foi me falando, aos poucos, tudo o que eu tinha passado. Já estava sabendo de tudo o que vinha acontecendo ao meu redor. Como enfermeiro de CTI, sabia tudo o que vinham aplicando de medicação.
Ao mesmo tempo, me senti muito tranquilo quando percebi que era a minha própria equipe me cuidando, tanto a equipe do dia quanto a da noite. Foram superatenciosos. Em nenhum momento me senti desassistido. Só elogios. Equipe muito bem preparada. Felizmente, consegui ter alta do CTI e, três dias depois, tive alta hospitalar.
Fui visitar meus colegas. Foi muito bom. Estou morrendo de saudade de todo mundo. Sei que, para eles, foi um estímulo. Eles me contaram mais um pouco do que aconteceu enquanto estive sedado. Muitos choraram e agradeceram porque foi estimulante. Sei que tem tido vários casos difíceis, diferentes do meu, mas só o fato de eu visitá-los, estando tão bem recuperado, é um estímulo enorme".
"Sempre atendemos pacientes muito graves, mas não na proporção atual"
Dia 27 de julho: 22h39min
"Nos últimos dias, tem aumentado bastante o número de internações em UTIs. É importante falar sobre como nós, médicos intensivistas, estamos. Nós estamos trabalhando muito, com uma carga horária extra para poder dar conta do recado, para poder atender os pacientes de forma adequada.
E nós sempre atendemos pacientes graves, muito graves, mas não com a proporção que temos hoje nas UTIs dos pacientes com covid-19. Às vezes, são 60% dos pacientes entubados, em ventilação mecânica, que demandam uma atenção maior, com uma doença muito instável e que exige muito do aspecto físico e emocional.
Não é só a colocação dos equipamentos de proteção individual (EPIs) e a retirada desses equipamentos. Nós ficamos mais tempo com esses EPIs, nós nos alimentamos menos, tomamos menos água. Isso vai gerando um cansaço físico e emocional, como eu já falei. E é muito tempo com esse tipo de sobrecarga.
Então, é muito importante que as pessoas que estão sadias, em casa, possam entender que é importante manter todos os cuidados para que se diminua o número de casos. É claro que só 5% dos pacientes, em média, que têm o coronavírus e desenvolvem a doença vão para as UTIs. Mas esses 5%, numa proporção grande da população, impactam muito.
Agora nós estamos pedindo ajuda para que a população entenda isso, para que se possa, definitivamente, diminuir esse número de casos e para que nós possamos continuar fazendo o nosso trabalho, mas com uma sobrecarga um pouco menor. A sobrecarga está muito grande, física e emocionalmente falando."
"Esperamos que a população entenda: não é uma ficção, esse vírus existe, a doença é grave"
Dia 20 de julho: 22h39min
"Os dias têm sido muito pesados, muito longos, muito cansativos. O aumento do número de casos mais a sobrecarga de alguns meses de pandemia, desde março, com muito trabalho, exaustivo e incessante, estão deixando todos nós muito cansados — e apreensivos, pelo entendimento que algumas pessoas têm de que a situação pode não parecer tão ruim.
O que nos alivia, de certa forma, são os casos que têm desfecho positivo, em que as pessoas voltam para as suas vidas normais.
Recentemente, falei de uma paciente que, antes de ser entubada, ligou chorando para a filha. Ela já foi extubada, está bem, está se recuperando. Ainda não teve alta do CTI, mas está prestes a ter.
É esse tipo de situação que nos dá força e cada vez mais ânimo para continuar nessa nossa luta incessante, diária, mas que está muito desgastante.
Nós esperamos que a população toda entenda que não é uma ficção. Esse vírus existe, a doença é grave, e os hospitais já estão ficando quase acima da capacidade de atendimento. Nós precisamos, apesar do cansaço, aumentar o nosso cuidado."
"Profissionais do CTI foram testados para coronavírus"
Dia 15 de julho: 21h37min
"Todos os profissionais do CTI Adulto do Hospital Moinhos de Vento foram submetidos à coleta do exame de PCR para pesquisa do Sars-CoV-2.
Essa foi uma decisão importante, que denota a preocupação com a segurança e a qualidade assistenciais. Tanto a nossa segurança pessoal quando a segurança de cada um dos colegas que trabalha conosco, das pessoas com as quais convivemos e também a segurança dos pacientes.
Fiz a coleta. Meu exame deu negativo. Esse é um cuidado individual, mas é também um cuidado coletivo. A instituição, quando toma essa decisão, sabe que também corre o risco de ter que afastar alguns profissionais, mesmo que eles estejam assintomáticos, e isso traz um impacto muito grande."
"Paciente que pediu para ligar para a filha antes de ser entubada continua em ventilação mecânica"
Dia 15 de julho: 21h35min
"A paciente a que me referi no último relato, que pediu para ligar para a filha antes de ser entubada, continua em ventilação, mecânica.
Tem alguns períodos em que acorda, mas ela ainda não está em uma condição clínica adequada para que a gente evolua no processo de desmame, ou seja, da retirada do ventilador.
Ela ainda tem um processo clínico não controlado e precisa ainda de alguns cuidados, por isso ainda está sedada e em ventilação mecânica."
"Paciente pediu para ligar para a filha antes de ser entubada"
Dia 9 de julho: 23h09min
"A vida de todos nós está passando por um processo de grandes mudanças. Nosso cotidiano está totalmente alterado. E mesmo nós, profissionais da área da saúde, e especialmente nós, os médicos intensivistas, também estamos diante de um dia a dia bastante diferente.
Nesta semana, por exemplo, nós fomos entubar uma paciente de 45 anos, e ela pediu para ligar para a filha. A equipe toda já estava dentro do boxe. Ela ligou chorando e dizendo que seria entubada.
Definitivamente, esta não é uma situação habitual. Nós não estávamos habituados a isso. No nosso dia a dia, até então, o paciente que seria entubado estava em uma condição muito ruim. A família já sabia que ele estava ali no hospital. Normalmente, a família estava perto, acompanhava o paciente até o CTI.
E essa paciente foi lúcida. A família não estava ali com ela, obviamente, porque é uma recomendação evitar o trânsito de pessoas em todos os locais, inclusive dentro do hospital, para que seja um local seguro para todos os profissionais, para toda a equipe que faz a assistência, para os pacientes que não têm covid-19 e para os pacientes que têm a doença.
E ela ligou chorando para a filha dizendo que seria entubada. É um momento de bastante emoção, de fragilidade da paciente, e um momento que nos toca muito, muito porque ela, apesar de não dominar o assunto, sabe que aquele é um momento delicado, sabe que aquela decisão denota gravidade e foi conversar com a filha.
Pode-se imaginar também o sentimento, a insegurança, a angústia de quem está do outro lado da linha ouvindo uma notícia que denota a gravidade de uma doença que está impactando, literalmente, todo mundo."
"Drogas sem comprovação científica: precisamos manter o bom senso para beneficiar o doente"
Dia 8 de julho: 21h11min
"O perfil dos pacientes que têm internado no CTI com covid-19 mudou um pouquinho. Temos tido pacientes mais jovens, tivemos gestantes.
Existem ainda muita dúvida e insistência, especialmente dos familiares, em relação à terapêutica. Nós sabemos que não temos ainda a cura do Sars-CoV-2. Temos algumas evidências de algumas drogas para quando os pacientes precisam de oxigênio, antes de ir para a ventilação mecânica, drogas que tratam infecções bacterianas...
O plasma de convalescente é muito falado, mas o paciente precisa ter um determinado perfil e precisa usá-lo até, de preferência, 14 dias do início da doença.
Segue sendo uma doença que gera muita insegurança e ansiedade pela falta da cura. Muitas pessoas tendem a achar que se deve usar uma terapêutica preventiva, ou, como a gente chama, profilática, ou mesmo no CTI, sem nenhuma comprovação científica.
Para beneficiar o doente, precisamos manter o bom senso, o conhecimento e, especialmente, o conhecimento científico para que não causemos mais dano do que a doença já provoca."
"Dia muito feliz: um colega enfermeiro teve alta do CTI"
Dia 6 de julho: 18h44min
"Hoje foi um dia muito feliz no nosso CTI. Teve alta um enfermeiro intensivista da nossa equipe que também trabalha em outro hospital e estava internado por covid-19, com um quadro grave.
Ele esteve, muitas vezes, em uma situação bem complicada. Por várias vezes, também foi colocado de barriga para baixo, para ventilar melhor, na posição prona, que denota gravidade. Quando se faz isso é porque a situação é grave. Não é o extremo da gravidade, mas é muito grave.
Por ser um colega da nossa equipe, isso mexe muito com a questão emocional. Todos os casos nos tocam pelo lado afetivo, mas este foi um caso especial, por ser uma pessoa muito próxima a nós, que cuidou de muitos pacientes no início desta pandemia aqui no nosso serviço.
Ele cuidou de vários daqueles pacientes mais graves que tivemos lá em março e abril. Estamos muito felizes. Foi motivo de festa. Um dia mostrei para ele (a foto de) um dos pacientes que ele cuidou em situação bem crítica. Esse paciente já foi para casa e pegou o neto no colo.
Toda vez que passava no boxe dele, quando ele já estava se recuperando, eu abanava, fazia coraçãozinho com as mãos.
Foi um dia reconfortante apesar de todo o peso que essa doença está nos trazendo."
"Não temos mais aquele momento do cafezinho entre colegas"
Dia 16 de junho: 22h58min
"A convivência, por mais de três meses, com a covid-19 não gerou apenas mudanças comportamentais no dia a dia das pessoas fora do ambiente hospitalar.
No nosso hospital, usamos máscara e protetor facial durante todo o tempo. Não nos aglomeramos mais. Nossas reuniões são todas virtuais, não fazemos mais reuniões presenciais.
Mesmo as reuniões com discussões de casos e revisão de artigos e as aulas com os médicos residentes, todas elas são virtuais. Isso gera uma mudança bastante importante. Evitamos aquele momento do cafezinho, com todo mundo descontraído. Não fazemos mais.
Todos ficam de máscara o tempo todo. Só a tiramos eventualmente, para tomar água ou café e comer.
São todos processos que mexem bastante com o nosso dia a dia. Isso traz um certo grau de cansaço, mas, ao mesmo tempo, reforça a responsabilidade de fazer aquilo em que acreditamos: proteção individual gera proteção coletiva."
"Intercorrências precisam de atendimento rápido e podem ser fatais"
Dia 15 de junho: 20h46min
"Uma questão bem angustiante, especialmente nos pacientes com covid-19, são as intercorrências que podem acontecer. Normalmente, as pessoas nos perguntam:
— O que são intercorrências?
São alterações clínicas agudas que precisam de atendimento rápido para que esse evento não seja fatal ou que não piore muito a situação do doente.
Especialmente nesses pacientes com coronavírus, as alterações podem acontecer de diferentes formas: alteração aguda na quantidade de oxigênio no sangue, pressão arterial que cai muito rapidamente, arritmia, alteração no tubo endotraqueal (tubo colocado na traqueia que se conecta ao respirador), entre várias outras.
O atendimento precisa ser muito rápido, muito coordenado e com muito conhecimento de toda a equipe do CTI.
Se tem um familiar esperando para fazer uma visita presencial ou se tem uma visita virtual agendada, isso gera muita angústia. A grande dúvida deles é: 'Será que essa intercorrência que está acontecendo é com o meu familiar?'
Muitas vezes, naquele momento, não temos condições de pedir para que espere um pouquinho e explicar que não é com o familiar dele. Mesmo sendo com o familiar dele, gera muita angústia, porque, naquela hora, não podemos dispor do tempo necessário para explicar o que está acontecendo.
Esses atendimentos são feitos por uma equipe que é composta, às vezes, de todo o estafe. Se tem dois médicos ali, os dois entram no boxe porque é um atendimento mais complexo, assim como os enfermeiros e os técnicos de enfermagem.
Claro que não entram todos ao mesmo tempo, mas todas as atenções ficam voltadas para esse paciente, com a equipe disponível, do lado de fora, para poder dar todo o apoio logístico. Não é um boxe onde se possa entrar e sair com a frequência e com a naturalidade empregadas com os pacientes que não têm covid-19 (devido aos cuidados extras referentes à colocação dos equipamentos de proteção individual)."
"Exercícios têm me trazido conforto mental e físico"
Dia 15 de junho: 10h06min
"Estou fazendo atividade física em casa, com um personal trainer, porque a falta de exercícios regulares estava me deixando bastante desconfortável.
Nos finais de semana, tenho andado de bike. Claro que vou com todos os cuidados, uso máscara. Guardo a bicicleta dentro do meu apartamento desde que a comprei, ela não fica exposta na garagem do prédio.
Isso tem me trazido um pouco mais de conforto físico e emocional.
Apesar de todos os nossos protocolos, de todo o preparo do nosso atendimento, da nossa equipe e do hospital, sempre tem alguma outra questão que gera bastante estresse, como a organização de todo esse processo.
Então, ter retomado a atividade física foi um ponto bem importante."
"Beatles para aliviar o isolamento afetivo no CTI"
Dia 11 de junho: 6h54min
"Os pacientes, quando estão internados no CTI por covid-19, têm as visitas restritas.
Esta foi sempre uma preocupação nossa, desde o início: como poderíamos diminuir essa sensação de solidão apesar de ter toda a equipe assistencial ali, para cuidar deles. Mas, na maioria das vezes, eles se sentem muito sozinhos, obviamente. Para não dizer na totalidade dos casos.
Nós optamos por permitir o uso de tablet, celular ou computador, caso o paciente queira e possa fazer contato com a família e os amigos por meio desses dispositivos. Isso minimiza um pouco essa sensação ruim e muito desagradável de isolamento afetivo, mas é óbvio que não a elimina totalmente.
O paciente também pode ouvir suas músicas, ter sua playlist. Teve um paciente nosso que, durante a fase de recuperação, depois de ter saído do respirador, ouvia Beatles dentro do boxe.
É uma forma de tentarmos amenizar o comprometimento emocional desses pacientes."
"Aumentou muito o número de doentes graves com covid-19"
Dia 10 de junho: 7h01min
"O número de pacientes graves com covid-19 aumentou muito nos últimos dias, em comparação a semanas anteriores. Isso demanda muito trabalho e causa preocupação nos profissionais da área da saúde — e isso deveria gerar preocupação também na população.
Ontem, estava me deslocando no hospital pelo elevador — um elevador relativamente grande. Só estava eu lá dentro. Entrou uma senhora. Perguntei qual era o andar, apertei o botão para ela. Ela me perguntou:
— Tem muitos pacientes com covid aqui no hospital?
Eu disse:
— Temos alguns, tanto no CTI quanto na Enfermaria. Por quê? A senhora tem algum familiar aqui?
Ela respondeu:
— Sim, meu irmão.
Perguntei se ele estava com a doença. Ela explicou que não, que ele tinha sido internado para fazer uma cirurgia. Como as visitas são restritas para que se diminua a circulação de pessoas dentro do hospital, vi que ela o tinha visitado e já estava indo embora. Conversamos sobre a preocupação deles, já que ele tinha que fazer a cirurgia.
Me apresentei, me coloquei à disposição, falei que o hospital estava preparado e que, embora exista esse medo da população, algumas pessoas precisam fazer alguns procedimentos fundamentais para se manterem, minimamente, com a saúde em dia.
Realmente, as pessoas estão com medo, o que demonstra que nós devemos continuar com todos os cuidados com a saúde, evitando o vírus. Mas também não podemos deixar que outras doenças não sejam tratadas ou cuidadas."
"Profissionais da saúde que se contaminaram em outros hospitais foram internados aqui"
Dia 8 de junho: 22h40min
"Nos últimos dias, fomos surpreendidos por um aumento significativo do número de pacientes com covid-19. Recebemos pacientes transferidos do Interior e profissionais da área da saúde que se contaminaram em outros hospitais. Voltamos a ter pacientes muito graves. Na grande maioria dos casos, eles tiveram que ser entubados.
Conversei com um deles, um colega. Estava um pouco preocupado. Antes de sair do boxe, perguntei se poderia ajudá-lo de alguma forma, se ele queria alguma coisa. Disse que eu e toda a equipe estávamos ali à disposição. Ele me olhou e disse:
— Quero é ouvir que não tenho mais esse vírus e que passei por tudo isso.
É uma situação bastante preocupante. Precisamos ainda ter um certo distanciamento social, mesmo que controlado, mas com muito cuidado e mantendo todos os procolos de segurança que todos já conhecemos: uso de máscara, higienização das mãos. A situação está voltando a um patamar ruim, com número de casos aumentando e pacientes muito graves."
"'Embora ela tenha idade, estou sofrendo. É minha mãe", disse a filha da paciente com mais de 90 anos"
Dia 27 de maio: 21h54min
"Ontem, quando eu estava saindo da área isolada do CTI, onde ficam os pacientes com suspeita ou confirmação de infecção por coronavírus, estava sentada, em uma das cadeiras da recepção, uma senhora com máscara, protetor facial, bolsa e uma sacola com alguns pertences. Tinha o olhar perdido.
Antes de entrar no elevador, perguntei:
— Tudo bem? A senhora está esperando alguém? Esperando alguma coisa?
Ela disse:
— Minha mãe está aí.
Começamos a conversar. A mãe dela tem mais de 90 anos, está com coronavírus. Contaminou-se em uma clínica para idosos. A filha estava bem triste, começou a chorar. Não só pela questão da doença — obviamente que a covid-19 já é bem grave —, mas pela idade avançada da mãe. Como ela disse, "é minha mãe".
— Embora ela tenha idade, eu estou sofrendo. Fico preocupada, angustiada — acrescentou.
Falamos de aspectos importantes do cuidado, da estrutura, do que os médicos intensivistas e toda a equipe da terapia intensiva dentro do CTI têm para oferecer. De certa forma, expliquei para ela que, mesmo não tendo um remédio que cure o vírus, temos estrutura, equipamentos e equipe treinada para cuidar de pacientes muito graves, especialmente aqueles com covid-19.
Ela secou as lágrimas, se acalmou. Em seguida, o técnico de enfermagem a chamou para visitar a mãe.
Realmente, independe da idade das pessoas, independe de saber se tem uma estrutura. O abalo emocional, o abalo afetivo, a tristeza, a angústia, a proximidade da perda, isso mexe muito com todos nós. Não só com ela que é filha, mas com toda a equipe também. É uma pessoa que poderia estar em uma condição melhor se não estivesse doente por causa de um vírus que a acometeu, talvez, inadvertidamente."
"O quadro muda rapidamente: voltamos a ter pacientes graves"
Dia 26 de maio: 21h10min
"No final de semana, estávamos com um número relativamente estável de pacientes, especialmente o de pacientes com suspeita ou confirmação de covid-19. Nos últimos dias, temos notado um aumento significativo no número de pacientes que chegam ao hospital e alguns também sendo transferidos para o CTI.
Este é um quadro que muda muito rapidamente. Voltamos a ter mais pacientes e pacientes graves. Temos mais um paciente em posição prona, ou seja, ele foi colocado de bruços, para respirar (melhor), e isso denota gravidade. Quando o paciente é colocado de barriga para baixo significa que, quando ele estava de barriga para cima, em posição supina, a estratégia ventilatória, os parâmetros do respirador não conseguiam manter a oxigenação, então tivemos de colocá-lo de barriga para baixo.
Sabemos que o distanciamento social é importante em termos de impacto na economia, mas em termos de impacto na saúde também. É um momento muito delicado que estamos vivendo. As pessoas precisam trabalhar, mas os casos vêm aumentando.
Às vezes, são internados muitos pacientes simultaneamente — três, quatro, cinco na área de covid-19. E o número de pacientes não covid-19 também tem aumentado. Começa a preocupar o número de leitos disponíveis. Ainda os temos, mas lembro que os pacientes com covid-19 ocupam por mais tempo esses leitos, eles ficam por mais tempo internados, e os outros casos também precisam ser atendidos.
Nós precisamos, nesse momento, ter bastante cuidado e vigilância. E não podemos relaxar nas medidas individuais e coletivas, com uso de máscara e higienização das mãos sistematicamente."
Estamos preocupados com os pacientes que têm medo de ir ao hospital"
Dia 24 de maio: 17h29min
"Foi um final de semana tranquilo em termos de taxa de ocupação do CTI, com uma diminuição. Tivemos dois pacientes suspeitos de infecção por coronavírus e dois com a doença confirmada, um número bem abaixo daquilo que imaginávamos que pudéssemos ter agora. De qualquer forma, também temos um número muito grande de pacientes não covid-19.
O que mais me chamou a atenção neste final de semana, em que fui no hospital e falei com os colegas de todas as áreas do CTI — vendo não só os pacientes com coronavírus, mas os outros também —, foi a impressão, que todos nós temos, de que os pacientes estão demorando para chegar ao hospital. Alguns, mesmo com covid-19, não estão se sentindo muito bem e esperam mais porque têm medo.
Essa questão está nos preocupando bastante. Temos uma pandemia com alta taxa de pacientes infectados em todo o Brasil, mas não podemos esquecer de reforçar que, se o paciente precisa do hospital, ele tem que vir, independentemente de ser covid-19 ou não, mesmo sendo outra doença, para que ele não tenha o quadro agravado.
Estamos bem impressionados com o impacto do distanciamento social. Ainda temos leitos de UTI disponíveis, uma taxa de ocupação baixa, o que dá uma certa segurança e um pouco de orgulho de como nós estamos entendendo, frente ao quadro nacional e mundial, a importância de nos cuidarmos. Mesmo com o distanciamento controlado, que nós mantenhamos o cuidado e nas nossas atitudes."
"O filho encostou a cabeça no vidro e chorou compulsivamente"
Dia 21 de maio: 21h51min
"Tratar pacientes com covid-19 tem proporcionado uma experiência especialmente importante com relação ao manejo não só do doente como dos familiares. Lembro-me bem de um paciente que, logo no início da internação, recebeu a primeira visita do filho.
Diante daquele quadro de uma pessoa que foi surpreendida por uma doença infecciosa viral grave, o filho, quando olhou o pai, da porta do boxe, encostou a cabeça no vidro e chorou compulsivamente. Fui ali para ver o que estava acontecendo. Durante quase cinco minutos, não consegui abordá-lo. Esperei, deixei que ficasse naquele momento de total introspecção, tristeza e desespero.
No momento em que julguei necessário, perguntei se ele queria sentar. Ele disse que não queria ficar sentado. Depois, me apresentei, disse que eu era uma das médicas do CTI. Conversamos um pouco.
Esse paciente foi melhorando. Reencontrei o filho dele na semana passada. Aí, conversamos em uma outra condição.
— Você se lembra daquela primeira vez? — perguntei.
— Foi horrível — ele respondeu, explicando que não recordava dos detalhes.
Tivemos uma conversa bem mais tranquila. Ele já estava sorrindo.
Me preocupa bastante que as pessoas estejam com medo de ir para o hospital por causa da covid-19. Os hospitais estão preparados para atender todos os pacientes. Pessoas doentes, com suspeita ou não de covid-19, têm que receber atendimento. Os hospitais estão preparados. Imagine alguém que tem outra doença e não vai ao hospital — essa pessoa pode falecer. A covid-19 realmente é muito grave, abala muito, como abalou esse filho de que falei aqui, mas existem outras doenças também. É muito importante passar essa mensagem."
"Cloroquina e hidroxicloroquina: faltam evidências científicas e avaliamos caso a caso"
Dia 20 de maio: 21h32min
"Hoje foi publicada uma diretriz do Ministério da Saúde sobre o tratamento da covid-19. Independentemente disso, a pergunta sistemática de familiares, pacientes, amigos e pessoas que nos conhecem é: qual é o protocolo de tratamento no CTI do hospital?
Tratando-se de pacientes graves: quando esse paciente é admitido no CTI, em primeiro lugar, o objetivo é tratar todos os sistemas do organismo que estão com disfunção. Se for disfunção ventilatória, avaliamos a necessidade de oxigênio por cateter nasal ou entubação. Caso o paciente tenha uma infecção bacteriana suspeita ou confirmada, opta-se por terapia com antibiótico. Se tiver outra doença, discutimos manter ou não o tratamento dessa doença.
Com relação à covid-19 e ao vírus Sars-CoV-2, o uso de cloroquina ou hidroxicloroquina e outra droga associada, como a azitromicina, ainda não se tem evidência científica para que sejam administradas a todos os pacientes muito graves. Sempre tem uma avaliação do risco-benefício. O risco está relacionado aos efeitos colaterais da droga única — cloroquina ou hidroxicloroquina — mais a associação com a azitromicina. Essas drogas têm alguns efeitos, especialmente cardiológicos, que podem levar à contraindicação.
Como não existe tratamento comprovadamente curativo, avalia-se caso a caso. Com o médico assistente, que é o médico do paciente, define-se o tratamento. Mas não existe evidência científica clara de que temos que usar para todos os pacientes. Independentemente da opinião, digamos assim, com intuito político sobre essa terapêutica, o que nós usamos é uma opinião científica, e para isso precisamos analisar caso a caso."
"Demos alta para o nosso primeiro paciente mais grave, internado em março"
Dia 18 de maio: 22h51min
"Hoje nós demos alta do CTI para o nosso primeiro paciente mais grave, internado na primeira quinzena de março. Foi um paciente que, realmente, esteve em estado muito grave. Logo que chegou, foi entubado (conectado a um respirador artificial). Algumas horas depois, foi colocado de barriga para baixo, na posição prona (para melhorar a oxigenação no sangue), e isso já demonstrava a gravidade do caso.
Ele respondeu bem à manobra e foi evoluindo razoavelmente bem, mas teve muitas complicações. Durante esse turbilhão, teve várias complicações ameaçadoras à vida. Esteve muito perto da morte por, no mínimo, duas vezes. Nesse meio-tempo, nasceu o neto dele.
Hoje, ele estava acordado, lúcido, conversando. Foi retirada a traqueostomia, ele está só com um curativo no pescoço, já tentando falar, recuperando-se bem. Embora possa parecer que nós só dizemos coisas boas, não temos só coisas boas, como tenho falado sistematicamente. Temos notícias ruins, às vezes, mas, no meio de toda essa confusão e de todos os problemas, é muito importante o posicionamento tranquilo e confiante da família. E essa foi uma família especial.
Apesar de todas as complicações e de todas as chances de um desfecho ruim, eles sempre se mantiveram confiantes em toda a equipe e no médico assistente e sempre nos passaram muita tranquilidade para que tomássemos as melhores decisões. Garantiram que estavam do nosso lado. E isso é muito importante: esse sentimento de união da equipe que trata com a família que espera.
E hoje o paciente está pronto para ir para o quarto. Em breve, provavelmente, ele vai ter alta hospitalar e conseguir pegar o neto no colo — essa criança que é o primeiro neto, o primeiro filho, o primeiro sobrinho e que nos dá muita alegria."
"Paciente sai do CTI quando pode deixar de ser monitorizado 24 horas por dia"
Dia 17 de maio: 23h14min
"Muitas vezes, os pacientes que precisam dos centros de tratamento intensivo (CTIs) ficam muito apreensivos, especialmente os seus familiares, e querem sair rapidamente dessa unidade. Na realidade, o paciente vai sair no momento em que tiver condições adequadas para ser cuidado em um quarto da Enfermaria.
Pode parecer que demora muito, mas, para sair de uma unidade onde está monitorizado 24 horas, com equipe médica e de enfermagem, ele precisa ter condições adequadas. Na Enfermaria, o cuidado é tão bom quanto o do CTI, mas não com a mesma vigilância. Às vezes, (é preciso resolver questões) muito importantes, como força muscular, deglutição, capacidade de chamar alguém ou de o próprio paciente mudar de posição na cama.
Então, às vezes, o tempo de permanência no CTI é maior para que ele adquira condição adequada para ir, com segurança, para o quarto."
"Traqueostomia gera angústia nos pacientes porque a voz não sai"
Dia 13 de maio: 21h47min
"Os pacientes com covid-19 que internaram no nosso CTI e precisaram de ventilação mecânica se caracterizaram por um quadro bastante grave, com tempo de ventilação prolongado — em média, mais de 20 dias —, e alguns deles precisaram de traqueostomia (incisão feita no pescoço para passagem do ar).
O paciente perde bastante peso, força muscular, precisa aprender a ter a percepção da saliva e a engolir — não só pela presença da traqueostomia, mas por todo esse tempo de doença bem grave.
No momento do desmame (processo de retirada) da ventilação, eles já estão acordados, começam a ter a percepção das coisas, a tentar se comunicar. Como eles tentam falar e a voz não sai — para que a voz saia, o ar tem que passar pelas cordas vocais, e, com a traqueia aberta, o ar sai por ali, não passando pelas cordas vocais —, isso os angustia, embora eles saibam que aquela traqueostomia será temporária e que, em breve, estarão sem aquele buraquinho na traqueia. Já estamos acostumados e, geralmente, entendemos o que os pacientes querem dizer.
Nas últimas duas semanas, tenho notado a impaciência dos pacientes, que estão loucos para sair do CTI, e também dos familiares. Mas é importante que a alta do CTI seja em um momento seguro para o paciente porque ele vai sair de um ambiente onde tem monitorização e equipe médica e de enfermagem 24 horas por dia à disposição, vigiando-o muito de perto, para ir para o quarto, onde a dinâmica de trabalho é completamente diferente. O paciente precisa ter todas as condições para que possa ser atendido no quarto.
Isso leva tempo. Por isso que o paciente precisa ter paciência."
"Um dia para comemorar o trabalho da Enfermagem"
Dia 12 de maio: 23h07min
"Hoje é o Dia Internacional da Enfermagem, dos enfermeiros e das enfermeiras, muito comemorado.
Um Centro de Tratamento Intensivo, onde trabalho, é uma área fechada dentro do hospital que se caracteriza por um atendimento multidisciplinar. Há médicos intensivistas, enfermeiros, técnicos de enfermagem, fisioterapeutas, nutricionistas, psicólogos, fonoaudiólogos, equipe administrativa.
Existe um aforismo em Medicina que diz: 'Eu curo algumas vezes, eu trato muitas vezes, mas eu cuido sempre'. Esse é o nosso objetivo, que só é alcançado com essa equipe, em que cada um tem o seu papel, a sua área de atuação. Então, hoje, o dia foi especialmente comemorado, mas essa equipe tem que ser sempre destacada."
"Equipe cantou hino do Grêmio para paciente que saiu caminhando do CTI"
Dia 11 de maio: 22h36min
"Hoje demos alta, no CTI, a um paciente jovem que internou há pouco mais de um mês. Ele ficou um período com oxigênio por cateter nasal, depois com outro dispositivo (autofluxo de oxigênio). Chegou a receber uma visita virtual da esposa e do filho menor. Depois dessa visita, naquele dia, ele foi entubado.
Esse paciente ficou bastante tempo em ventilação mecânica, e acabou precisando de traqueostomia. No processo de desmame (retirada gradual do respirador artificial), ele foi relativamente bem. Ficou um tempo a mais no CTI, além do que se poderia imaginar, porque teve distúrbio de deglutição (dificuldade para engolir), um pouco mais de secreção e de falta de ar.
Foi um paciente que se sentiu bastante abalado pela doença, pelo medo. Várias vezes, conversamos sobre o período que ele ainda precisaria ficar lá. Ele estava querendo muito ir embora. Falamos sobre os filhos, sobre a esposa. Ela acabou tendo um período de internação no hospital, não no CTI, mas também com covid-19, e foi embora muito abalada com o esposo ali, entubado, com medo de que ele não sobrevivesse.
Algumas vezes, tentei acalmá-la, explicando que era uma situação delicada, mas que precisaria de tempo para ele se recuperar. Ele acabou entendendo. Na semana passada, comentou:
— Eu quero ir para o quarto, mas vocês vão todos comigo!
Hoje, ele foi embora, e de uma forma muito inusitada. Todo mundo que trabalha em hospital sabe que, quando o paciente tem alta, depois de uma internação prolongada, ele é levado de cadeira de rodas até a porta do hospital, mesmo que esteja bem. E só então ele se levanta e sai. É um protocolo do hospital. Hoje, esse paciente saiu caminhando do CTI, sob aplausos. Ele é gremista, e todos cantaram o hino do Grêmio. No final, ele bateu uma foto com a equipe toda. A máscara dele tinha o símbolo do time.
É para demonstrar como, em uma situação de fragilidade de todos nós, quebram-se paradigmas. Sair caminhando do CTI para a Enfermaria não foi nenhuma quebra de protocolo em termos de falta de segurança. Muito antes pelo contrário! Ele ter saído caminhando demonstra como estava forte, já falando, muito feliz, nada abalado, do ponto de vista emocional, como estava antes."
"Quando falei com minha mãe, me emocionei mais do que imaginava"
Dia 10 de maio: 23h32min
"Este foi um final de semana especialmente carregado de emoção pelo Dia das Mães. Impossível não ver as mães que estão internadas, doentes, com covid-19, as mães que perderam filhos no Brasil, no mundo... Mas especialmente no Brasil, onde estamos em uma fase de aparente descontrole em algumas regiões.
A minha mãe não mora em Porto Alegre. De certa forma, acostuma-se com a distância, mas uma distância imposta traz todo um outro significado, uma carga emotiva muito maior. Hoje, quando falei com ela, me emocionei mais do que eu imaginava. A nossa distância já é bem aceitável, digamos assim, tanto da minha parte quanto da dela. Da mesma forma, quanto a minha tia que mora aqui, que é uma segunda mãe para mim, é difícil não vê-la, não abraçá-la.
Outra questão bem importante é que estamos tendo vários relatos dos pacientes que já saíram do hospital. Um paciente se manifestou por rede social agradecendo à equipe. Ele não foi entubado, então via toda a movimentação dentro do CTI. Destacou especialmente o medo, a ansiedade, a expectativa dele pelo que ia acontecer, os vários momentos muito difíceis, as reflexões que fez da vida.
É importante (conhecer as sensações de) alguém que vivenciou ali, tão de perto, bem lúcido, a experiência dele, uma experiência muito ruim, com uma carga emocional e de medo, e a expectativa da equipe. Ele foi um dos nossos primeiros pacientes, então ouvia os comentários, via os outros pacientes entubados, em ventilação mecânica. Ele também vivenciou a reação dos familiares frente a uma situação tão difícil. "