A Polícia Federal (PF) cumpriu um mandado de busca e apreensão na manhã desta quarta-feira (3) na residência do ex-presidente Jair Bolsonaro e de sua esposa, Michelle, em Brasília. A ação faz parte da Operação Venire, que investiga um grupo suspeito de inserir dados falsos sobre vacinação contra a covid-19 em sistemas do Ministério da Saúde entre novembro de 2021 e dezembro do ano passado.
Ao todo, a PF cumpriu seis mandados de prisão e 16 de busca e apreensão em Brasília e no Rio de Janeiro. Entre os presos, estão Mauro Cid, que foi ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, o policial militar Max Guilherme e o militar do Exército Sérgio Cordeiro, que atuaram como seguranças do ex-presidente, e o secretário de governo de Duque de Caxias (RJ), João Carlos de Sousa Brecha.
Ao longo do seu mandato na presidência da República, que abrangeu a pandemia de covid-19, Bolsonaro protagonizou uma série de polêmicas envolvendo desde tratamentos contra a doença até a campanha de vacinação — à qual o ex-presidente sempre se declarou contrário —, culminando na operação desta quarta-feira. A seguir, GZH relembra, em ordem cronológica, os principais fatos. Confira:
1. Bolsonaro recomenda medicamentos sem eficácia comprovada
Durante sua gestão, e mesmo no auge da pandemia, Bolsonaro recomenda o uso de medicamentos sem eficácia comprovada para tratar a covid-19, como cloroquina e ivermectina. Por conta disso, em fevereiro de 2021, o Supremo Tribunal Federal (STF) encaminha ao procurador-geral da República, Augusto Aras, uma acusação do PDT contra o então presidente.
A notícia-crime, assinada pela ministra Rosa Weber, menciona também o fato de Bolsonaro exibir uma caixa de cloroquina sobre sua mesa durante exibição das suas tradicionais transmissões ao vivo nas redes sociais, o que incentivava o uso da droga.
2. O então presidente se mostra relutante à vacinação
Em 28 abril de 2021, o então presidente afirma que tomaria o imunizante "depois que o último brasileiro tomar a vacina". A declaração foi dada aos seus apoiadores na saída do Palácio da Alvorada, em Brasília.
— Tem gente apavorada. Então, tome a vacina na minha frente. Eu sou chefe de Estado e tenho que dar exemplo. Meu exemplo é esse: já que não tem (vacina) para todo mundo, (quero) deixar que tomem na minha frente. Sempre foi assim. Sou o último a "comer no quartel" — afirmou, na ocasião.
3. Chefe do Executivo declara que não tomará o imunizante
Em 12 de outubro de 2021, Bolsonaro declara, durante participação em programa da rádio Jovem Pan, que optou por não tomar a vacina contra a covid-19:
— Eu decidi não tomar mais a vacina. Estou vendo novos estudos, e minha imunização está lá em cima. Para que vou tomar? Seria a mesma coisa que você jogar R$ 10 na loteria para ganhar R$ 2. Não tem cabimento isso daí.
Bolsonaro justifica que, que como já havia contraído a doença, teria supostamente adquirido alto de anticorpos contra o vírus. A tese é refutada por especialistas, segundo os quais, mesmo quem já teve covid-19 deve tomar o imunizante. A Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), ligada à Organização Mundial da Saúde (OMS), recomenda a vacinação dessas pessoas "independentemente de terem apresentado sintomas ou ficado muito doentes".
4. Bolsonaro afirma que não vacinará sua filha
Mesmo diante da recomendação de médicos e a aprovação da vacina contra a covid-19 pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Bolsonaro volta a criticar o imunizante. Em 27 de dezembro de 2021, declara que as mortes de crianças em decorrência da doença não justificavam a adoção de uma vacina.
Na mesma ocasião, Bolsonaro afirma que não irá imunizar sua filha Laura, então com 11 anos.
5. Cartão de vacinação é protegido pelo sigilo de cem anos
Durante o governo de Jair Bolsonaro, é decretado sigilo de cem anos a uma série de informações que passam a ser protegidas. Entre elas, estão dados relacionados à pandemia, como:
- Compra de vacina: envolve contratos de compra da vacina indiana Covaxin. Na época, a negociação acabou sendo investigada pela CPI da Covid, que conseguiu derrubar a restrição de acesso às informações pela Justiça.
- Vacinação de Bolsonaro: o cartão de vacinação do presidente estava sob sigilo, com alegação de que os dados "dizem respeito à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem". Com o decreto, ficou impossível saber se Bolsonaro havia ou não tomado as vacinas contra a covid-19.
6. CGU cria grupo para reavaliar sigilos
Em 3 de janeiro deste ano, sob gestão do novo governo federal, comandado por Luiz Inácio Lula da Silva, o advogado Vinicius Marques de Carvalho assume o comando da Controladoria-Geral da União (CGU) e afirma que a Lei de Acesso à Informação (LAI) será respeitada.
A pedido de Lula, Carvalho cria um grupo de trabalho para reavaliar os sigilos decretados durante a gestão de Bolsonaro. Segundo a pasta, o ex-presidente reduziu a transparência e impediu o acesso a alguns dados públicos, impondo segredo em documentos solicitados por cidadãos por meio da LAI sem justificativa legal.
— (É preciso) Resgatar a confiança da população de que a regra é a transparência e o sigilo é exceção — afirmou o advogado na época.
7. Bolsonaro dá entrada em pedido de visto legal nos Estados Unidos
Em 27 de janeiro deste ano, Bolsonaro dá entrada no pedido de visto legal para permanecer por seis meses nos Estados Unidos. O ex-presidente já estava no país desde o dia 30 de dezembro de 2022, mas seu visto, que é utilizado no casos de diplomatas e chefes de Estado, teria duração de somente 30 dias. Felipe Alexandre, advogado de Bolsonaro no processo, teria aconselhado seu cliente a tentar ficar no país enquanto aguardava a análise do pedido.
A ida de Bolsonaro aos Estados Unidos traz à tona novamente o assunto da vacinação, já que para ingressar no país norte-americano naquele período era exigido a atualização das doses da vacina contra covid-19 e a apresentação da carteira de vacinação.
8. CGU retira sigilo da carteira vacinal de Bolsonaro
Em fevereiro deste ano, a CGU decide retirar o sigilo da carteira vacinal do ex-presidente. Segundo a pasta, os registros do cartão seriam repassados, inicialmente, a todas pessoas que requisitassem o acesso aos dados, mediante a LAI.
Antes dessa decisão, Vinicius Carvalho, ministro da CGU, explica, em coletiva de imprensa, que dados de pessoas públicas podem ser divulgados em determinadas circunstâncias:
— Dados pessoais podem vir a público se houver interesse público manifesto.
9. Suspeita de adulteração da carteira vacinal do ex-presidente
Em 18 de fevereiro deste ano, Vinicius Carvalho declara publicamente que a CGU apura uma possível adulteração da carteira vacinal de Jair Bolsonaro. Se a hipótese fosse confirmada, o documento seria divulgado publicamente.
O advogado ainda reitera que, no sistema do Ministério da Saúde, há registro de vacinação de Bolsonaro contra a covid-19, o que contraria a declaração do ex-presidente sobre não ter tomado o imunizante.
— Esse registro existe. Esse registro, se ele está no ofício da CGU, eu não tenho como negar — afirmou o ministro da CGU à CNN Brasil.
10. Operação policial investiga adulteração em carteira vacinal
Com a quebra de sigilo e o andamento do processo comandado pela CGU, Bolsonaro fica sob supeita de ter adulterado dados da carteira vacinal. Por conta disso, é incluído em uma lista com outros nomes de envolvidos em suposta falsificação de dados do cartão de imunização.
A investigação policial apura ainda se houve adulteração de dados dos cartões vacinais de Michelle Bolsonaro e da filha do casal, Laura, 12 anos.
Conforme divulgado pelo portal g1, os nomes envolvidos em suposto esquema que forjava dados da vacinação contra a covid-19 são:
- Ailton Gonçalves Moraes Barros
- Camila Paulino Alves Soares
- Claudia Helena Costa Rodrigues
- Eduardo Crespo Alves
- Farley Vinicius Alcantara
- Gabriela Santiago Ribeiro Cid
- Gutemberg Reis de Oliveira
- Jair Messias Bolsonaro
- João Carlos de Souza Brecha
- Luis Marcos Dos Reis
- Marcelo Costa Camara
- Marcelo Fernandes De Holand
- Marcello Moraes Siciliano
- Mauro Cesar Barbosa Cid
- Max Guilherme Machado de Moura
- Michelle de Paula Firmo Reinaldo Bolsonaro
- Sergio Rocha Cordeiro
11. PF cumpre mandado de busca e apreensão na casa de Bolsonaro
Durante busca e apreensão na residência de Bolsonaro e Michelle, são apreendidos os celulares do casal. Segundo informação do jornal O Globo, o ex-presidente e sua esposa relutaram até fornecerem as senhas, mas acabaram cedendo.
A PF acredita que a suposta falsificação tinha como objetivo garantir a entrada do ex-presidente, familiares e auxiliares próximos nos Estados Unidos, burlando assim, a obrigatoriedade da vacinação exigida no país.
Se for comprovada a adulteração dos dados, os envolvidos poderão ser condenados a 10 anos de prisão em solo americano.
12. Ex-presidente nega que tenha adulterado cartão vacinal
BOlsoanro é intimado nesta quarta-feira a prestar depoimento. Na saída da delegacia, volta a afirmar que ele e sua filha não se vacinaram e nega que tenha adulterado o cartão vacinal:
— Nunca me foi pedido cartão de vacina em lugar nenhum. Sempre disse que não me tomei. Não existe adulteração da minha parte. Não tomei a vacina, ponto final. Nunca neguei isso.