A Polícia Federal abriu inquérito para investigar se o presidente Jair Bolsonaro cometeu crime de prevaricação no caso da vacina indiana Covaxin. A investigação foi instaurada após pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR) e de autorização da ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF).
Segundo apurou o jornal O Estado de S. Paulo, a PF ainda prepara as primeiras diligências a serem cumpridas na apuração. O Palácio do Planalto ainda não se manifestou sobre o assunto.
O inquérito é aberto após o deputado federal Luis Miranda (DEM-DF) ter afirmado que avisou o presidente sobre supostas irregularidades nas negociações pelo imunizante contra a covid-19. O parlamentar fez a denúncia junto ao irmão, que é servidor do Ministério da Saúde e diz ter sofrido "pressões atípicas" para liberar a compra da Covaxin.
Em entrevista à Rádio Gaúcha no sábado (10), durante visita a Porto Alegre, Bolsonaro confirmou que o deputado pediu uma reunião com ele em Brasília. O presidente, entretanto, não confirmou o teor do encontro e disse que o parlamentar "pediu uma audiência para conversar sobre vários assuntos".
— Não me reuni. Ele pediu uma audiência para conversar comigo sobre vários assuntos. Cara, você vai ouvir o que eu quero falar. Eu não respondo sobre reunião. Eu tenho reunião com cem pessoas por mês, dos assuntos mais variados possíveis. Eu não posso simplesmente, ao chegar qualquer coisa pra mim, tomar providência imediatamente. Tomei providência nesse caso — disse.
Questionado sobre a Covaxin, o presidente respondeu:
— Gastamos um centavo com a Covaxin? Me responda: eu gastei um centavo? Além dos filtros do Ministério da Saúde, você tem o compliance nosso, tem a CGU (Controladoria-Geral da União), tem o TCU (Tribunal de Contas da União) e tem eu no final da linha, que só compra passando pela Anvisa.
As suspeitas de irregularidades na compra da Covaxin surgiram após os relatos dos irmãos Miranda e viraram alvo da CPI da Covid. No final de junho, o Ministério da Saúde decidiu suspender temporariamente o contrato para a compra de 20 milhões de doses da vacina, fabricada pelo laboratório indiano Bharat Biotech.
A decisão da pasta ocorreu um dia após Bolsonaro ter sido alvo de notícia-crime no STF. A representação foi entregue pelos senadores Randolfe Rodrigues (Rede-AP), que é vice-presidente da CPI, e Fabiano Contarato (Rede-ES) e Jorge Kajuru (Podemos-GO).
Linha do tempo
Acompanhe, abaixo, os principais momentos que envolvem a negociação para a compra pelo Ministério da Saúde da Covaxin:
- 12 de janeiro: a farmacêutica indiana Bharat Biotech anuncia acordo de fornecimento da Covaxin para a Precisa Medicamentos, ainda sem previsão de quantidade de doses ou valor do contrato.
- 5 de fevereiro: Anvisa recebe pedido da Precisa Medicamentos para autorizar pesquisa clínica de fase três da Covaxin no Brasil.
- 23 de fevereiro: Câmara aprova medida provisória que permite que a Anvisa conceda "autorização para a importação e distribuição de quaisquer vacinas", insumos ou medicamentos sem registro na agência desde que aprovadas pela autoridade sanitária em outros países.
- 25 de fevereiro: Ministério da Saúde assina contrato para compra de 20 milhões de doses da Covaxin por R$ 1,614 bilhão. A previsão inicial era de que as primeiras 8 milhões de doses chegassem em março, outras 8 milhões em abril e 4 milhões em maio.
- 1º de março: Precisa Medicamentos pede adiamento de reunião com Anvisa. Agência inicia inspeção nas instalações da empresa Bharat Biotech, na Índia.
- 2 de março: Senado aprova a medida provisória sobre a compra de vacina.
- 22 de março: Ministério da Saúde faz primeiro pedido de autorização para importar 20 milhões de doses da Covaxin à Anvisa. Agência verificou a ausência de documentos necessários e solicitou-os no mesmo dia, mas ainda restaram pendências; Precisa Medicamentos envia e-mail ao ministério reafirmando a remessa de 3 milhões de doses, ao invés de 4 milhões originalmente previstos, afirmando que "a seguradora e a regulamentação indiana não autorizam um risco maior que US$ 50 milhões".
- 31 de março: Anvisa rejeita por unanimidade a autorização excepcional e temporária de importação da vacina Covaxin. Relator pede esclarecimentos sobre a proximidade da expiração da validade do lote de vacinas que seria importado.
- 6 de maio: fim do prazo estipulado em contrato para a entrega das 20 milhões de doses, sem nenhuma vacina da farmacêutica indiana aplicada no Brasil.
- 13 de maio: Anvisa autoriza estudos clínicos da Covaxin em humanos.
- 24 de maio: Ministério da Saúde protocola segundo pedido de importação de 20 milhões de doses da Covaxin.
- 4 de junho: Anvisa aprova, com várias condicionantes, o pedido de importação excepcional e temporária de doses da vacina indiana Covaxin feito pelo ministério.
- 9 de junho: Anvisa concede certificado de boas práticas de fabricação ao Bharat Biotech.
- 16 de junho: Ministério Público Federal identifica indícios de crime na compra feita pelo Ministério da Saúde e pede que o caso seja investigado na esfera criminal.
- 25 de junho: irmãos Miranda falam à CPI da Covid sobre supostas irregularidades nas negociações pelo imunizante.
- 29 de junho: ministro Marcelo Queiroga decide suspender o contrato pela Covaxin.