Irritado com a operação autorizada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) que atingiu deputados da base e apoiadores, o presidente Jair Bolsonaro reuniu sua equipe de ministros nesta quarta-feira (27) para definir uma estratégia de reação à corte.
No encontro, segundo auxiliares presentes, o presidente avaliou como absurda e desnecessária a investigação contra aliados do seu governo, considerou que se trata de uma retaliação e reforçou que o Poder Executivo não pode aceitar calado.
A primeira medida que ficou definida é que a Advocacia-Geral da União (AGU) ingressará com pedido de habeas corpus para que o ministro da Educação, Abraham Weintraub, não preste depoimento ao STF. Ele foi intimado no mesmo inquérito que apura o disparo de fake news por aliados do presidente.
A ideia seria ingressar com o habeas corpus para impedir a prisão ou outra medida cautelar contra o ministro no caso de ele se recusar a cumprir a determinação do STF de prestar depoimento.
Na reunião, também foram discutidas outras iniciativas de resistência, mas ainda não se chegou a uma definição. Entre elas, a sugestão para que o ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno, não acate nenhum pedido de diligências no âmbito de um pedido de impeachment contra o ministro que foi apresentado ao tribunal e é relatado por Celso de Mello.
O núcleo ideológico teria defendido também que o presidente insista mais uma vez na nomeação do delegado Alexandre Ramagem para o comando da Polícia Federal. O ministro do STF Alexandre de Moraes suspendeu a posse do amigo do presidente no mês passado.
Com exceção do pedido de habeas corpus, as demais propostas não foram unânimes na reunião, o que levou o presidente a rediscuti-las com o núcleo jurídico do governo.
Para tratar do tema, Bolsonaro se reuniu no início da noite no Palácio da Alvorada com o ministro da Justiça, André Mendonça. De acordo com relatos feitos à reportagem, no encontro, também foi lido um texto de 2019 atribuído ao advogado Modesto Carvalhosa que sugeriu a prisão preventiva dos ministros Dias Toffoli e Alexandre de Moraes por causa do inquérito das fake news.
Outra ideia discutida é a divulgação de uma uma nota descrevendo a reação planejada. Caso Bolsonaro siga essa linha, há o risco de aprofundar a crise do governo com o Judiciário.
Segundo assessores do presidente, Bolsonaro teria avaliado nesta quarta-feira que a operação deflagrada teve como objetivo atingi-lo. O presidente discutiu o assunto com ministros, inclusive com o titular da Defesa, Fernando Azevedo.
Que pontos do inquérito estão sendo questionados?
Ato de ofício
Toffoli abriu o inquérito sem provocação de outro órgão, o que é incomum. Segundo o STF, porém, há um precedente: uma investigação aberta de ofício pela Segunda Turma da corte no ano passado para apurar o uso de algemas na transferência de Sérgio Cabral (MDB-RJ).
Competência
A investigação foi instaurada pelo próprio Supremo, quando, segundo críticos, deveria ter sido encaminhada para o Ministério Público. O argumento é que o órgão que julga não pode ser o mesmo que investiga, pois isso pode comprometer sua imparcialidade.
Relatoria
O presidente da corte designou o ministro Alexandre de Moraes para presidir o inquérito, sem fazer sorteio ou ouvir os colegas em plenário. Assim, Moraes é quem determina as diligências investigativas.
Foro
O que determina o foro perante o STF é quem cometeu o delito, e não quem foi a vítima. Para críticos, a investigação não deve correr no Supremo se não tiver como alvo pessoas com foro especial. Moraes disse que, localizados os suspeitos, os casos serão remetidos às instâncias responsáveis por julgá-los.
Regimento
Toffoli usou o artigo 43 do regimento interno do STF como base para abrir a apuração. O artigo diz que, ocorrendo infração à lei penal na sede ou dependência do tribunal, o presidente instaurará inquérito. Críticos dizem que os ataques pela internet não ocorrem na sede do Supremo, mas Toffoli deu uma interpretação ao texto de que os ministros representam o próprio tribunal.
Liberdade de expressão
Moraes pediu o bloqueio de redes sociais de sete pessoas consideradas "suspeitas de atacar o STF". A decisão foi criticada por ferir o direito à liberdade de expressão. O mesmo pode ser dito sobre a censura, depois derrubada, aos sites da revista Crusoé e O Antagonista.