Pela segunda vez, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva teve uma condenação confirmada por unanimidade no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4). Por três votos a zero, os desembargadores da 8ª Turma consideraram o petista culpado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no processo do sítio de Atibaia, aumentando a pena original de 12 anos e 11 meses de prisão para 17 anos, um mês e 10 dias, além de multa de R$ 842 mil.
— Infelizmente, a responsabilidade do ex-presidente Lula é bastante elevada, pois ocupava grau máximo de dirigente da nação brasileira — salientou o relator do caso, desembargador João Pedro Gebran Neto.
Como foi decisão unânime, os recursos da defesa ficam limitados. No próprio TRF4, os advogados podem apenas pedir esclarecimentos sobre omissões ou obscuridades na decisão. Resta recorrer ao Superior Tribunal de Justiça com recurso especial e, depois, ao Supremo Tribunal Federal (STF), com recurso extraordinário, porém ambos precisam de admissão prévia no TRF4.
Como o STF mudou entendimento sobre prisão em segunda instância, a nova derrota não significa retorno de Lula à cadeia. Pela nova ótica, a pena só começa a ser cumprida após esgotados todos os recursos.
Argumentos do MPF
Com mais de oito horas de duração, o julgamento começou com o embate entre defesa e acusação. Citando trechos do interrogatório, o procurador Maurício Gerum disse que Lula usufruía do sítio, mas não pagou pelas reformas, tampouco quis saber quem custeava as benfeitorias. Ao cabo, relacionando as obras à vantagens oferecidas às empreiteiras OAS e Odebrecht em contratos com a Petrobras, pediu aumento de pena do ex-presidente.
—A verdade é que mais uma vez restou plenamente comprovado de que o ex-presidente Lula se corrompeu. E isso é muito grave. Essa condenação provoca uma chaga profunda à democracia. Lula poderia passar à história como o maior estadista do século, mas optou por participar de um esquema de dilapidação dos cofres públicos – afirmou Gerum.
Argumentos da defesa
O advogado de Lula, Cristiano Zanin, enumerou supostas ilegalidades contidas no processo, entre elas a suspeição do ex-juiz Sergio Moro, atual ministro da Justiça, e o plágio que teria sido cometido na sentença pela juíza Gabriela Hardt. Zanin também recorreu ao vazamento das mensagens de integrantes da Lava-Jato.
— A juíza copiou, sem indicação de fonte, a sentença do juiz Sergio Moro. Isso é inadmissível. Nesse contexto, a Vaza-Jato reforça que o apelante (Lula) não teve direito a um julgamento justo, imparcial e independente. Um processo viciado, em que o juiz coordenou as ações da acusação — afirmou Zanin, sustentando que o cliente “não recebeu qualquer vantagem indevida”.
O julgamento
Antes da análise do mérito da apelação, em decisão depois acompanhada pelos demais desembargadores, Gebran rejeitou todas as preliminares suscitadas pelos advogados, entre elas o suposto plágio e o entendimento do STF de que réus que não se tornaram delatores devem falar por último. Ao analisar o a condenação de Lula, Gebran indicou sua posição logo no início do voto:
— Pouco importa a propriedade do sítio. Embora haja fortes indicativos que possa não ser de Fernando Bittar, o fato é que o ex-presidente Lula usava do imóvel com 'animus rem sibi habendi' (intenção de ter a coisa para si).
Gebran sustentou-se sobretudo na palavra dos delatores, entre eles Marcelo Odebrecht e Léo Pinheiro, da OAS. As duas empreiteiras arcaram com quase todas as despesas de reforma do sítio, avaliadas em R$ 1 milhão. O magistrado citou depoimentos, documentos, notas fiscais, e-mails e agendas de encontros de Lula com os empresários. Reproduziu acertos para financiamento de campanhas eleitorais do PT e até mesmo em El Salvador e citou a cozinha Kitchens pedida por Marisa à OAS, idêntica à instalada no triplex do Guarujá.
Segundo a votar, Leandro Paulsen fez um pronunciamento enxuto. Acompanhou integralmente o voto de Gebran, inclusive no aumento da pena para 17 anos:
— Lula valia-se do sítio como se proprietário fosse. Concluo tal qual o relator, reconhecendo a responsabilidade por corrupção e lavagem de dinheiro – afirmou Paulsen.
Com maioria formada, coube ao presidente da turma, Thompson Flores, proferir o último voto. Fazendo um inventário da Lava-Jato e do próprio caso, concluiu que havia elementos suficientes para seguir a posição dos colegas.
— A prova afigura-se acima da dúvida razoável e justifica sua condenação — sentenciou o desembargador, dando contornos finais ao julgamento.