Membros do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH) estiveram com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na manhã desta terça-feira (17) para ouvi-lo num procedimento que apura possíveis violações em processos da Lava-Jato, incluindo aquele que o levou à prisão.
A denúncia, feita pela defesa do próprio petista em junho, é baseada principalmente nas conversas entre o ex-juiz, atual ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, e procuradores da força-tarefa da Lava-Jato em Curitiba, reveladas pelo site The Intercept Brasil.
Segundo os conselheiros, o próximo passo da investigação é convidar Moro, o chefe da força-tarefa, Deltan Dallagnol, e o jornalista Glenn Greenwald, do Intercept, para falarem sobre o caso.
— Isso só não acontecerá se eles entenderem não ser pertinente — afirmou o relator do procedimento no CNDH, Leandro Scalabrin.
O CNDH existe desde 1964 e é responsável por apurar violações de direitos humanos no Brasil. Como não é ligado a nenhum dos Poderes, possui função independente, mas também não vincula outros órgãos às suas recomendações.
Lula está preso desde abril em 2018 em Curitiba, cumprindo pena por condenação por corrupção e lavagem de dinheiro no caso do triplex de Guarujá (SP), no âmbito da Lava-Jato, que já foi julgado em três instâncias. Ele também foi condenado por corrupção e lavagem de dinheiro em primeiro grau no processo do sítio de Atibaia (SP), que está sob recurso no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4).
Além dos dois casos já sentenciados, Lula é réu em outras sete ações penais no Paraná, no Distrito Federal e em São Paulo.
A denúncia feita pela defesa de Lula ao CNDH cita relatos de possíveis violações em outros momentos das ações da Lava-Jato, como na condução coercitiva do ex-presidente, em março de 2016, e quando o juiz federal Rogério Favreto, do TRF4, concedeu liberdade ao petista, mas teve a decisão revogada no mesmo dia, em julho do ano passado.
— Desde aquele momento (da condução) nós demonstramos que ele (Lula) é vítima da falta de um devido processo legal, é vítima de um processo injusto e que ele acabou sendo condenado, está preso, em razão desse processo injusto, que não reuniu nenhuma prova de culpa e desprezou as provas de inocência — afirmou o advogado do petista, Cristiano Zanin.
A defesa está elaborando também uma petição para "atualizar" o Comitê de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre o processo de Lula, incluindo as conversas divulgadas e "outras provas inéditas". No ano passado, o comitê apontou que o petista teria direito a ser candidato à presidência, mas a decisão não vincula os órgãos brasileiros.
Lula foi ouvido por mais de duas horas na Superintendência da Polícia Federal. Além do relator, participaram da oitiva o presidente da instituição, Leonardo Penafiel, e o conselheiro Ismael José Cesar.
Como revelou a Folha de S.Paulo no domingo (8), conversas de Lula gravadas pela Polícia Federal e mantidas sob sigilo desde 2016 colocaram em xeque a tese de que sua nomeação como ministro pela então presidente Dilma Rousseff (PT) tinha como objetivo principal obstruir as investigações da Lava-Jato.
Durante a visita do CNDH, o ex-presidente confirmou o conteúdo dessas conversas.
— O conselho também ouviu e recebeu essa denúncia neste momento — disse Leonardo.
Na ocasião, Moro abriu acesso aos áudios de grampos telefônicos entre Lula e Dilma, que encaminhava um termo de posse ao companheiro de partido para que ele usasse em "caso de necessidade". Em seguida, o ministro Gilmar Mendes suspendeu o documento, afirmando ter visto intenção do político em fraudar investigações sobre ele na Lava-Jato.
O relatório final do procedimento no CNDH deve ser submetido até o final deste ano ao plenário do órgão, que decidirá o que fazer com o resultado da investigação.
— (O conselho) pode emitir recomendações, como recomendar a anulação desse processo se chegar à conclusão que não houve direito à defesa e julgamento justo — explicou o presidente.
O resultado pode ser levado ainda para comitês internacionais de direitos humanos.