Relator da Lava-Jato no Tribunal Regional Federal da 4ª Região, o desembargador João Pedro Gebran Neto negou pedido da defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para incluir no processo do sítio de Atibaia as informações reveladas pelo site The Intercept Brasil sobre conversas entre procuradores da força tarefa da Lava-Jato. No despacho, o magistrado justificou a decisão salientando que o material foi obtido de maneira ilegal por um hacker.
Os advogados do petista queriam que o TRF4 solicitasse à 10ª Vara Federal de Brasília — onde tramita o processo contra o hacker Walter Delgatti Neto — cópia de todas as mensagens trocadas pelos procuradores no aplicativo Telegram. Eles pediram também que Gebran suspendesse a apelação do sítio de Atibaia, na qual Lula tenta reverter uma condenação a 12 anos e 11 meses de prisão, até que o caso da interceptação das conversas fosse julgado na 10ª Vara e no Supremo Tribunal Federal.
A defesa argumentou que a divulgação das conversas teria demonstrado ingerência do então juiz Sergio Moro no trabalho da força-tarefa, configurando "situação incompatível com o sistema acusatório", inclusive adiantando aos procuradores o teor de decisões.
No despacho emitido às 16h34min desta terça-feira, Gebran lembra que "a obtenção das mensagens decorreu de atuação criminosa, cujos responsáveis foram identificados e (...) assumiram a responsabilidade pelos delitos". Gebran também afirma que "não há dúvida que o hackeamento de autoridades públicas por técnica conhecida como spoofing não configura material apto a ser considerado como prova no presente feito." Embora admita que provas ilícitas podem ser usadas em favor do réu, o magistrado diz que o material teria de ser incontestável.
Ao final, Gebran lembra que a sentença imposta a Lula no processo do sítio não foi proferida por Moro, "cuja imparcialidade se procurar arranhar nas notícias jornalísticas" que revelam as conversas entre os procuradores. A condenação, em janeiro, foi autoria da então juíza substituta da 13ª Vara de Curitiba, Gabriela Hardt. O desembargador encerra o despacho afirmando que a apelação do petista será julgada pelo TRF4 "com as provas que estão encartadas nos autos, e não sobre pretensos diálogos interceptados ilegalmente que em nada contribuem para o deslinde do feito."
Em nota, a defesa de Lula afirma que irá recorrer da decisão. Confira o texto na íntegra:
As mensagens trocadas entre o ex-juiz Sérgio Moro e procuradores da República da “Lava Jato” sobre atos processuais relacionados ao ex-Presidente Lula, que estão na posse do Estado, seja no Supremo Tribunal Federal, seja na 10ª. Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, reforçam a suspeição de tais autoridades, tal como demonstramos desde 2016 em diversas manifestações processuais.
Reforçam, ainda, que Lula foi vítima de uma conspiração promovida por meio de processos corrompidos por grosseiras violações às suas garantias fundamentais. Como tais mensagens, já parcialmente divulgadas pelo The Intercept e por outros veículos de imprensa, destinam-se a comprovar relevantes teses defensivas no âmbito de processo penal, é indiscutível que elas podem e devem ser utilizadas para essa finalidade, conforme entendimento já firmado pelo Supremo Tribunal Federal (RE 402.717/PR), independentemente da forma como o material foi obtido.
Não se pode confundir a situação jurídica daquele que está sendo indevidamente acusado pelo Estado e que pode comprovar sua inocência e a nulidade do processo por meio de material que está na posse de órgãos oficiais com aquele que, eventualmente, tenha obtido esse material sem a observância do rito legal.
Por isso, recorremos da decisão proferida na data de hoje (03/09) pelo Desembargador Federal João Pedro Gebran Netto, do Tribunal Regional Federal da 4ª. Região (TRF4), que, nos autos da Apelação Criminal nº 5021365-32.2017.4.04.700/PR (caso sítio de Atibaia), negou a requisição dos arquivos com tais mensagens que poderão reforçar as teses defensivas.
Cristiano Zanin Martins