Com 200 anos completados em julho, São Leopoldo irá eleger o responsável por sua reconstrução no dia 6 de outubro. Cinco candidatos disputam a prefeitura do município localizado no Vale dos Sinos, tendo o desafio de prepará-lo para o futuro de mudanças climáticas, além de atender as demais mazelas da cidade.
São Leopoldo foi duramente castigada na enchente de maio. Conforme dados divulgados pela prefeitura, aproximadamente 40 mil casas foram atingidas pela enchente, desalojando cerca de 180 mil dos 217 mil habitantes — quase de 83% do total.
Em entrevista a Zero Hora, o prefeito Ary Vanazzi (PT) classificou a calamidade como a “maior tragédia da história do município”. Pouco antes, São Leopoldo enfrentou duas enchentes em junho e novembro de 2023.
O município é o nono mais populoso do Rio Grande do Sul e tem o sétimo maior PIB do Estado — cerca de R$ 10,9 bilhões. Também é um dos principais redutos eleitorais do PT no RS e um local estratégico para sigla — sendo a maior cidade gaúcha administrada pelo partido —, onde Vanazzi foi reeleito nas últimas eleições. Antes, ele também chegou à prefeitura em 2004.
Originalmente, havia um acordo entre Vanazzi e seu vice, Ary Moura (PDT), para a inversão das siglas em 2024. No entanto, Moura morreu em 2022, e o quadro mudou.
No fim, quem irá concorrer representando a chapa será Nelson Spolaor (PT), que atuou como Secretário Municipal de Habitação na gestão de Vanazzi, com Professor Nado (PDT) como vice.
Curiosamente, Spolaor já tem experiência como prefeito, só que de outra cidade: como ficou em segundo nas eleições de 2004, ele assumiu a prefeitura de Sapiranga em 2006, após o então prefeito, Joaquim Portal (PP), ter sua chapa cassada. Depois, foi eleito para o cargo em 2008 — também foi vereador do município entre 1993 e 2000. Tentou voltar à prefeitura sapiranguense em outras duas eleições, 2016 e 2020, mas bateu na trave em ambos os pleitos.
Spolaor conta que tem uma relação antiga com São Leopoldo, desde a década de 1980, quando começou a cursar Direito na Unisinos. Ele promete dar continuidade aos projetos de Vanazzi, assegurando o apoio do governo federal e os investimentos provenientes do Novo Pac.
— Minha relação com São Leopoldo é de construção e diálogo com todos os setores, movimentos e cooperativas. Me orgulho muito daqui, gosto bastante da cidade. Uma população extremamente acolhedora, um povo maravilhoso. Estou muito entusiasmado para ser prefeito, vamos dar um salto de qualidade para o futuro de forma extraordinária — diz.
Desistência e apoio a concorrente
Além de Spolaor, outros quatro candidatos concorrem à prefeitura de São Leopoldo: Arthur Schmidt (MDB), Delegado Heliomar (PL), Hitler Pederssetti (PODE) e Manoel Bandeira Binoni (PSOL). Inicialmente, Gabriel Dias (PSDB) também disputava o pleito, mas ele anunciou desistência da candidatura, em 13 de setembro, para apoiar Heliomar.
“A partir de agora vamos trabalhar para eleger um projeto de unidade”, disse Gabriel em nota. “Eu e o candidato Heliomar temos divergências, mas estamos dispostos a focar no que convergimos: São Leopoldo não pode mais ficar como está, na mão do PT”, complementou o documento.
Heliomar, que ficou em segundo lugar na disputa em 2020, destacou à Zero Hora que a decisão de Gabriel foi uma “demonstração de maturidade”, que “atendeu a um clamor da população para que a oposição se unisse”.
Tendo feito carreira na Polícia Civil, atuando em setores como o Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) e o Departamento Estadual de Prevenção e Repressão ao Narcotráfico (Denarc), Heliomar tem o apoio do ex-presidente Jair Bolsonaro. O candidato afirma que não integra o mundo político tradicional, que nunca participou de nenhuma instância governativa, mas que tem experiência em gestão dentro do Poder Executivo de 30 anos.
— Esse é nosso diferencial em relação aos demais candidatos, para um município que está dominado há muitos anos pelo mesmo espectro político, sendo levado a números deficitários — aponta Heliomar. — A política tradicional já mostrou que não serve para São Leopoldo, não conseguiu trazer desenvolvimento para a cidade. É uma cidade empobrecida.
Dentro desse cenário que replica a polarização dos últimos anos na política brasileira, como as eleições de 2022, Arthur Schmidt se apresenta como uma opção de terceira via. Com a desistência de Gabriel, ele destaca que sua candidatura se torna uma “opção viável para a cidade fugir dos extremos”.
— Nós agora, de fato, estamos na disputa e vamos vencer a eleição. O eleitor de São Leopoldo está buscando uma mudança, mas com qualidade. Com pessoas que têm identidade com a cidade e saibam governar — sublinha Schmidt. — Os votos do Gabriel, naturalmente, vão migrar para nós. Antes, eu e o Gabriel servíamos como âncora um com o outro. Era o abraço dos afogados. Quando um estava saindo da água, o outro abraçava e afogava de novo.
Cheias e formas de contenção são tema da campanha
Além das eventuais mazelas que todo município precisa lidar — os candidatos de oposição citam, especialmente, a saúde pública em relação à São Leopoldo —, a contenção de cheias é o principal tema deste pleito, com a intenção de amenizar novos episódios de enchentes.
São Leopoldo é cortada pelo Rio dos Sinos. Porém, com as chuvas de maio, o rio superou a marca de oito metros, causando o alagamento de boa parte do centro e das zonas norte, leste e oeste da cidade.
A enchente de maio superou o sistema de proteção contra cheias do Rio dos Sinos, que totaliza 21 quilômetros de diques, atravessa boa parte de São Leopoldo e pega um pedaço de Novo Hamburgo.
Como relatou reportagem de Zero Hora, uma pesquisa da Metroplan, iniciada em 2015 e finalizada em 2018, indicou a necessidade de elevação de partes dos diques em São Leopoldo. Conforme o "Estudo de Alternativas e Projetos para Minimização do Efeito de Cheias e Estiagens na Bacia do Rio dos Sinos", a elevação proposta era de 50 centímetros em toda a extensão dos diques nas margens esquerda e direita do Sinos.
Em julho, o governo federal anunciou que, por meio de recursos do novo PAC Seleções, serão investidos R$ 1,9 bilhão em obras para prevenção de inundações na bacia do Rio dos Sinos e seus principais tributários. Além da melhoria do canal do Rio dos Sinos, estão previstas elevações dos seguintes diques: Sinos, Canoas, São Leopoldo, Nova Santa Rita, Sapucaia do Sul, Arroio Cerquinha, São Leopoldo Feitoria, Novo Hamburgo, Campo Bom, Igrejinha, Rolante e Três Coroas.
Entre os candidatos, a ideia principal é trabalhar com prevenção. Representando a atual administração, Spolaor pondera que sua plataforma prevê realizar um estudo com o meio acadêmico para projetar os novos eventos climáticos, adequando o sistema conforme a necessidade e ampliando políticas ambientais. Ele cita a criação de uma estrutura mais adequada da Defesa Civil para a contingência, a necessidade de modernizar as casas de bombas, além de manter os arroios desassoreados e com bacias de amortecimento.
— Vamos executar as (obras de) unidades habitacionais das famílias que foram atingidas, em parceria com o governo federal. A gente pretende construir um programa na área do atendimento psicológico emocional, implementado na rede de saúde da cidade — acrescenta.
Delegado Heliomar garante que, assim que assumir, fará esforços pelo desassoreamento do Rio do Sinos:
— É um dos principais fatores que contribui para o alagamento da cidade quando há elevação do nível do rio. É preciso fazer a limpeza da microdrenagem, tubulações de águas pluviais e cloacais que ficam na proximidade desses locais, que agora estão completamente tomados de areia. Em nível regional, conversaremos com os demais municípios para resolver essa solução em conjunto.
Arthur Schmidt atesta que houve um volume de chuva em que, de qualquer maneira, a cidade seria afetada, mas a catástrofe poderia ser evitada. Ele frisa que faltou manutenção dos diques, algo que ele se compromete em realizar:
— Nossa plataforma se compromete em criar um sistema de monitoramento do nível do rio com alertas para a população, tanto de volume de chuva quanto de risco para as pessoas. Vamos implementar o plano de contingência, onde cada pessoa vai saber o que fazer em um momento de risco.
Quem são os candidatos
Arthur Schmidt (MDB)
Natural de São Leopoldo, Arthur Schmidt tem 44 anos. Concursado na Caixa Econômica Federal há mais de 20 anos, tem MBA em Business Analytics (Unisinos) e cursa mestrado em desenvolvimento econômico (PUCRS). Foi Secretário de Educação entre 2013 e 2016 e vereador entre 2017 e 2020.
Delegado Heliomar (PL)
Natural de Inhacorá, noroeste do Estado, Heliomar Athaydes Franco tem 55 anos e é advogado. Delegado aposentado, atuou por décadas na Polícia Civil, tendo passagens por setores como o Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) e o Departamento Estadual de Prevenção e Repressão ao Narcotráfico (Denarc).
Hitler Pederssetti (PODE)
Natural de Chapecó (SC), Hitler Pederssetti tem 36 anos e mudou-se para São Leopoldo em 2006. Empresário do ramo da construção civil e da gastronomia, é fundador da ONG União ao Próximo, que realiza ações em comunidades carentes e asilos. Foi eleito vereador em 2020.
Manoel Bandeira Binoni (PSOL)
Natural de Rio Pardo, no Vale do Rio Pardo, Manoel tem 61 anos e é advogado. Também possui bacharel em Filosofia, além de um mestrado na área de pesquisa em social e política. Foi eleito vereador suplente em 2016.
Nelson Spolaor (PT)
Natural de Mata, na Região Central, Spolaor tem 56 anos e é advogado. Trabalhou na indústria calçadista em Sapiranga. Foi vereador de Sapiranga entre 1993 e 2000 e assumiu a prefeitura do município em 2006 após cassação da chapa do então prefeito, sendo eleito para o cargo em 2008. Atuou como Secretário Municipal de Habitação de São Leopoldo nas gestões de Ary Vanazzi.