Não raro a formação de uma equipe define o êxito ou o fracasso de uma eleição. Na atual corrida ao governo gaúcho, os principais candidatos recorreram a nomes de confiança para a tomada de decisões. São especialistas em finanças públicas, marqueteiros renomados, articuladores políticos e parlamentares experientes que definem desde o conceito da campanha até a lanchonete onde o candidato vai parar para tomar um cafezinho com os eleitores.
Em um Estado em grave crise financeira, um nome em especial paira sobre um concorrente ao Piratini: o economista Aod Cunha. O ex-secretário da Fazenda que ostenta três superávits sucessivos nas contas estaduais, feito inédito nos últimos 20 anos, tem ajudado a distância Eduardo Leite (PSDB).
Antes de auxiliar o tucano, Aod já apresentou sugestões a Mateus Bandeira (Novo), ex-colega de governo Yeda Crusius, e ao governador José Ivo Sartori (MDB). Também foi procurado por interlocutores de Jairo Jorge (PDT), mas não foi possível conciliar as agendas. Alinhados à esquerda, Miguel Rossetto (PT) e Roberto Robaina (PSOL) refutam o ideário de Aod e buscam mentores com outra visão de Estado.
Guardadas as diferenças ideológicas e o pragmatismo com que cada candidato conduz a campanha, ninguém trabalha sozinho para buscar o voto dos 8.354.732 eleitores gaúchos. Tornou-se clichê a imagem do político cercado de assessores, discutindo com semblante circunspecto soluções para os problemas mais delicados. Embora surrada e muitas vezes construída apenas para efeito de propaganda, a cena é uma das mais rotineiras na correria de uma eleição. Confira os mais influentes auxiliares dos principais nomes ao governo do Estado.
Consultoria a distância
Aluno de mestrado em Gestão Pública na Fundação Getulio Vargas, Eduardo Leite (PSDB) passou os dois últimos semestres na ponte-aérea Porto Alegre-São Paulo. Sempre que a agenda permitia, o tucano aproveitava a viagem para uma escapada até a casa do economista Aod Cunha.
Secretário da Fazenda no governo Yeda Crusius (2007-2010) e responsável pelos únicos três anos de superávit nas contas do Estado nas duas últimas décadas, Aod falava sobre as finanças do Estado, planos de desenvolvimento e macroeconomia. Aos poucos, tornou-se conselheiro informal de Leite, embora faça questão de manter-se afastado da campanha e nem sempre tenha suas recomendações cumpridas pelo candidato.
— Eduardo é inteligente e tem suas próprias ideias. Na votação do plebiscito para venda de estatais, por exemplo, eu achava que devia ter apoiado, mas ele tinha uma visão diferente — conta Aod.
Outro expoente do governo Yeda consultado por Leite é o cientista político Fernando Schüler. Juntos, os ex-secretários palestraram na abertura do movimento Rumos, série de workshops promovido por Leite para definir os eixos de seu plano de governo. Schüler esteve em quase todas as edições do Rumos e chegou a ser cotado para elaborar o plano de governo mas, assim como Aod Cunha, vive em São Paulo e colabora a distância.
No dia a dia da campanha, o staff do tucano é liderado pelo vice-presidente do partido, Valdir Bonatto, o deputado estadual Lucas Redecker e o ex-secretário de Minas e Energia Artur Lemos, principais operadores políticos. A jornalista Tânia Moreira comanda a comunicação e o publicitário Fábio Bernardi chefia as operações de marketing e a propaganda de rádio e TV.
Um dos mais influentes, Bernardi também assessora Leite nos debates e mantém um núcleo que estuda temas específicos para a campanha. Na segurança, o conselheiro é o candidato a vice, Ranolfo Vieira Júnior (PTB). Ex-chefe da Polícia Civil, Ranolfo conversa com um grupo de delegados e oficiais da Brigada Militar antes de repassar as sugestões para Leite.
Campanha sem plano B
Ao decidir concorrer à reeleição, José Ivo Sartori (MDB) tentou repetir a equipe que vencera a disputa em 2014, mas esbarrou na recusa do jornalista Marcos Martinelli, comprometido com a campanha no Amazonas. Martinelli indicou o publicitário Renato Konrath e, logo numa das primeiras reuniões, o governador foi claro sobre o perfil que desejava imprimir à propaganda eleitoral.
— Não quero invenção, nem falsa promessa. Não temos um plano B — resumiu Sartori.
— Mas e qual é o plano A? — perguntou Konrath.
— É a adesão ao regime de recuperação fiscal da União, com a privatização de estatais e a suspensão do pagamento da dívida — respondeu o candidato.
— Então vamos mostrar o plano A — definiu Konrath.
Desde então, não há entrevista, debate ou pronunciamento público em que Sartori não repita que tem "um plano para o Estado". A estratégia foi saudada pelos operadores políticos e aumentou a influência de Konrath no comitê do MDB, sobretudo por neutralizar uma reprise das críticas mais frequentes a Sartori em 2014, quando seus adversários diziam que ele não apresentou propostas concretas durante toda a campanha.
Com Konrath, comandam a comunicação o secretário Cleber Bevegnú e a jornalista Gabriela Alcântara. Sombra do governador, Gabriela está sempre a dois passos de distância, dando dicas e repassando dados, sendo a principal assessora nos debates. Chefe da Casa Civil, Benvegnú tem atuação mais ampla e se tornou um dos mais poderosos homens do Piratini. Na campanha, faz leituras e costuras políticas, analisa pesquisas qualitativas e, com o secretário da Segurança, Cezar Schirmer, é um dos auxiliares mais ouvidos pelo governador.
Sartori também gosta de consultar a velha guarda do MDB, um triunvirato formado por Luis Roberto Ponte, Pedro Simon e Ibsen Pinheiro.
O plano de governo foi concebido pelo ex-secretário Carlos Búrigo, enquanto a logística da campanha fica a cargo de Idenir Cecchim. Fora do partido, seus conselheiros são o vice José Paulo Cairoli (PSD) e o candidato ao Senado Beto Albuquerque (PSB).
Reforço via WhatsApp
O debate corria monocórdio na Rádio Guaíba, com os candidatos repetindo praticamente os mesmos diagnósticos e soluções para os problemas do Estado. Da sede de sua produtora em São Luís, no Maranhão, a 4 mil quilômetros de Porto Alegre, o cientista político Juliano Corbellini acompanhava a discussão via internet enquanto disparava mensagens pelo WhatsApp. "Reforça que ele sabe como fazer, porque já fez. Ressalta a experiência. Os resultados em Canoas mostram isso", orientava o marqueteiro à jornalista Flávia Moreira, encarregada de assessorar Jairo Jorge (PDT).
Amigo de Jairo desde a década de 1990, Corbellini desdobra-se entre a capital gaúcha e o Nordeste para comandar a campanha do pedetista. Ele já havia se comprometido com a tentativa de reeleição do governador Flávio Dino (PCdoB) no Maranhão quando Jairo o chamou para a empreitada. Não teve como recusar o convite. Mesmo passando metade da semana em Porto Alegre e a outra em São Luís, é o mais influente membro da entourage do ex-prefeito de Canoas.
— Eles têm uma relação de muita proximidade e confiança. Fica fácil de trabalhar assim — comenta Flávia.
Assim como Corbellini, outro antigo colaborador de Jairo tem papel primordial na campanha. Economista e consultor, Gustavo Grisa foi o responsável por transformar em ideias objetivas a concepção de Estado do candidato. Sócio da Agência Futuro e com serviços prestado ao presidenciável Alvaro Dias (Podemos), Grisa elaborou o programa de governo de Jairo, focado no conceito de convergência das políticas públicas.
— Jairo é diferente. Ele é o seu próprio ideólogo. Discute contigo, faz a construção da proposta e desenvolve uma visão que tenta fugir da polarização na política gaúcha — afirma Grisa.
Na ação política, três pessoas são os pilares da campanha. O presidente Pompeo de Mattos venceu resistências internas à candidatura de um ex-petista recém chegado ao partido, o deputado Ciro Simoni atua na coordenação-geral e o ex-prefeito José Scorsatto faz a interlocução com prefeitos e vereadores.
Slogan movido a café
O PT recém havia oficializado Miguel Rossetto como candidato ao governo do Estado quando um pequeno grupo se reuniu em uma cafeteria no centro de Porto Alegre.
Em torno da mesa, o próprio Rossetto e três dirigentes discutiam uma frase que sintetizasse o espírito que o partido iria imprimir à campanha.
— Vamos sair da crise sem vender o Estado —sugeriu Marcelo Danéris, secretário estadual do governo Tarso Genro (2011-2014).
Rossetto e os outros dois convivas, Carlos Pestana e Luiz Felipe Nelsis, sorriram satisfeitos. Mais tarde, em novas discussões, o verbo sair foi trocado por vencer, e a mensagem evoluiu para "vamos vencer a crise sem vender o Estado". Estava ali, resumida em oito palavras, o slogan a ser repetido à exaustão por Rossetto, invocando conceitos caros ao PT e a boa parte da população gaúcha, como a repulsa às privatizações.
Não por acaso, os três companheiros de café ocupariam postos-chave na condução da campanha. Pestana é o coordenador-geral, tendo Danéris como o segundo na linha de comando. Nelsis, ou Piti para os mais íntimos, responde pelo marketing, incluindo a propaganda de rádio e TV. Diplomático e com trânsito fácil em todas as correntes do PT, Pestana é o principal articulador. Sua adjunta na Casa Civil do governo Tarso, Mari Perusso, colabora com a memória e análise de dados sobre o Estado.
— Esse grupo define todas as linhas políticas da campanha, as propostas e o simbolismo de cada ideia — resume a jornalista Eliane Silveira, responsável pela comunicação.
Além da frase emblemática sobre a crise, outra promessa surgiria desses encontros entre grão-petistas. A partir de análises de técnicos do partido, e com consulta a ex-secretários da Fazenda como Arno Augustin e Odir Tonollier, Rossetto passou a afirmar que irá pagar os salários em dia caso vença a eleição. As duas propostas são a base do programa de governo, cuja elaboração ficou a cargo de Cícero Balestro, ligado à deputada Maria do Rosário. As mobilizações de rua, uma das apostas do PT para a disputa, estão a cargo de Nasson Sant'Anna, Marlon Monteiro e Laura Sito.
Pouco tempo, muito verbo
Com a propaganda de rádio e TV reduzida a poucos segundos, Mateus Bandeira (Novo) e Roberto Robaina (PSOL) apostam na contundência das propostas para ganhar destaque em uma campanha curta e tendo como adversários os maiores partidos do RS. Suas visões para vencer a crise são completamente antagônicas.
NOVO - Devoto do conceito de Estado mínimo, Bandeira tem como um de seus principais mentores o economista Darcy Carvalho dos Santos. A parceria começou com um convite do candidato para tomarem um vinho enquanto discutiam a situação fiscal do governo. Houve sintonia nas ideias entre os dois ex-auditores fiscais do Tesouro.
Com sugestões arrojadas, como a venda de estatais e a revisão de aposentadorias especiais, Darcy acabou construindo toda a parte financeira do plano de governo de Bandeira. Também contribuem nas decisões mais importantes o vice, Bruno Miragem, o advogado Eduardo Macluf e a jornalista Soraia Hanna.
PSOL - Sociólogo e entusiasta da ação do Estado como indutor da economia, o presidente da sigla no RS, Israel Dutra, é o principal ideólogo da campanha de Robaina. As movimentações políticas e estratégicas, a logística e o marketing são conduzidos pela ex-deputada Luciana Genro.
O deputado Pedro Ruas usa a experiência como opositor de Sartori na Assembleia para subsidiar Robaina. Foi ele quem repassou ao candidato, instantes antes do debate na Rádio Gaúcha, dados sobre a isenção fiscal de R$ 343 milhões à empresa Videolar em troca da geração de cinco empregos. Robaina citou a renúncia fiscal e Sartori não rebateu a crítica.