O Supremo Tribunal Federal (STF) condenou nesta semana mais 41 pessoas envolvidas nos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023, em Brasília. A maioria dos réus foi sentenciada pela prática dos crimes de associação criminosa armada, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado. Entre as sentenciadas está uma gaúcha, Jaqueline Konrad, 38 anos, primeira mulher do Rio Grande do Sul a ser julgada pelos distúrbios que envolveram invasão e depredação de prédios públicos naquela data.
Jaqueline é uma investidora financeira que mora em São Martinho, noroeste do Rio Grande do Sul. Ela foi condenada a 13 anos e seis meses de prisão. A votação foi virtual, uma modalidade em que as partes (acusação, defesa e magistrados) se pronunciam apenas pelo computador. Antes dela, um outro gaúcho também foi condenado, o microempresário Eduardo Zeferino Englert, 42 anos, natural de Santa Maria e que recebeu 17 anos de prisão.
Tanto Jaqueline como Englert foram presos em flagrante após invadirem o Palácio do Planalto em 8 de janeiro de 2023 e ficaram mais de seis meses presos em penitenciárias de Brasília. Foram soltos e, posteriormente, condenados, mas ainda não cumprem a sentença, porque cabem recursos contra o tamanho da pena.
De Santa Rosa a Brasília
Jaqueline e o marido dela, Marcelo Soares Konrad, 45 anos — que também é réu pelos atos antidemocráticos — saíram da sua cidade até Santa Rosa, onde embarcaram num ônibus repleto de manifestantes, em direção a Brasília. Os ocupantes do veículo protestavam contra o resultado das eleições e queriam a anulação do pleito vencido pelo presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Segundo relato de familiares e moradores de São Martinho feito a GZH, o casal Konrad não teria envolvimento com a política.
Quando chegaram na capital federal, os dois teriam ido para QG do Exército. Porém, devido ao grande número de pessoas, foram almoçar em outro lugar de Brasília. Ainda conforme o relato de familiares, o casal chegou atrasado para o início do protesto e, no momento que se aproximou, já encontrou o Palácio do Planalto depredado.
No interrogatório, Jaqueline afirmou que tinha ido a Brasília para visitar uma sobrinha e só soube dos protestos depois, tendo ido à Esplanada dos Ministérios “para orar pela nação e pelas autoridades”. O defensor do casal Konrad junto ao STF, Marvius Dornelles Remus, diz que seus clientes só ingressaram no Palácio do Planalto para fugir da PM.
— Eles começaram a filmar o que viram. Quando a Polícia Militar chegou e começou a jogar gás lacrimogêneo, acabaram entrando no Palácio para fugir. Foi então que foram presos. Esses vídeos estão sendo usados contra eles, mas os dois não participaram de nenhuma depredação — afirmou o advogado.
A alegação da defesa contraria provas colhidas pela Polícia Federal. A sentença, embasada em perícias feitas nos celulares de Jaqueline, anexa imagens do casal Konrad posando junto ao ônibus de manifestantes em frente ao QG do Exército em Brasília, onde permaneceram por 1h30min (conforme registra o GPS do aparelho telefônico).
O voto de Alexandre de Moraes
Em seu voto pela condenação de Jaqueline, o ministro-relator do STF, Alexandre de Moraes, põe em dúvida a defesa de Jaqueline: “Não merece credibilidade, portanto, a versão apresentada pela ré em seu interrogatório judicial, de que apenas veio visitar a sua afilhada em Brasília, não sabendo previamente da manifestação golpista. A ré chegou pela manhã do dia 8/1 juntamente com outros manifestantes que vieram preparados para acampar. Fizeram selfies, sorridentes, na rampa do Palácio do Planalto invadido por uma multidão e dentro do prédio”.
Moraes ressalta ainda que foram encontrados no celular de Jaqueline áudios que demonstram ânimo de derrubar o presidente eleito.
“A ré acompanhou toda a movimentação do dia 8/1 em diversos áudios recebidos em seu celular por meio de mensagens, tais como ‘a polícia não conseguiu segurar nós’ (15h25min); ‘ninguém vai conseguir governar, a gente não sai daqui enquanto o Exército não intervir, contra ou a nosso favor’ (16h19min); ‘várias refinarias no país já estão parando’ (17h:00min).”
Na sentença, os ministros do STF consideraram que Jaqueline buscava, “em claro atentado à Democracia e ao Estado de Direito, a realização de um golpe de Estado com decretação de ‘Intervenção das Forças Armadas’.
Jaqueline foi condenada por tentativa de golpe de Estado, associação criminosa, dano qualificado, deterioração do patrimônio tombado e tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito. A sentença deve ser cumprida, inicialmente, em regime fechado — ou seja, dentro da penitenciária.
Jaqueline tem o direito de permanecer em liberdade enquanto seu defensor mover recursos contra a sentença. O marido dela, Marcelo Konrad, responde pelos mesmos crimes, mas ainda não foi julgado. Até agora o STF julgou 71 réus pelos atos antidemocráticos. Todos foram condenados.