A CEEE Equatorial recebeu ao menos três telefonemas pedindo reparo no fio de alta tensão que se rompeu em Bagé na semana passada, provocando a morte do trabalhador rural Murilo Vieira dos Santos, 24 anos. Apesar dos chamados, nenhuma ordem de serviço teria sido emitida pela companhia para providenciar o conserto na rede elétrica.
Segundo o titular da 2ª Delegacia de Polícia de Bagé, delegado Caio Imamura, a informação foi passada à equipe de investigação por técnicos da companhia. Os chamados teriam sido remetidos para uma central da empresa em Porto Alegre, sem gerar deslocamento de uma equipe local. Agora, o delegado quer entender a dinâmica de atuação da companhia no episódio.
— A gente quer saber como funciona essa burocracia, por que um pedido de conserto aqui em Bagé é enviado para Porto Alegre e depois volta, mesmo sendo um caso de risco de vida, com fio energizado sobre a via. Estamos vendo se houve negligência — diz o delegado, que trata o caso como homicídio culposo.
Murilo morreu na quinta-feira (4), depois que a égua que ele montava pisar no cabo energizado da CEEE Equatorial na localidade do Passo da Alexandrina, no interior do município. Derrubado da montaria pelo animal, ele caiu sobre o fio e também foi eletrocutado. Segundo testemunhas que cavalgam com ele, Murilo pediu socorro, mas acabou morrendo após cerca de 10 minutos. Ainda assim, seu corpo ficou recebendo choques elétricos por cerca de três horas, até que a energia fosse desligada pela CEEE Equatorial.
De acordo com o delegado, a primeira equipe da companhia só chegou ao local uma hora após o acidente, mas não tinha luvas, alicate nem escada para proceder o desligamento.
— A mãe de um dos colegas do Murilo teve de ir até a empresa e praticamente levar arrastada uma equipe. Como eles não tinham equipamento, depois foram mais sete equipes até o local do acidente. Eles tiveram que usar a escada de um vizinho, numa propriedade rural, para desligar a energia — diz Imamura.
O delegado já ouviu os três amigos que estavam com Murilo na hora do acidente, bem como a família do trabalhador rural. Também foram intimados técnicos que estiveram no local, além dos plantonistas que trabalharam na noite anterior, quando Bagé foi atingida por um forte temporal. A investigação requisitou ainda cópia das solicitações de reparos feitas à CEEE Equatorial durante o vendaval, bem como os chamados atendidos.
Nesta quarta-feira (10), irão depor um gerente regional da companhia e executivos de duas empresas terceirizadas. A polícia também vai intimar duas ciclistas que fizeram o terceiro chamado, ao passarem pelo local ainda na manhã de quinta-feira. Até então, os investigadores tinham registro de dois pedidos de conserto, um às 21h16min de quarta-feira e outro às 6h19min da manhã seguinte.
De acordo com Imamura, um advogado da CEEE Equatorial já esteve na delegacia e prometeu colaborar com as investigações. A companhia, porém, aguarda o laudo da necropsia apontando a causa da morte. Segundo o delegado, Murilo tinha queimaduras profundas no peito e nas pernas, devido à longa exposição à alta tensão.
A CEEE Equatorial arcou com os custos dos serviços fúnebres, no valor de R$ 3,6 mil, mas a família prepara uma ação de responsabilidade civil contra a empresa. Na terça-feira, o pai de Murilo foi recebido por gestores da companhia. Durante a reunião, cavalarianos fizeram um protesto silencioso diante da empresa.
Em nota, a CEEE Equatorial diz que está dando suporte à família e que aguarda com prudência a investigação das causas e circunstâncias do acidente. A empresa também diz que desligou a energia no local por volta das 11h50min de quinta-feira, uma hora e meia após o acidente, contrariando o que dizem testemunhas ouvidas pela polícia.