Hugo Calderano, Ana Sátila e Ana Marcela Cunha são alguns dos atletas brasileiros que chegaram perto, mas acabaram ficando fora dos pódios nas Olimpíadas de Paris e precisaram lidar com a frustração pela "quase medalha". A reação do mesatenista foi uma das que mais chamou a atenção, já que se orgulhou da conquista do quarto lugar inédito na modalidade para o Brasil, mas também desabou em lágrimas e se disse decepcionado com a perda do bronze.
— Foi um resultado positivo, mas decepcionante. Não consegui achar meu ritmo na partida. Conseguir uma medalha é meu maior objetivo desde que eu comecei a jogar tênis de mesa. Eu acho que essa decepção toda mostra o quanto esforço eu faço — resumiu Calderano à TV Globo.
Ao ficar em quarto lugar no K1 da canoagem slalom, Ana Sátila também enfrentou um misto de satisfação e frustração:
— Estou feliz com a caminhada que tive até aqui. Trabalhamos muito e tive uma equipe muito dedicada. Mas é muito difícil, para um atleta olímpico, chegar tão próximo de uma medalha e não conseguir conquistar.
No decorrer da história dos Jogos Olímpicos, muitos outros atletas brasileiros precisaram lidar com o mesmo sentimento e, em edições seguintes, conseguiram se superar e conquistar a tão sonhada medalha. Marcus Levi Lopes Barbosa, psicólogo do esporte e coordenador do mestrado acadêmico em Psicologia da Universidade Feevale, comenta que os competidores precisam "olhar o contexto como um todo" para evitar o sentimento de derrota após ficar fora do pódio.
Na visão do especialista, que é professor dos cursos de Psicologia e de Educação Física na instituição, a frustração de não conseguir a medalha ou de experimentar a derrota é algo inerente ao esporte, já que muitos atletas precisam perder para que apenas três subam ao pódio.
— Para cada campeão, há centenas de pessoas que não chegaram lá. O problema da quase medalha é a questão da expectativa. Alguns dizem que a receita para a frustração é criar expectativas. Se você cria expectativas, a frustração vem com muito mais força. É frustrante ser derrotado normalmente, mas quando tem uma expectativa de vitória, isso é muito maior, então é uma coisa muito desafiadora e difícil de lidar — afirma Barbosa.
Para o psicólogo, os atletas lidam melhor com essas situações quando não estão apenas competindo com seus adversários, mas sim consigo mesmo. Como exemplo, cita os representantes do atletismo, que costumam vibrar quando fazem suas melhores marcas, mesmo que isso não garanta um lugar no pódio.
— Às vezes, a pessoa chega em penúltimo e está vibrando, porque é a melhor marca da vida dela, é uma final olímpica, um lugar muito alto. Ela não está sendo derrotada, está fazendo o melhor que já fez na sua vida, é uma tremenda vitória. Então, quando o atleta para de olhar só para a medalha e vê todo o contexto no qual está, chegar perto do pódio olímpico é um feito fenomenal. E a medalha se torna um detalhe — comenta.
Para a atleta Ana Marcela Cunha, o quarto lugar na maratona aquática 10km em Paris teve gosto de vitória. Mesmo sem pódio, a brasileira se mostrou contente e valorizou o resultado conquistado nas águas
— Eu tenho que sair muito orgulhosa do meu ciclo. De tudo que eu pude fazer. Com todas as mudanças. Tudo que eu encarei. Um ano atrás, eu falei que eu não queria mais. Queria parar de nadar. Então, estar aqui hoje, ser quarto lugar, para mim, é sensacional — disse em entrevista após a prova.
Controle emocional
Foi controlando o emocional e analisando a situação mais "friamente" que a ex-jogadora da seleção brasileira de futebol feminino Marlisa Wahlbrink, mais conhecida pelo apelido Maravilha, conseguiu lidar com o resultado negativo em sua primeira participação em Jogos Olímpicos, em Sidney, em 2000. Na época, o time ficou em quarto lugar, após perder para a Alemanha.
Atualmente preparadora de goleiras, a ex-jogadora gaúcha afirma que não se culpou pelo resultado, porque sabia que a equipe tentou fazer o seu melhor todo o tempo:
— Estava fora do nosso alcance naquele momento. Precisava ser mais organizado para rendermos mais. Às vezes, não é só o desempenho do atleta, tem que olhar todo o processo. E eu sempre procurei analisar mais friamente a situação e tentava controlar o meu emocional para analisar o que tínhamos no momento. Fiquei frustrada, porque sempre temos o objetivo de chegar ao pódio, mas a gente vivia sobre uma pressão muito grande. Se não ganhasse, o futebol feminino acabava.
O entorno citado por Marlisa também é apontado pelo psicólogo do esporte, que reforça que os atletas só têm controle sobre o seu próprio desempenho, mas não pelo que ocorre ao redor. Por isso, não podem se culpar pelos resultados negativos.
Para a ex-jogadora, o resultado das Olimpíadas de Sydney foi resultado de tudo que ocorria no entorno. Tanto que, nos Jogos seguintes, quando o time brasileiro contava com um trabalho mais organizado, com direito à fisiologista e acompanhamento psicológico e nutricional mais individualizado, o pódio veio. O grupo garantiu a prata em Atenas, em 2004.
— Quando saí de casa para jogar foi para tentar mudar financeiramente a minha vida, então, entrava em campo sentindo cem quilos nos ombros. Era um peso enorme e não tinha psicólogo para dar suporte. Comecei a perceber mudança quando começamos a cuidar desses detalhes. Isso somou para que, em 2004, pudéssemos ter um resultado mais qualificado. Sabia que tínhamos potencial, mas que teríamos que trabalhar esses detalhes pequenos que, no final, fazem diferença — ressalta Marlisa.
Barbosa também enfatiza que atletas que têm acompanhamento psicológico tendem a lidar melhor com a frustração das derrotas, porque estão mais preparados para isso. Portanto, o especialista considera fundamental esse apoio tanto para que se saiam bem nas competições quanto para lidar com os resultados.