A partir desta segunda-feira (17) começa a aplicação das provas do Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do RS (Saers). Nesta edição, além de aferir o conhecimento dos alunos da rede de ensino público do Estado, o teste será um dos componentes para definir a divisão do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) entre os municípios gaúchos.
Isso ocorre porque o exame será a base para criação de um índice de qualidade de educação que entra nos critérios para a distribuição do valor arrecadado por esse imposto às cidades. Ou seja, municípios com melhor desempenho em educação ficarão com um percentual maior do ICMS.
GZH ouviu prefeitos gaúchos, que não têm consenso sobre a medida: enquanto há quem defenda a avaliação, outros entendem que usá-la como critério para repartir recursos pode prejudicar municípios que mais precisariam investir em educação (veja mais abaixo).
A prova é organizada pela Secretaria Estadual da Educação (Seduc), em parceria com a União dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime-RS) e a Federação das Associações de Municípios (Famurs). Participam da avaliação 439,4 mil estudantes, sendo 224 mil da rede estadual e 215,4 mil das redes municipais. O teste é baseado nas competências e habilidades da matriz curricular de língua portuguesa e matemática e será aplicado para o segundo, quinto e nono anos do Ensino Fundamental e terceiro ano do Ensino Médio.
Os resultados serão usados para o cálculo de 2023 do Índice Municipal da Qualidade da Educação (Imers). Esse indicador será a base para a distribuição do ICMS a partir de 2024. As provas seguem até o dia 27 de outubro.
Avaliação dos prefeitos
Presidente da Famurs e prefeito de Restinga Seca, Paulinho Salerno afirma que a mudança é positiva e fomenta melhorias na educação. Ele destaca que a inclusão desse índice na distribuição do ICMS incentiva a busca por avanço na qualidade de ensino nos municípios. Além disso, a ferramenta vai ajudar no mapeamento da situação da aprendizagem no Estado, facilitando o diagnóstico e o combate aos problemas apontados:
— A formação desse índice será muito importante porque os municípios, que em sua grande maioria não têm essa questão de medir a qualidade da educação por índices, vão ter a partir de agora essa condição.
Salerno salienta que o resultado será um termômetro importante aos municípios para avaliar o que deu certo e o que precisa melhorar nesse processo.
Na mesma linha da avaliação, o prefeito de Campo Bom, Luciano Orsi, também aprova a mudança:
— É uma medida positiva, que vai levar os municípios, tanto aqueles que já estão em um bom nível na qualidade de ensino quanto aqueles que precisam avançar, a investir mais em educação. Permitir o repasse de um recurso maior de ICMS por conta desse investimento e o resultado disso na vida das crianças e da comunidade escolar é melhor ainda.
O prefeito de Parobé, Diego Picucha (PDT), avalia que incluir a qualidade da educação, medida por meio de índice a partir de provas, como critério para distribuição do ICMS é complicado. No entendimento de Picucha, o déficit no ensino causado pela pandemia afeta esse processo. Ele afirma que esse cenário pode gerar índice mais baixo na cidade, prejudicando, principalmente, alunos em situação de vulnerabilidade:
— Isso pode gerar um ciclo no qual índices mais baixos de avaliação dos alunos gerem repasse menor naquilo que poderia ser destinado a melhorias no ensino. Isso me parece extremamente injusto e desumano.
O prefeito de Santiago, Tiago Gorski Lacerda, apoia a medida. Ele aponta que a Emenda Constitucional 108, de 2020, alterou as regras do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) e estabeleceu que um mínimo de 10% dos repasses de ICMS repassados aos municípios seguisse um critério baseado na educação. No RS, este percentual é de 17% acordado com a Famurs e Undime.
— Baseado na nova redistribuição se faz necessário que os gestores municipais realizem o diagnóstico da sua rede. Por isso, a importância das avaliações externas como ponto de partida para sabermos onde estamos na educação em nossos municípios e onde deveremos chegar para atingirmos os resultados desejados — afirma.
A influência da prova na divisão do recurso
A Constituição Federal prevê que 25% de toda a arrecadação dos Estados com o tributo, após as destinações constitucionais, pertence aos municípios. O governo usa um indicador para determinar o tamanho da cota para cada um dos 497 municípios gaúchos. O item com maior peso nesse processo é a variação média do Valor Adicionado Fiscal (VAF), que responde por 75% do índice. O VAF é calculado por meio da diferença entre saída e entrada de mercadorias e serviços em todas as empresas que atuam no município.
A nova regra estipula que 10% do valor repassado via ICMS terá a qualidade da educação como métrica em 2024. Nos anos seguintes, esse percentual vai subindo até que, em 2029, 17% do repasse do ICMS gaúcho terá a educação como métrica. Com a inclusão do indicador de educação, o VAF é reduzido para 65% dentro do indicador usado para a repartição do ICMS (veja mais abaixo).
Antes de ser aprovada pela Assembleia, a mudança foi o centro de embate envolvendo prefeituras. O texto original do governo previa que os 17% de peso da educação entrasse em vigor já em 2024. No entanto, prefeitos pediram mais tempo para adaptação e evitar casos de perda brusca de arrecadação. Eles também afirmaram na época que a pandemia prejudicou de forma desigual o ensino nos municípios. Diante desse impasse, foi costurado acordo para que esse percentual fosse aplicado de forma gradual.
Planejamento
A Secretária-adjunta de Educação do Estado, Stefanie Eskereski, afirma que a primeira finalidade da prova é diagnosticar a realidade da educação no Rio Grande do Sul. Com base no desempenho dos estudantes, é possível traçar planos mais eficientes no combate aos problemas que afetam o ensino:
— A partir dessa visão, desse relatório, a gente vai conseguir pensar no planejamento pedagógico para o ano que vem, na formação de professores, na construção de material didático. Vamos conseguir fazer a priorização da matriz curricular. O primeiro motivo de a gente estar fazendo a avaliação é conseguir enxergar qual é a realidade do Estado.
Entenda como será a distribuição do ICMS
Como é
A Constituição Federal prevê que 25% de toda a arrecadação dos Estados com o tributo, após as devidas destinações constitucionais, pertence aos municípios. O Índice de Participação dos Municípios (IPM) é o indicador utilizado para determinar o tamanho da cota para cada um dos 497 municípios gaúchos. O IPM leva em conta alguns critérios para essa divisão, como população, área, número de propriedades rurais e produtividade primária. O item com maior peso é a variação média do Valor Adicionado Fiscal (VAF), que responde por 75% do índice. O VAF é calculado por meio da diferença entre as saídas e as entradas de mercadorias e serviços em todas as empresas que atuam no município.
Como vai ficar
A qualidade da educação entra no IPM. Esse indicador será atestado por meio de prova que faz parte do Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Rio Grande do Sul (Saers). O Saers será aplicado a todos os alunos do 2º, 5º e 9º anos do Ensino Fundamental e do 3º ano do Ensino Médio em escolas públicas gaúchas. No primeiro ano, em 2024, 10% do valor repassado terá a qualidade da educação como métrica. Nos anos seguintes, o percentual vai subindo até que, em 2029, 17% do repasse do ICMS gaúcho terá a educação como métrica. Com a inclusão do indicador de educação, o VAF é reduzido para 65% dentro do IPM.
Como será a cobrança sobre adesão ao programa?
Não existe um percentual mínimo de participação para aplicação da prova em determinada escola e para o uso do resultado da avaliação para compor a fatia do bolo do ICMS. No entanto, para evitar manipulação por meio da escolha dos alunos que vão participar do teste, o sistema garante 20 pontos no peso na construção do índice pela participação do aluno, independentemente da nota. A Seduc avalia que esse fator incentiva a maior adesão ao processo. Também existe a exigência de 80% de participação dos alunos da escola para ter o resultado divulgado.
A prova será usada para outras estratégias na área de educação?
Sim. Além de compor o índice que estipula a divisão do ICMS por municípios, os resultados da prova serão utilizados para diagnosticar a realidade da educação no Estado. Com base nesse retrato, será possível atacar os principais problemas da área de maneira mais rápida e eficaz, aprimorando o planejamento pedagógico dos anos seguintes. A prova também será usada como subsídio para a construção de materiais pedagógicos e formação de professores.
A comparação das notas será com o mesmo município, e não com os outros?
São duas situações. O novo sistema pode causar uma competição entre municípios porque quanto melhor o desempenho no índice que mede a qualidade da educação ponderado pelo seu tamanho, maior será a fatia do recurso do ICMS. Neste primeiro momento, como é a primeira edição, apenas a nota de cada município será usada para a divisão dos valores. Nos próximos anos, quando tiver uma base de comparação, o índice vai levar em conta a nota do ano e a evolução desse indicador.
*Colaborou Jean Peixoto