O ator Ney Latorraca morreu nesta quinta-feira (26) aos 80 anos, segundo o canal GloboNews. O artista estava internado na Clínica São Vicente, na Gávea, zona sul do Rio de Janeiro, desde o dia 20 de dezembro, em razão de um câncer de próstata. Ele morreu em decorrência de uma sepse pulmonar.
O câncer de Latorraca foi diagnosticado em 2019. Na época, ele retirou a próstata. A doença voltou em agosto deste ano, já com metástase. Houve o tratamento inicial, sem sucesso.
Latorraca fez personagens marcantes na televisão, como Vlad, na novela Vamp (1991), e Barbosa, na TV Pirata (1988). Foram 17 novelas, seis minisséries e mais de uma dezena de seriados e especiais, incluindo um musical e um humorístico. Tem ainda em seu currículo 23 longa-metragens e 13 peças.
Ator já nasce ator. Aprendi desde pequeno que precisava representar para sobreviver. Sempre fui uma criança diferente das outras: às vezes, eu tinha que dormir cedo porque não havia o que comer em casa. Então, até hoje, para mim, estou no lucro.
NEY LATORRACA
Em depoimento para o Memória Globo
O ator deixa o marido, o ator Edi Botelho, com quem era casado havia 30 anos. Os dois começaram um relacionamento discreto em meados de 1995 e decidiram que não teriam filhos.
O velório do ator será realizado nesta sexta-feira (27) no Teatro Municipal do Rio, das 10h30min às 13h30min, aberto ao público. A cremação será reservada aos amigos e à família.
A carreira de Ney Latorraca
Filho de um crooner e de uma corista, o ator, cujo nome completo é Antonio Ney Latorraca, nasceu em julho de 1944 em Santos, em São Paulo.
Aos seis anos, fez uma participação em uma radionovela da Record. Aos 19 anos, morando em Santos, passou em seu primeiro teste e fez Pluft, o Fantasminha, de Maria Clara Machado. Depois, foi para São Paulo disposto a investir na carreira de ator.
Durante a década de 1970, atuou em vários espetáculos, entre eles: Hair (1970), Jesus Cristo Superstar (1972), Bodas de Sangue (1973) e A Mandrágora (1975).
No ano de 1969 fez seu primeiro trabalho na televisão em Super Plá, na TV Tupi. Em seguida, trabalhou na TV Cultura e na TV Record.
Na TV Globo, o ator estreou em 1975, na novela Escalada. Na novela de Lauro César Muniz, a primeira de Latorraca, ele interpretou Felipe, que era mudo.
— Ele só balançava a cabeça. E o que aconteceu? Um mês depois que a novela estreou, o personagem fazia tanto sucesso que todo mundo queria saber quem era aquela pessoa jogada pelos cantos, muda. Eu nunca apresentei aquele padrão imposto de galã, que precisava ter uma virilidade explícita. Pelo contrário. Mas Felipe fez sucesso, principalmente com o público feminino. Na época, havia um concurso em nível nacional para eleger o rei da televisão. Em seis semanas, eu já estava concorrendo com Tarcísio Meira e Roberto Carlos — relembrou o ator ao projeto Memória Globo.
Aquele contrato de três meses virou mais de 50 anos de casa. Ele stabeleceu parceria importante com o diretor Walter Avancini, com quem realizou projetos de literatura adaptada como Anarquistas, Graças a Deus, Memórias de um Gigolô, Rabo de Saia, Grande Sertão: Veredas.
Em Rabo de Saia (1984), ele fez o papel do caixeiro-viajante Ezequias Vanderlei Lins, conhecido como Quequé. Ele viajava de trem pelo Nordeste e se dividia entre três famílias.
O ator também é lembrado pelo seu trabalho em Estúpido Cupido (1976), em que interpretou o personagem Mederiquis, fã de Elvis Presley e líder de uma banca de rock, cujo nome era Personélitis Bóis.
Em Coração Alado (1980), interpretou, com Vera Fischer, uma cena de estupro. Foi a primeira em uma novela das oito.
Em 1986 estreou, com o ator Marco Nanini o maior sucesso do teatro brasileiro, O Mistério de Irma Vap, que permaneceu em cartaz por mais de 11 anos. Foi o seu maior sucesso e lhe trouxe a almejada estabilidade financeira.
— Comprei minha cobertura, passei a viajar de primeira classe e pude dar todo o conforto para a minha mãe, que se foi em 1994, até o fim da vida dela — contou ele, em entrevista ao Estadão em julho passado.
Latorraca estava longe das telinhas havia cinco anos. Seu último trabalho foi participação em Cine Holliúdy (2019), onde reviveu o Vlad de Vamp.
Casamento com Edi Botelho
Ney Latorraca vivia há 29 anos com o também ator Edi Botelho. Os dois contracenaram juntos em espetáculos como O Martelo e Entredentes. Eles mantinham a relação, que começou em 1995, longe dos holofotes.
— Encontrei há mais de 20 anos uma pessoa genial, que é o Edi Botelho, meu companheiro. A maior qualidade dele é a inteligência. Isso é o principal, além do carinho, amor, respeito e a rapidez dele de pensamento — disse Ney, em entrevista ao Gshow em 2022.
Essa foi uma das poucas vezes em que o artista se abriu sobre o assunto. Latorraca, durante boa parte do relacionamento com Botelho, mostrou-se avesso a dar detalhes de sua vida privada, apesar de jamais ter escondido a relação. Para o artista, o seu lado particular deveria ficar dentro de casa e o foco de eventuais matérias deveria ser o seu ofício.
Ney Latorraca não tinha filhos: quem ficará com a herança?
Sem filhos, o ator, que somou quase 60 anos de carreira na televisão, teatro e cinema, não deixará seu patrimônio para a família. Em entrevistas ao longo dos anos, ele contou que deixaria sua herança para instituições de caridade, como o Retiro dos Artistas, e a Associação Brasileira Beneficente de Reabilitação (ABBR).
— É um desejo da minha mãe também. Acho que é assim que tem que ser. O que eu ganhei com o teatro tem que voltar para essas causas. Essa é a missão do artista, pelo menos para mim — disse ele em entrevista ao jornal Extra, em 2021.
Na mesma conversa, Latorraca afirmou que a maior parte de seu patrimônio era fruto de seu trabalho no teatro, especialmente com O Mistério de Irma Vap, produção dirigida por Marília Pêra que esteve em cartaz por 11 anos consecutivos, entre 1986 e 1997.