Aprovada na quinta-feira (30) no Senado, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) dos Combustíveis prevê benefícios a caminhoneiros e taxistas, que receberão um vale temporário, e a ampliação do Auxílio Brasil e do vale-gás. Apesar de positiva para os beneficiados, o fato de o projeto ser apresentado a menos de cem dias das eleições 2022 gerou críticas por parte de parlamentares. O relator da proposta foi o senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE).
Como a legislação proíbe a ampliação ou criação de programas sociais durante ano eleitoral, exceto em caso de estado de emergência ou calamidade, a proposta inclui um artigo que prevê o reconhecimento do estado de emergência "decorrente da elevação extraordinária e imprevisível do preço do petróleo, combustíveis e seus impactos sociais", para contornar a vedação.
A PEC foi aprovada com 72 votos favoráveis e apenas um contrário no primeiro turno, e por 67 votos a um no segundo turno - o voto negativo foi do senador José Serra (PSDB-SP).
Para valer, a medida ainda precisa passar pelo aval da Câmara dos Deputados e depois ser sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro.
Confira os benefícios aprovados
- Voucher caminhoneiro/taxista: o valor de R$ 1 mil deve ser repassado por cinco meses para integrantes da categoria. A ajuda deve atender cerca de 900 mil transportadores de carga autônomos. Taxistas também foram incluídos no auxílio.
- Etanol: modificação na forma de ressarcimento aos Estados que reduzirem a tributação do etanol hidratado.
- Auxílio Brasil: ampliação de mais famílias que devem entrar no programa, além de incremento de R$ 200 no valor do benefício.
- Auxílio Gás: iniciativa de distribuir R$ 120 a cada dois meses a mais beneficiados.
- Transporte de idosos: verba será usada para compensar empresas pela gratuidade para idosos utilizarem o transporte urbano, metropolitano, semiurbano e também o existente dentro de uma mesma Região Integrada de Desenvolvimento (Ride).
Críticas
Apesar de ter sido aprovado quase que por unanimidade, o projeto foi alvo de críticas por conter, na visão de alguns parlamentares, incoerências.
Um deles seria a aprovação do estado de emergência. Oposicionistas argumentaram que a decretação de emergência, previsto na PEC para blindar o presidente Jair Bolsonaro, de eventuais sanções da Lei Eleitoral, não encontra respaldo legal vigente.
Um trecho do projeto previa "a não aplicação de qualquer vedação ou restrição prevista em norma de qualquer natureza", o que foi visto por alguns parlamentares como forma de dar "carta branca" para o governo gastar o que quiser durante o período eleitoral, podendo aprovar novos benefícios sociais, por exemplo.
A contragosto, o trecho foi retirado do projeto pelo senador Bezerra.
— Também deixamos claro que as medidas autorizadas pelo estado de emergência reconhecido serão somente aquelas do rol do artigo 3º, sem possibilidade de novos programas com base nessa mesma motivação — afirmou Bezerra, após tirar da PEC o trecho que causou polêmica. — Não resta dúvidas, pois, de que não haverá brecha ou espaço para novas medidas ou ampliação de gastos dessas mesmas medidas.
Outro ponto criticado no projeto é que ele autoriza que o governo federal extrapole o teto de gastos — a regra que limita o crescimento das despesas do Executivo. O impacto fiscal da proposta será de R$ 41,2 bilhões, acima dos R$ 38 bilhões previstos anteriormente.
Após votar contra a medida, Serra falou sobre esse ponto em uma postagem no Twitter:
"Hoje, fui o único senador a votar contra a PEC 16, aprovada em conjunto com a PEC 1/22, apelidada de PEC Kamikaze. Por esse nome já sabemos que se trata de uma bomba fiscal. Essa PEC viola a Lei de Responsabilidade Fiscal e fura o teto de gastos", disse.
Liberação de verba antes da eleição
Apesar de votarem favoráveis a medida, alguns parlamentares seguiram indicando incoerências no projeto, articulado pelo governo. O grupo afirma que a medida tem caráter eleitoreiro, já que cria condição para que o governo federal distribua benefícios pouco antes das eleições. Pela legislação, a implementação de benefícios é vedada em ano eleitoral.
"É claro que vamos votar 'sim', mas é doloroso. É doloroso pela forma como está sendo apresentado. As finalidades são ótimas, mas a forma, o momento e a inoportunidade são visíveis", afirmou o senador Confúcio Moura (MDB-RO).
Na quarta-feira (29), quando o tema foi debatido pelo Senado, Randolfe Rodrigues (Rede-AP) também fez críticas nesse sentido:
— É triste perceber que o governo só descobriu essa emergência a menos de 100 dias das eleições. O povo brasileiro está desde o final do ano passado passando fome, o auxílio era insuficiente, e não perceberam. Agora, a 90 dias das eleições, de repente, o presidente Jair Bolsonaro percebeu que tinha emergência — disse Randolfe.
O relator, Bezerra, rebateu as críticas e disse que os efeitos do estado de emergência ficarão circunscritos às medidas contidas na PEC.
Todas as medidas valeriam apenas até o final do ano e serão feitas por meio da abertura de créditos extraordinários. Bezerra chegou a citar R$ 26,6 bilhões de outorgas da Eletrobras como opção para custear parte da proposta, além de repasses de dividendos, estimados entre R$ 20 bilhões e R$ 30 bilhões, mas não há vinculação a nenhuma receita específica.
A pedido da oposição, Bezerra proibiu o uso de recursos destinados ao Auxílio Brasil e ao vale-gás para publicidade institucional. Os oposicionistas temiam que Bolsonaro usasse a verba prevista na PEC para se promover às vésperas da eleição de outubro.