Em mais um gesto público de confiança no ministro da Economia, Paulo Guedes, o presidente Jair Bolsonaro esteve neste domingo (24) visitando uma feira de pássaros em Brasília e, junto com o ministro, concedeu entrevista à imprensa.
— Convidei o Paulo Guedes para conversar com vocês — disse Bolsonaro no início da conversa, na qual falou sobre a situação fiscal e econômica do País, da alta inflacionária, dos preços dos combustíveis, defendeu as reformas e mais uma vez tentou justificar o descumprimento do teto de gastos para que fosse possível dar o Auxílio Brasil de R$ 400,00.
Durante a conversa com os jornalistas, Paulo Guedes defendeu a decisão do governo federal de alterar a regra do teto de gastos, considerada a âncora fiscal do País, para viabilizar o pagamento de R$ 400 no Auxílio Brasil até dezembro de 2022, ano em que o presidente Jair Bolsonaro pretende buscar a reeleição. Guedes disse que foi preciso "moderar a velocidade da aterrissagem fiscal", para atender a população mais frágil neste momento, e defendeu as reformas para que o País tenha solidez fiscal.
Segundo Guedes, uma possível aprovação da reforma administrativa traria uma economia de R$ 300 bilhões nos próximos oito a 10 anos, frente ao gasto de R$ 30 bilhões para que o Auxílio Brasil chegue aos R$ 400,00.
Apesar de dizer que defende o teto de gastos, Guedes comentou que havia uma necessidade de atender a uma parcela da população que está passando fome. Para o ministro, o movimento não transforma o presidente Jair Bolsonaro em um populista.
— O presidente não é populista. Ele é popular. É diferente. Ele tem a sensibilidade de saber, olha, chegou a hora que nós temos que atender. Tem brasileiro comendo osso, passando fome. A mídia mesmo ficou falando isso aí três meses, tem brasileiro passando fome, comendo ossos. Como é que um presidente da República vai fazer? Ele fica num difícil equilíbrio — disse Guedes.
Segundo o ministro, R$ 400 foi o meio termo encontrado por Bolsonaro entre o que a equipe econômica propôs, de R$ 300, e o que os políticos defendiam, R$ 600.
— A equipe econômica fala assim, vamos dar R$ 300. Aí os políticos: vamos dar R$ 600. Aí ele olha e fala: vamos dar R$ 400. E aí eu como economista tenho que avisar ao presidente: "presidente, isso aí nós temos que pedir uma licença, porque vamos atingir ao teto". Ah, podemos reformular o teto? A reformulação é tecnicamente correta, pra sincronizar as despesas com o teto, hoje eles estão descasados — disse Guedes.
— O presidente precisa enfrentar o problema da miséria que se agudizou durante a pandemia. E aí ele precisa de R$ 30 bilhões para dar R$ 100 a mais para o Bolsa Família. Vocês todos sabem que tínhamos previsto R$ 300 dentro do teto. Estava previsto, só que o Senado não avançou com a matéria. Não conseguiu avançar com (a reforma) do imposto de renda, que daria a fonte — justificou Guedes. — Se a gente fizer uma reforma administrativa que dê R$ 300 bilhões, não tem problema dar R$ 30 bilhões para os vulneráveis e os frágeis — disse.
Defesa do teto de gastos
Apesar de defender a mudança feita, Guedes disse que "o teto é uma bandeira nossa de austeridade".
— O teto é um símbolo de compromisso para gerações futuras. Mas se você perguntar para gerações futuras nós vamos deixar 17 milhões de famílias brasileiras passando fome? Eles vão dizer que não. Eles vão dizer, faça um outro sacrifício aí, por exemplo, a reforma administrativa, porque aí você poupa para gerações futuras R$ 300 bilhões — disse.
Para viabilizar o pagamento de R$ 400 aos beneficiários do Auxílio Brasil, o governo negociou uma mudança na regra de correção do teto de gastos que abriu espaço adicional de R$ 83,6 bilhões no orçamento de 2022.
Incorporada ao texto da PEC dos precatórios a proposta muda a fórmula do teto, que hoje é corrigido pelo IPCA acumulado em 12 meses até junho do ano anterior ao de sua vigência. A ideia é adotar a correção da inflação de janeiro a dezembro.
Apesar do verniz técnico que Paulo Guedes tentou dar, a manobra foi apontada por economistas como irresponsável do ponto de vista fiscal e como um prenúncio do fim do teto de gastos.
Questionado sobre as críticas que recebeu de economistas em razão da flexibilização do teto de gastos, Guedes devolveu os ataques. Segundo ele, um dos que criticam a medida é o ex-ministro Mailson da Nóbrega.
— Ele levou o Brasil para a inflação de 5.000% com a política de feijão com arroz dele.
O ministro lembrou ainda do economista Afonso Pastore que também tem sido crítico do descumprimento do teto.
— Pastore é um bom amigo, tem passado razoável. Ele não está entendendo o que estamos fazendo. Ele serviu a um governo militar. Bolsonaro é um presidente democraticamente eleito. Pastore que trabalhou para presidente Figueiredo, fez política errada, não fez nada, e está me criticando, tinha de ficar quieto e ter velhice digna — disse.
Com relação ao secretário da Fazenda e Planejamento do Estado de São Paulo e ex-ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, que também tem alertado para o risco de descumprimento do teto de gastos, Guedes disse que Meirelles "trabalha em qualquer partido, a qualquer hora". Lembrou que quando Meirelles era ministro deu três aumentos de salário para o funcionalismo, deixando um deles autorizado para ser dado no governo Bolsonaro.
— Ele botou o teto e saiu correndo, não fez a reforma da Previdência.
A instituição do teto dos gastos ocorreu durante a gestão de Meirelles no Ministério da Fazenda, em 2016.
Cobrança ao Senado
Ao lado de Bolsonaro, Guedes voltou a cobrar do Senado a aprovação de medidas importantes para a economia, entre elas a reforma do Imposto de Renda, já aprovada pela Câmara, mas que aguarda votação da outra Casa. Segundo Guedes, quando a reforma do Imposto de Renda avançar, será possível ajudar os mais frágeis.
— Acreditamos na democracia brasileira, no Congresso, no Supremo (STF), que tem ajudado nas reformas. Esperamos que todos joguem dentro das quatro linhas, que a mídia procure a verdade, que o presidente do Senado avance com as reformas — disse Guedes.
Guedes lembrou que o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, pode se lançar candidato a presidente da República e disse que as reformas serão importantes num futuro governo.
— Como vai ser candidato se não avançar com as reformas? Ele não pode fazer militância agora. Ele sabe que estamos no caminho certo.
O ministro ainda elogiou o presidente da Câmara, Arthur Lira, e disse que ele quer avançar e tem trabalhado pelas reformas.
Recém-desfiliado do DEM e prestes a formalizar a filiação ao PSD, o senador Rodrigo Pacheco foi aclamado como candidato a presidente da República no sábado (23), em encontro regional do partido no Rio de Janeiro. Apesar disso, Pacheco disse que "no momento certo" decidirá se será candidato em 2022.
No evento, Pacheco chegou a defender o Auxílio Brasil, mas também a responsabilidade fiscal.
— O programa social deve ser concretizado, é preciso aumentar a capacidade de compra daqueles que são beneficiados pelo Auxílio Brasil, e cabe à política e aos técnicos do Ministério da Economia encontrarem a solução para fazer esse programa social dentro da responsabilidade fiscal, que é inafastável — afirmou.
"Desempenho da economia deve-se a Guedes", diz Bolsonaro
Bolsonaro destacou que o custo de vida tem aumentado, com a inflação que chegou a dois dígitos e que os mais pobres têm sofrido bastante.
— É uma preocupação nossa — disse o presidente, que voltou a criticar a política do "fica em casa" e disse que o mundo está sofrendo ainda com o que ele espera ser o "fim da pandemia". — Muitos países estão com desabastecimento e nós não temos esse problema. Sabemos que o custo de vista tem aumentado. Ano passado, demos o auxílio emergencial, gastamos o equivalente a 13 anos de Bolsa Família. O Brasil tem que voltar à normalidade — disse o presidente.
A definição do valor de R$ 400 para o Auxílio Brasil levou a alterações no teto de gastos que culminaram com a saída de quatro secretários do Ministério da Economia na quinta-feira (21). Pediram exoneração o secretário especial do Tesouro e Orçamento, Bruno Funchal, e sua adjunta, Gildenora Dantas. Também pediram para deixar o cargo o secretário do Tesouro Nacional, Jeferson Bittencourt, e seu adjunto, Rafael Araujo. O movimento gerou especulações em torno também de uma possível saída de Paulo Guedes. Na sexta-feira (22), Bolsonaro foi pessoalmente ao Ministério da Economia e concedeu entrevista ao lado de Guedes para reafirmar sua confiança e apreço a ele.
Neste domingo, Bolsonaro destacou medidas econômicas tomadas em 2019, quando o Brasil começou, segundo ele, a decolar. Afirmou que essas medidas, que até passaram despercebidas por muitos, é que permitiram ao País sofrer menos no ano passado, com a pandemia de covid-19.
— A MP da liberdade econômica veio em boa hora. Terminamos 2020 com mais gente com carteira assinada que em 2019. Isso graças ao bom trabalho da equipe econômica, que não deixou de passar recursos vultosos para atender a população — disse Bolsonaro ao lado de Guedes e, em seguida, o elogiou novamente, destacando que o ministro tem liberdade para trabalhar. — O desempenho da economia deve-se a Paulo Guedes, a sua competência e a sua liberdade para trabalhar — afirmou. O presidente lembrou ainda que todos esperavam que o Produto Interno Bruto (PIB) caísse 10% no ano passado, quando a queda foi de 4,1%.