Os quatro novos projetos de mineração — Mina Guaíba, Fosfato Três Estradas, Projeto Retiro e Projeto Caçapava do Sul — seguem em busca de licenciamento no Estado, mas já desenterraram uma antiga polêmica entre o benefício econômico da atividade e a preocupação de ambientalistas com o impacto desses empreendimentos sobre a natureza.
No último dia 14, um grupo de manifestantes se reuniu diante do Hotel Plaza São Rafael, onde ocorreu um seminário sobre a exploração do carvão mineral no Estado, para protestar contra a retomada desse tipo de investimento. Os empreendedores sustentam que existe tecnologia suficiente para garantir operações seguras.
— Vemos com muita preocupação essa nova onda de projetos de mineração no Estado. Queremos desenvolvimento, mas nos interessa o rumo desse desenvolvimento. Enquanto outras partes do mundo tentam se transformar em polos de software, de produção de chips, nós vamos nos tornar um Estado mineiro? — questiona o presidente da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan), Francisco Milanez.
O ambientalista sustenta que cada tipo de empreendimento tem riscos específicos, mas, em linhas gerais, o temor é de contaminação do solo, do ar e da água com componentes químicos variados.
— Não adianta dizer que tem tecnologia avançada. Sempre haverá impacto. É incompatível com o tido de desenvolvimento que desejamos — afirma Milanez.
O presidente da Associação Brasileira do Carvão Mineral (ABCM), Fernando Zancan, diz que o risco faz parte do negócio, mas pode ser contornado.
— Tem de usar a engenharia certa, gerir corretamente. Por outro lado, a mineração é extremamente alavancadora de emprego e renda. Faz girar a economia. Criciúma, em Santa Catarina, cresceu por conta do carvão — exemplifica Zancan.
Uma parte dos moradores de regiões próximas a futuros empreendimentos, como na região de Lavras do Sul, já se mobiliza para tentar evitar a instalação de minas.
— A preservação do bioma Pampa é incompatível com a mineração. Nosso produtos agrícolas ficarão estigmatizados pelo risco de contaminação — argumenta a produtora rural Márcia Colares, 47 anos, que vive próximo ao limite de Bagé com Caçapava do Sul e participa de uma associação de defesa ambiental contrária aos projetos previstos para a região.
O promotor Daniel Martini, coordenador do Centro de Apoio Operacional de Defesa do Meio Ambiente do Ministério Público (MP), afirma que o órgão vem acompanhando os processos de licenciamento (com exceção do projeto em São José do Norte, sob cuidados do Ministério Público Federal):
— Todos entendem que o Estado precisa se desenvolver e não será o MP que vai atravancar o desenvolvimento. Mas temos de ver o que é razoável ou não. Se a equação entre desenvolvimento e preservação for equilibrada, está certo. Se o custo ambiental for maior do que os benefícios, caberá ao Ministério Público agir.
MPF tenta suspender licença
em São José do Norte
Dos quatro empreendimentos em busca de autorização para iniciar a extração de riquezas do subsolo gaúcho, apenas um já conseguiu licença prévia — mas corre o risco de perdê-la. O projeto Retiro, que pretende escavar titânio e zircônio em São José do Norte, obteve o primeiro documento de liberação por parte do Ibama, porém o Ministério Público Federal (MPF) entrou com ação na Justiça para reverter essa concessão alegando falhas no processo e risco ao ambiente.
A licença prévia é a primeira etapa de licenciamento e indica que um determinado empreendimento é adequado para se instalar em uma determinada área. Depois disso, é preciso obter as licenças de instalação (que permite obras) e de operação (a qual autoriza o começo da atividade propriamente dita). Dos projetos gaúchos, apenas o de São José do Norte corre na esfera federal. Os demais ainda buscam a licença prévia junto à Fepam.
O MPF ajuizou duas ações em dezembro de 2018 requerendo a nulidade do Estudo e do Relatório de Impacto Ambiental (EIA-Rima) e da licença prévia da mina. Por meio de nota, a procuradora da República Anelise Becker apontou "graves deficiências" nos estudos ambientais e a falta de identificação de comunidades tradicionais de pescadores potencialmente atingidos para justificar o pedido. A Justiça Federal de Rio Grande negou a solicitação, e o MPF recorreu da decisão. O processo segue em tramitação.
Segundo o MPF, o Plano de Recuperação da Área Degradada não contém "plano preestabelecido para o uso do solo nem cronograma físico e financeiro de execução dos trabalhos de recuperação, sendo incerto o tempo que o ecossistema poderá levar para recuperar suas características, de modo que não apresenta garantias para a efetiva recuperação ambiental da área".
A empresa Rio Grande Mineração, responsável pelo Projeto Retiro, informa que o setor jurídico da companhia vem acompanhando a tramitação do caso. Os empreendedores ressaltam que atenderam aos requisitos estabelecidos ao longo do processo de obtenção da licença prévia.