À beira da RS-625, principal acesso a Minas do Camaquã, o produtor rural Olício Garcia dos Santos, 72 anos, nascido e criado "na volta" do Camaquã, torce o nariz para o projeto de mineração que virou assunto entre vizinhos.
– Falam que é venenoso – diz.
Um pouco mais adiante, na sede da Associação dos Moradores das Guaritas, localidade a cerca de 10 quilômetros da área prevista para a mina, os irmãos Décionil e Ireny Pereira Franco também não vislumbram vantagens com a retomada da atividade. Lançam mão do abandono imposto à vila após o fim da mineração de cobre pela Companhia Brasileira do Cobre (CBC) para justificar sua posição frente ao empreendimento da Votorantim Metais que promete mais empregos na região.
– O povo está iludido – diz Ireny, uma das fundadoras da entidade.
A poucos metros dali, o produtor rural Placido Simões Pires Ferreira, 57, não tem dúvidas de que o empreendimento trará problemas.
– Estou apavorado. A mina vai ficar aqui pertinho. Se a outra, que ficava mais longe, já trazia poeira, imagina aqui do lado. Só vai acabar com nosso sossego e trazer todo o tipo de gente – lamenta.
A polêmica instaurada na Região da Campanha motivou, em abril, protesto às margens do Rio Camaquã e audiência pública lotada na Assembleia Legislativa, na qual houve questionamentos dos que se opõem à proposta. O médico veterinário da Embrapa de Bagé Marcos Borba, que participa de projetos de desenvolvimento rural na região, apresentou o que chamou de "exercício teórico" sobre os dados divulgados até então, tanto pela mineradora quanto pelas projeções de mercado para chumbo, zinco e cobre.
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Borba insiste que o apoio mais efetivo à cadeia produtiva agropecuária da região renderia muito mais dividendos. Considerando a produção de ovinos, hoje mais desenvolvida na área, com rebanho de 620 mil cabeças, ele aponta que poderiam ser arrecadados cerca de R$ 100 milhões por ano somente na venda da carne em cortes. A lã, que geraria, pelos cálculos do veterinário, R$ 16 milhões anuais, pagaria os custos de produção. Para ele, os riscos de ver a região contaminada pelo chumbo e os valores que a mineração aportaria na cidade não justificam a opção de apostar na extração mineral novamente:
– Se houver risco de que essa área venha a ser conhecida como uma região contaminada por chumbo, não vejo justificativa para corrê-lo.
A Votorantim rechaça a ideia de que produzirá em solo gaúcho um cenário desastroso como o visto em Mariana (MG) e salienta as medidas de prevenção contra contaminações de solo e água pelo chumbo. Lista que o projeto não terá barragem de rejeito e que a água utilizada será reaproveitada e tratada, sem descarte no Rio Camaquã.– Tudo é organizado para que a área seja, depois, entregue de novo ao ambiente. Haverá monitoramento durante a mineração, e após também – diz Paul Cézanne, engenheiro de minas da Votorantim.
Empresários não veem efeito negativo sobre o turismo
Há quem enxergue na proposta da Votorantim reforço ao crescimento da região sem comprometimento da pecuária e do turismo. Empresário no setor de calcário em Caçapava do Sul, Marcelo Spode investiu no turismo de Minas do Camaquã há cerca de quatro anos. Criou a Minas Outdoor Sports, que organiza atividades de ecoturismo, a maioria delas aproveitando as áreas da antiga CBC, como a mina a céu aberto desativada e a barragem João Dias, usada antigamente para geração de energia. Nos dois espaços, pratica-se stand up paddle, canoagem, entre outras modalidades.
Spode entende que a presença da mineradora pode trazer benefícios na infraestrutura, o que incrementaria o turismo na área:
– Não vejo impedimentos para o crescimento do turismo.
O potencial para atrair visitantes – de praticantes de esportes de aventura a ufólogos que enxergam em Minas do Camaquã um portal de comunicação com ETs – fez com que os ex-funcionários da CBC Luis e Guacira Pavão apostassem no lugar. Com investimentos próprios, criaram o Restaurante Bella Mina e uma pousada.
– Para mim, é só mais um ciclo da mineração. Se não tivemos prejuízos quando a tecnologia e a fiscalização eram muito menos eficientes, não vai ser agora que teremos essa destruição toda que andam pregando – diz Guacira.
O prefeito de Caçapava do Sul, Giovani Amestoy da Silva (PDT), reconhece o potencial turístico da cidade que governa e a falta de investimento num setor que poderia ser melhor explorado, mas afirma que a atividade mineradora também é uma tradição na região e não pode ser descartada:– Falta o município se apropriar de Minas do Camaquã. Acho que, com a Votorantim, poderemos ter recursos e dedicar parte a essa comunidade. Isso deve ser compromisso dos gestores públicos.
Em Lavras do Sul, busca por ouro
A discussão sobre o projeto da Votorantim Metais na Campanha lançou olhares sobre uma das áreas mais ricas em minérios do Estado, o Escudo Sul-Rio-Grandense, motivando pedidos de autorização para pesquisa no Departamento Nacional de Pesquisa Mineral (DNPM).
Além do projeto da Votorantim Metais, as propostas em estágio mais avançado, nas fases de pré-viabilidade e viabilidade econômica, são: Bujuru, Retiro e Estreito (da Rio Grande Mineração), para minerais pesados na planície costeira do Estado; Três Estradas (da Águia Fertilizantes), para fosfatos em carbonatitos, no domínio do terreno Taquarembó; e Lavras do Sul (da Amarillo Gold), para minério de ouro em rochas graníticas, em Lavras do Sul.
A Amarillo atua há algum tempo no local e aposta em uma reserva de 6,4 milhões de toneladas de minério de ouro. Diante da crise econômica, freou investimentos na área para se dedicar a outro projeto mais avançado em Goiás. O gerente geral da empresa, Luis Carlos Ferreira da Silva, diz que as pesquisas em Lavras do Sul serão retomadas ainda no primeiro semestre e que a empresa já organiza estudo de impacto ambiental.
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