Se no Brasil o movimento é de investimento das indústrias de máquinas agrícolas, na Argentina o aprofundamento de uma nova crise fez despencar as exportações brasileiras ao país vizinho – principal parceiro comercial. De janeiro a agosto deste ano, o faturamento das vendas externas aos hermanos caiu 70% na comparação com o mesmo período do ano passado, segundo a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea). E as perspectivas são ainda mais preocupantes para os próximos meses, quando a recessão poderá se agravar a partir do resultado das eleições.
Apesar de muitas fabricantes terem plantas na Argentina, os efeitos da crise são sentidos também no Brasil – que ainda comercializa muitos componentes e produtos acabados à Argentina. Da produção nacional de máquinas agrícolas, cerca de 30% é exportada.
– Além da recessão econômica, tem ainda os impactos da forte seca sofrida pelos produtores argentinos no ano passado – lembra Alfredo Miguel Neto, vice-presidente da Anfavea.
Embora a incapacidade de o governo de Mauricio Macri controlar a inflação e estimular o crescimento tenha sido o estopim de nova crise, as bases da recessão têm origem ainda no governo da família Kirchner, há uma década. Historicamente, a Argentina respondia por 20% das exportações brasileiras de máquinas agrícolas. Neste ano, a participação caiu para 3%.
– Essa situação também causa incerteza para qualquer investimento por lá – acrescenta Miguel Neto.
Outro receio é em relação a um novo calote dos argentinos.
– Muitas indústrias estão com medo de vender para lá por conta desse risco – afirma Cláudio Bier, presidente do Sindicato das Indústrias de Máquinas e Implementos Agrícolas no Rio Grande do Sul (Simers), acrescentando que de 15% a 18% das exportações gaúchas de máquinas agrícolas têm como destino a Argentina.
Perspectiva de dificuldade maior até o final do ano
Entre as indústrias ligadas à Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), as vendas externas caíram 20% no primeiro semestre.
– Reflexo principalmente da crise na Argentina e um pouco do Paraguai, que teve quebra de safra por conta da estiagem. Os dois mercados respondem por quase 50% das nossas vendas externas de máquinas – indica Pedro Estevão Bastos, presidente da Câmara Setorial de Máquinas e Implementos Agrícolas da Abimaq.
Sem visualizar mudança significativa nos próximos meses, o dirigente prevê um segundo semestre ainda mais difícil em relação à Argentina. A situação é agravada pela dificuldade de substituição imediata de mercados importadores para atenuar a baixa dos hermanos.
– Isso não se consegue a curto prazo, exige negociação e acordos. A alternativa é tentar compensar no mercado interno – resume Bastos.
Com unidades no país vizinho, fabricantes estão apreensivas
A forte recessão vivida pela Argentina tem deixado as indústrias com fábricas instaladas no país apreensivas nos últimos meses – quando a economia deu sinais de estrangulamento. Com unidade em Córdoba, a CNH Industrial viu as vendas no país caírem 50% em relação ao ano passado.
– O reflexo é sentido na veia. E não tem como ser diferente, tendo em vista a importância daquele mercado agrícola – considera Vilmar Fistarol, presidente da multinacional dona das marcas New Holland e Case IH.
Com unidade recém construída em Rosário, com 20 funcionários, a Stara passou a produzir no país vizinho pulverizadores, distribuidores de sólidos e autopropelidos.
– Passamos a operar lá em fevereiro, com capacidade reduzida. Seguramos a inauguração justamente por conta da incerteza do mercado local – lamenta Gilson Trennepohl, presidente da Stara.
Uma das primeiras multinacionais a se instalar na Argentina, e com quase 90% das máquinas montadas lá, a John Deere também sente os reflexos da crise.
– É um período ruim, que irá passar. Acreditamos no mercado agrícola argentino, que sempre foi muito competitivo – afirma Paulo Herrmann, presidente da multinacional americana.
Para o presidente do Grupo AGCO para América do Sul, Luis Felli, o momento é de espera pelo novo governo. A multinacional, dona das marcas Massey Ferguson e Valtra, tem fábrica em General Rodríguez, na Província de Buenos Aires.
– A economia está desafiadora. A expectativa é pela política agrícola que será adotada após as eleições – considera Felli.