A equação de recursos naturais finitos e a necessidade de produzir mais desafia os agricultores a investirem em boas práticas de produção, o que passa pela adoção de manejo adequado do solo e uso racional de água. Na propriedade da família Quaini, no interior de Cruz Alta, no noroeste do Estado, a utilização de técnicas como o sistema de plantio direto, incluindo a rotação de culturas com soja, milho e trigo, foi somada à modernização das máquinas e à agricultura de precisão nos 300 hectares de lavoura.
Embora o foco da propriedade seja o aspecto econômico, práticas e tecnologias ambientalmente corretas resultam em maior produtividade e na rentabilidade, o que estimula novas gerações a permanecerem no campo. Os resultados positivos da lavoura levaram a filha Virginia, 18 anos, a desistir do vestibular para Medicina e ingressar na graduação em Agronomia.
— Nos últimos 20 anos, mudamos muitas coisas (na propriedade). A gente sempre visou aumentar o lucro, mas agora também levamos em conta a preservação. Acho que isso foi fundamental para que nossa filha escolhesse ficar no campo — comenta o pai, Evaldo Davi Quaini, 48 anos, enquanto avaliava a compra de uma nova máquina nos estandes da 19ª Expodireto-Cotrijal, encerrada na sexta-feira.
No ano passado, pai e filha adquiriram, pela primeira vez, uma plantadeira guiada por trator com piloto-automático e tráfego controlado. Agora, sonham em substituir os outros dois tratores por modelos com a mesma tecnologia.
— Tenho consciência de é que preciso cuidar dos recursos naturais para ter produtividade a longo prazo — diz Virginia, que está atenta ao tema nas aulas da Universidade de Cruz Alta (Unicruz).
Um trator com controle de tráfego, que circula apenas nos trajetos predefinidos (e, por isso, danifica menos o solo), pulverizadores mais leves, máquinas que lançam no solo apenas o necessário de agroquímicos e que emitem menor quantidade de gases do efeito estufa, entre outras tecnologias, favorecem a preservação do ambiente. No entanto, há outras práticas e técnicas de produção que contribuem para preservar e otimizar os recursos naturais.
Conservar o ambiente vai além de respeitar as leis – significa garantir suprimento de alimentos com qualidade, sem comprometer o futuro do planeta. Segundo especialistas, desenvolver uma fazenda sustentável envolve reciclar ideias, empregar novos modelos de produção e investir.
Solo compactado reduz nutrição e provoca erosão
Na Expodireto, o pesquisador José Eloir Denardin mostrava, junto a lavouras experimentais da Embrapa, um buraco em que as raízes de um pé de milho estavam aparentes. A planta possuía ramificações de apenas cinco centímetros de profundidade, quando deveria ter mais de um metro – culpa do adensamento do solo, detalhou o pesquisador:
— A água da chuva se infiltra apenas até a camada adensada e acaba escoando sobre o solo, provocando perdas por erosão, de corretivos, adubos e material orgânico. Em adição, não atinge o lençol freático.
Uma das formas de evitar esse tipo de prejuízo, segundo Denardin, é promover a semeadura em contorno, ou seja, plantar transversalmente ao declive do terreno, para evitar a erosão. Outra prática importante é diversificar culturas por meio do plantio direto, o que evita a degradação do solo.
O pesquisador cita ainda a adoção do terraceamento agrícola – construção de terraços – para manter a água por mais tempo na lavoura. Segundo Denardin, a crença de que a produtividade da lavoura está alicerçada em produtos químicos vem perdendo força, diante das técnicas preconizadas pela agricultura conservacionista.
— A agricultura conservacionista é efetiva na utilização dos recursos disponíveis, e, por essa razão, é um mecanismo de transformação e sustentação de agroecossistemas — resume Denardin.
A feira internacional do agronegócio de Não-Me-Toque é um manancial de oportunidades, não somente pela mostra de máquinas com mais tecnologia embarcada e de menor impacto à natureza, como também pelas oportunidades de novos conhecimentos sobre práticas sustentáveis. A reportagem circulou pelos 84 hectares do parque e destacou algumas iniciativas.
Práticas recomendadas
- Ter uma propriedade sustentável significa, além de conservar os recursos naturais e respeitar a natureza, promover maior produtividade, gerando lucro aos produtores e envolvendo as pessoas da comunidade. A coordenadora executiva do Grupo de Trabalho da Pecuária Sustentável (GTPS), Beatriz Domeniconi, sugere algumas medidas, começando pela análise da situação atual do negócio.
- Adequação à legislação ambiental e ao uso racional dos recursos naturais, principalmente solo e água.
- Respeito à legislação trabalhista e promoção de capacitação dos funcionários.
- Fomento ao desenvolvimento econômico e social na região da propriedade.
- Investimento em gestão para garantir a viabilidade econômica da fazenda.
- Atenção aos manejos que podem afetar a qualidade e a comercialização do produto final como práticas de bem-estar animal, respeito ao calendário sanitário obrigatório, melhoramento genético e identificação dos animais.
Placas fotovoltaicas
Fonte natural e disponível, o sol é considerado por especialistas uma fonte de geração de energia limpa, pois gera baixo impacto ambiental e não emite gases de efeito estufa.
Com orientação da Emater, o produtor Abrelino José Calgarotto, de Paulo Bento, no norte do Estado, adquiriu painéis solares da Solbras, de São Paulo. Depois de ter aprovado o estudo de viabilidade econômico, Calgarotto assinou, durante a Expodireto, o financiamento para instalar uma usina de energia na propriedade rural de sete hectares onde cultiva soja e trabalha com turismo rural.
Os painéis fotovoltaicos servirão para reduzir os custos mensais com energia, hoje em média de R$ 1 mil.
– É uma alternativa que está aí, de graça (o sol), e resolvi aproveitar – sintetiza o empreendedor, que estima pagar o investimento em oito anos.
Integração lavoura-pecuária-floresta
A diversificação de sistemas, unindo ou alternando cultivos, gado e florestas, ajuda a recuperar solos degradados, incentiva a biodiversidade e aumenta a qualidade e a quantidade da produção de grãos, carne e leite.
– A integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) é sinônimo de sustentabilidade. A diversificação garante o futuro da propriedade agrícola, porque uma atividade fornece ganhos à outra e recupera algo que a outra tirou do ambiente – afirma o agrônomo Ilvandro Barreto de Melo, da Emater.
Segundo ele, há vantagens na produção de carne, leite e grãos, como controle térmico do ambiente, favorecendo o bem-estar animal, e ganhos econômicos do próprio cultivo de árvores, com o comércio de madeira crua e tratada.
Máquinas e Equipamentos
Equipamentos que oferecem mais conforto aos operadores, maior potência e eficiência nas aplicações e que geram menor impacto no ambiente puderam ser conferidos na feira em Não-Me-Toque.
Nos pulverizadores, fabricantes prometem redução no consumo de combustível, maior produtividade por hora/hectare e menor emissão de gases de efeito estufa.
Um modelo da Massey Fergusson promete menor compactação do solo, por ser mais leve do que os similares, segundo o supervisor de marketing de pulverizadores da marca, Vitor Kaminski.
Além disso, agrega tubulação que interrompe rapidamente o fim da pulverização, bomba que reduz a pressão, ponteira que despeja com precisão e sistema acionado somente nas áreas necessárias e GPS.
– Não tem lavoura hoje sem defensivos, mas tem como depositar somente o necessário – aponta Kaminski.
Na Valtra, a aposta é em tratores maiores como forma de reduzir o impacto no solo.
– Eles são o carro-chefe das propriedades, usados para tudo. Então vale mais a pena ter um (trator) grande que vai passar menos vezes na lavoura e pelos mesmos lugares, além de gastar menos óleo e combustível – assinala o coordenador de marketing da empresa, Alberto Toledo.
Conservação do solo
A conservação do solo vai além do uso adequado de agroquímicos e máquinas. E as consequências são profundas. As lavouras com compactação sofrem mais nos períodos de estiagem por não conseguirem armazenar água. Já quando os acumulados são altos, a água tem dificuldade para penetrar.
Por isso, pesquisadores da Embrapa defendem três medidas para evitar o adensamento do solo: semeadura em contorno, diversificação de culturas com plantio direto e terraceamento agrícola. O objetivo final, segundo o pesquisador da Embrapa Trigo José Eloir Denardin, é manter ao máximo a água da chuva no solo e evitar prejuízos causados por estiagens, como a vivida pela zona sul do Estado.