Logo de cara, no encontro com Mary Terezinha, o fotojornalista Lauro Alves dispara: "a senhora fotografa muito bem". Não é difícil entender como a artista, aos 76 anos, mantém intimidade com as câmeras. Ao lado de Teixeirinha, desde a adolescência, a acordeonista protagonizou 12 filmes, se apresentou em incontáveis shows nos palcos ou em estúdios de rádio e TV e se tornou uma das figuras mais conhecidas do Rio Grande do Sul.
Na manhã desta terça-feira (5), horas antes de ser homenageada no show "O Grande Encontro", a gaiteira recebeu a reportagem de GZH no seu apartamento do bairro Vila Ipiranga, zona norte de Porto Alegre.
— Cinco de abril é o dia que eu subi no palco pela primeira vez com o Teixeirinha — comenta, sobre os 61 anos de carreira comemorados.
Ao programa Gaúcha Hoje, da Rádio Gaúcha, Mary Terezinha relembrou de quando atuou na emissora embrião do Grupo RBS. Puxou a memória das milhares de cartas recebidas - todas respondidas, garante - e do carinho dos ouvintes.
— Mexe demais lembrar dessa época. Estou muito feliz em poder estar aqui, conversando com os ouvintes da minha Rádio Gaúcha — afirma.
A emoção evidente no olhar logo virou choro, quando o apresentador Antônio Carlos Macedo a surpreendeu com a reprodução de uma trova com outra paixão regional, a dupla Gre-Nal. A disputa em versos era encenada nos programas da Gaúcha - no ar em duas edições diárias, em dias úteis, e também aos finais de semana.
Um momento hilário relembrado mereceu gargalhadas: Teixeirinha leu uma carta que acreditou ser escrita por "Floriano Lopes". Mary interpelou o parceiro: "é a cidade dele, Florianópolis".
Para o interior do Estado, o programa era gravado e enviado por malote. A função exigia um esquema para evitar intrusos no meio do caminho.
— Eles estacionavam no subsolo e já ficava uma pessoa segurando a porta do elevador, pra não precisar parar. Gravávamos à noite, lá por 11 da noite, porque era menos movimentado — relembra o operador de áudio Rudinei Raugust, 58 anos, que na adolescência auxiliava nos estúdios.
Coquetéis com convidados, para lançamento das películas, movimentavam o Centro da Capital, e os rolos rodavam o Rio Grande do Sul, espalhando outro talento até então desconhecido, o da atuação.
Dores nas costas e distância dos palcos
O tempo cobra hoje o passado de turnês, e a idade expõe reflexos dessa rotina, de viagens Brasil afora: problemas na coluna e dores nas costas não permitem mais sustentar os quase 20 quilos do acordeom. A voz sai com certa dificuldade, sem um diagnóstico preciso:
— Ela ficou muito tempo sem falar na pandemia, sem sair de casa. Foi um período bem difícil — explica Alexandre Teixeira, 54 anos, filho de Mary e Teixeirinha.
Com a articulação prejudicada, a artista deixou de cantar. As recordações, porém, parecem intactas, em uma longa conversa na sala de casa. O apartamento de cômodos bem decorados tem quadros pendurados nas paredes. São retratos dos anos 1980, o auge das seis décadas de fama. O sucesso, diz mais de uma vez, é algo que jamais se repetirá na mesma intensidade.
Mesmo com um relacionamento conturbado, acompanhado em tempo real pela imprensa, Mary foca suas memórias na alegria de ter sido companheira de Teixeirinha por 22 anos.
— Eu fui feliz. Sou feliz. O que vivemos foi um milagre — define.
Músicas inéditas
As duas últimas décadas foram dedicadas à música gospel. No entanto, o período ao lado de um dos artistas mais populares da história da música regionalista gaúcha e brasileira é o foco de quem a procura nas redes sociais. Esse público, garante Alexandre Teixeira, em breve ganhará um presente: um álbum com nove canções inéditas e três regravações.
— Tem músicas gravadas e compostas por ela e pelo pai. Mas a gente só vai revelar as inéditas mais pra frente — interrompe.
— Elas estavam bem guardadas, são vivas — complementa Mary.
As faixas estão em um CD, com capa provisória e títulos datilografados no verso. O material foi produzido entre os anos de 1991 e 1992, mas jamais foi lançado. Na Rádio Gaúcha, pôde-se ouvir uma palinha de Gaita e Violão, uma regravação que compõe a coletânea, ainda sem data de lançamento.
A deferência de cantores tradicionalistas é outro patrimônio que ela carrega como herança dos 22 anos ao lado de Teixeirinha. No Timeline Gaúcha, enquanto repetia histórias para quem acompanhava saudosista, teve a linha cruzada por outro entrevistado, Neto Fagundes.
— A própria Mary me ligou, convidando pra gente gravar junto. Foi um grande momento — contou.
No Timeline, além da homenagem, Mary teve o convite devolvido por Neto, e sinalizou o desejo de acompanhá-lo nos festejos dos seus 40 anos de carreira, no mês de maio.
Ouça a entrevista ao programa Gaúcha Hoje:
Confira a participação no Timeline Gaúcha:
8ª edição de O Grande Encontro — Música dos Gaúchos
- Quando: nesta terça-feira (5), às 20h30min
- Onde: Auditório Araújo Vianna (Av. Osvaldo Aranha, 685), em Porto Alegre
- Ingressos a partir de R$ 30 à venda no Sympla
- Desconto de 50% para sócios do Clube do Assinante