Dois municípios gaúchos decidiram deixar de lado uma rivalidade histórica em nome de um objetivo em comum: lutar pelo reconhecimento nacional do único ritmo musical considerado nativo do Rio Grande do Sul, o bugio. Representantes de São Francisco de Assis e São Francisco de Paula, que reivindicam terem originado essa tradição, firmaram uma trégua. E se uniram em torno da proposta de tornar essa tradição patrimônio imaterial do Estado e da nação.
No centro de São Francisco de Paula, tradicionalistas das duas cidades participaram da gravação de uma reportagem para o Jornal do Almoço, da RBS TV, com cantoria e danças tradicionais inspiradas no ronco do macaco bugio, comum nas matas do Estado. Como símbolo dessa união, prefeito e vice de ambas as cidades entrelaçaram lenços maragato e chimango em suas mãos.
— Era aquela disputa: "Isso é meu", "É teu", "Porque eu comecei primeiro". Então, não adianta nós brigarmos. Nós temos que chegar a um consenso — afirma o prefeito de São Francisco de Paula, Marcos André Aguzzolli (PP).
Presidente do Conselho Municipal de Cultura da cidade, o escritor Israel da Sois é autor de um livro a ser lançado nas próximas semanas, que resgata a história do ritmo. Independentemente de onde surgiu, é consenso que a inspiração dessa tradição é mesmo o macaco.
— A principal origem é a do macaco, é a imitação daquele ronco do macaco na mão esquerda do acordeom, e na dança o macho faz o galanteio para a fêmea — explica.
Estopim
Na prática, essa parceria começou ainda em fevereiro, dias após o governo federal promover uma cerimônia em Brasília para anunciar o tombamento do forró como patrimônio imaterial do Brasil. Foi o estopim. Intermediadas pelo deputado estadual Ernani Polo (Progressistas), duas reuniões já foram realizadas — com o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado (Iphae) e com o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
— Isso permite também que empresas possam apoiar projetos através da lei de incentivo à cultura, tendo abatimento maior no valor do patrocínio. Nesse sentido, estamos buscando orientações e juntando documentos para que o processo seja contemplado no Estado e a nível nacional — entusiasma-se o parlamentar.
As duas cidades "berço" do bugio preparam a retomada dos festivais nativistas que celebram o ritmo: São Francisco de Assis planeja a Querência do Bugio para outubro, e São Francisco de Paula, o Ronco do Bugio em agosto. O grupo de trabalho também quer realizar seminários e estimular os artistas gauchescos a ampliarem a participação do ritmo em seus repertórios.
— Era como um Gre-Nal, e agora é com torcida única. Estamos unidos nessa bandeira, fazendo com que esse ritmo seja não só de São Chico de Assis e São Chico de Paula, mas de todo o Rio Grande e do Brasil — resume o vice-prefeito de São Francisco de Assis, Jeremias Oliveira (PDT).