No quesito "casais que largaram tudo para viajar pelo mundo", o texto de que mais mobilizou nossa audiência quando publicado foi o dos paulistas Sarah Moreira e Renato Matiolli, em julho de 2015.
À época, fazia quase três meses que os dois haviam deixado seus empregos e o ritmo frenético do Rio de Janeiro para conhecer o mundo a bordo de um catamarã, na companhia do bull terrier Feijão. O projeto, batizado de Sail Ipanema, era velejar inicialmente pelo Mediterrâneo (compraram o barco na Croácia), depois passar um período no Caribe e, finalmente, alcançar as ilhas do Pacífico – durante todo o tempo, eles hospedariam turistas na embarcação para se sustentar.
Quase três anos depois, quem acompanha pelas redes sociais as fotos e os vídeos do Feijão percebe que o mar virou casa para o trio.
– Esse aí nasceu para essa vida, viu? – brinca Sarah, falando sobre Feijão. – Ele se mudou para o catamarã com uns sete ou oito meses. Então, passou mais a vida no barco do que no Rio com a gente. Sabe que é a casa dele.
Se o cão está feliz, os humanos não pensam diferente.
– Temos o privilégio de ser donos do nosso próprio tempo. Ir, vir, trabalhar e descansar quando a gente quer – explica ela. – O ruim, para mim (o Renato nem liga tanto), é estarmos longe da civilização por tanto tempo seguido. Sem wi-fi, sem um restaurante quando não se quer cozinhar, sem supermercado à mão fácil, sem um cabeleireiro de vez em quando (risos).
Até o momento, o projeto percorreu destinos do Mediterrâneo, da Croácia a Portugal, e depois atravessou o Atlântico para velejar pelo Caribe. Nesse tempo, o Ipanema já recebeu quase 300 hóspedes de várias nacionalidades – o que tem financiado a empreitada.
O cuidadoso planejamento, porém, não está sendo seguido à risca. Em mares caribenhos, os planos sucumbiram a uma paixão: San Blas. A ideia era passar seis meses no arquipélago paradisíaco do Panamá, mas 2018 chegou e o trio ainda estava por lá – o meio ano acabou virando um ano e meio.
– Recebemos um monte de gente em San Blas, foi incrível! O lugar é um paraíso – empolga-se Sarah. – É pouco conhecido ainda, então não tem hotéis, resorts. A água é azul, azul, e se você curte snorkel, tem corais e vida marinha maravilhosos! A cultura Kuna é interessante também.
Mesmo com a paixonite pela região, que tem mais de 365 ilhas, chegou a hora de partir para a próxima fase: o Pacífico. Quando conversou com GaúchaZH, Sarah já estava em uma marina panamenha, onde os três passarão o mês de março fazendo a manutenção anual do barco e se preparando para a longa travessia. Em abril, passarão pelo Canal do Panamá e seguirão para o Oeste.
– O plano atual é conhecer Galápagos e, depois, desbravar as ilhas da tão sonhada Polinésia Francesa – conta Sarah.
Mas os três não estarão sozinhos nos cerca de 40 dias entre o Panamá e o arquipélago de Gambier, na Polinésia. Três hóspedes farão com eles todo o trajeto a bordo do catamarã.
– Tivemos mais de 70 pessoas interessadas, mas demos preferência para quem podia fazer a travessia inteira. Como a permanência em Galápagos ainda é um pouco incerta, dada a burocracia (é uma reserva marinha superprotegida), ia ficar mais difícil nos comprometermos com datas – comenta.
Depois disso, ainda não há hóspedes confirmados, diz Sarah, porque eles querem garantir os detalhes para manter a rotina do barco, como onde comprar gás de cozinha e comida:
– Já temos vários hóspedes querendo voltar. Estamos fazendo nossa “lista de espera” (risos).
No site, a rota traçada termina no final de 2022, de volta para o Rio, após contornar a costa da Ásia e da África. Sarah, contudo, fala que eles estão navegando um pouco ao sabor dos ventos:
– Acho bem difícil termos uma vida convencional de novo, para falar a verdade. A ideia é continuar no barco por tempo indefinido, enquanto estivermos curtindo e conseguindo nos manter financeiramente.
De hóspede em hóspede
Além de financiar a aventura, oferecer hospedagem no Ipanema é benéfico para a vida em casal. Segundo Sarah, não é fácil trabalhar e viver juntos 24 horas por dia.
— Ter hóspedes muda a dinâmica do barco, a energia, é legal ter gente para conversar, trocar ideia, se divertir. Levamos o pessoal para conhecer nossas ilhas favoritas, para fazer snorkel. Ensinamos a usar stand-up paddle, a viver essa vida de mar. Fazemos fogueira na praia — enumera.
Mas ela faz um alerta: esse tipo de férias não é para todo mundo. É preciso gostar muito de natureza e respeitar o ritmo do mar, sem querer conhecer muitas coisas em um curto espaço de tempo. Outro ponto importante: para aproveitar a experiência, a pessoa deve ser flexível e não exigir todos os confortos da vida moderna a bordo. Não há wi-fi, por exemplo, a água é racionada, e a comida é caseira e simples.
— Por norma, a convivência com os hóspedes é bem tranquila. Alguns até viram grandes amigos. Já tivemos gente que veio já uma segunda vez; o Duda, um brasileiro, já veio cinco vezes! — conta Sarah. — Em geral, pessoas que procuram por férias, assim, diferentes, são bem legais, interessantes, que viajaram muuuito.
E os perrengues?
Sarah afirma que não foram muitos — houve apenas um momento de mais tensão.
— Uma das primeiras vezes que saímos para velejar, um alarme começou a tocar, e a gente não sabia o que era. Demoramos uns minutos até perceber que tinha água quase no nível do piso do barco, o que significava que o porão estava enchendo de água! — relembra.
Então, foi um corre-corre para ligar todas as bombas que ajudam a escoar água para fora e tentar entender o que estava acontecendo. Renato descobriu que uma mangueira do dessalinizador havia se soltado e estava bombeando água para dentro da embarcação.
— Rapidamente desligamos a máquina, colocamos a mangueira de volta e, simultaneamente, bombeamos toda a água do porão para fora, manualmente e com duas bombas elétricas. Nisso, o Renato já tinha descoberto um lugar rápido para ancorar o barco, e terminarmos tudo com calma — relata.
Para se hospedar
A ocupação máxima do catamarã é de seis hóspedes. O preço da diária é de US$ 500 pelo barco mais US$ 200 por pessoa (ou seja, US$ 900 por casal). O valor inclui capitão, hostess, cabine com banheiro privativo, refeições, combustível para barco e bote, uso das pranchas de stand-up paddle e equipamento de snorkel. Saiba mais aqui.
Quem são
-Sarah Moreira, 36 anos, nasceu em Marília, interior de São Paulo. Formada em hotelaria, trabalhava com assessoria de imprensa para redes de hotéis.
-O paulistano Renato Matiolli, 40 anos, é formado em Engenharia e Gestão de Empresas e trabalhava com consultoria estratégica.
Veja a história de outros dois casais
Mais de três anos depois de partirem, o gaúcho Rômulo Wolff Pereira e a mineira Mirella Rabelo continuam na estrada. E o melhor: a aventura virou negócio para o casal. Leia a história deles aqui.
Há mais de um ano, os gaúchos Luciano Ferreira e Caína Giordani venderam tudo para se jogar em uma viagem de carro pelas Américas. Caína compartilha com a gente os momentos mágicos dessa aventura. Leia a história deles aqui.