Information Society, Kon Kan e Double You viveram seu auge entre 1988 e 1993. Foi durante esse período que lançaram seus maiores sucessos: What's On Your Mind, Repetition, Walking Away, Think e Peace and Love, Inc., no caso do trio estadunidense; I Beg Your Pardon, Harry Houdini e Liberty, no projeto do canadense Barry Harris; e as covers da banda italiana para Please Don't Go, We All Need Love e Who's Fooling Who.
Naturalmente, o show que reuniu esses três artistas no Auditório Araújo Vianna, em Porto Alegre, na noite deste domingo (22), atraiu uma legião de cinquentões nostálgicos da sua adolescência e da sua juventude. Aliás, na primeira fila havia um fã com uma camiseta que clamava: "Volta, 80". Era uma turma disposta a reviver por cerca de quatro horas os tempos de reuniões dançantes e danceterias. Gente como eu e o Fábio Ramiro Fuhr, 53 anos. Acompanhado de uma turma, ele aguardava especialmente o InSoc e o Kon Kan, "para ouvir as clássicas mesmo".
Foi o encerramento da turnê brasileira batizada de "Reviva os Anos 80 e 90 com os Gigantes da Dance Music". Enquanto o show não começava ou durante os intervalos, DJs da festa Balonê, que há mais de 20 anos celebra a música das décadas de 1980 e 1990, tratavam de deixar o público no clima. As luzes acesas não inibiram espectadores de sacolejar ao som de, por exemplo, Pump the Jam (1989), do Technotronic, Stop! (1989), do Erasure, Enjoy the Silence (1990), do Depeche Mode, e The Rhythm of the Night (1994), da banda italiana Corona.
A primeira apresentação foi do Kon Kan. Às 20h05min — portanto, apenas cinco minutos depois do horário marcado —, Barry Harris apareceu no palco. Depois de interpretar Move to Move, falou em português:
— Olá, Porto Alegre. Vocês estão prontos para cantar e dançar comigo?
Na sequência, com um violão elétrico em punho, começou Liberty em versão acústica, mas logo transformou o Araújo Vianna em danceteria, tendo como aliados os pulsantes sintetizadores e sua poderosa backing vocal.
Harris esbanjou simpatia, incluindo a exibição, no telão ao fundo, de imagens que traziam as letras das canções, para estimular o público a cantar junto aquelas que não são tão conhecidas, como Bite the Bullet. Algumas também apareciam traduzidas para o português, como seu grande sucesso, I Beg Your Pardon, um dos três momentos apoteóticos da noite em que dancei como se tivesse 15 anos de novo, soltando a franga sem medo do amanhã. Harris convocou os fãs para o coro do hit Harry Houdini e, no bis, voltou com uma bandeira do Brasil às costas.
Às 21h20min, foi a vez do Information Society, formado por Kurt Harland (vocal), Paul Robb (sintetizadores) e James Cassidy (baixo e teclados) — uma figuraça, sempre buscanto interagir com a plateia. Mas para uma banda que já veio tantas vezes ao Brasil e que diz adorar o país, Harland falou pouco em português. E, contrastando com Barry Harris, ele adotou um senso de humor debochado, quase arrogante.
— We do not take requests — repetiu mais de uma vez, alertando que não adiantaria o público pedir essa ou aquela questão.
Eles abriram os trabalhos com I Like the Way You Werk It, que já anuncia no nome a homenagem à banda alemã Kraftwerk, ícone da música eletrônica. Logo depois lembraram seu single de estreia, Running (1985), e emenderam com Growing Up with Shiva (2008), que tem inspiração indiana. Após uma troca de figurino, houve o segundo momento apoteótico: uma versão mais pesada de Peace and Love, Inc., um petardo dançante de 1992 que resistiu muito bem à passagem de tempo. Continua com frescor musical e uma energia contagiante. A letra, por sua vez, segue bastante atual, ao falar da mercantilização da felicidade e dos valores humanos, por exemplo, e da supervalorização e da fabricação do politicamente correto.
O repertório do InSoc contou com Walking Away e Think antes de Harland chamar ao palco a vocalista Marisa Lenhardt. Com ela, houve duas covers turbinadíssimas: a de Don't You Want Me, do Human League, com o refrão cantado por quase todo o Araújo Vianna, e a de Dominion/Sisters of Mercy, que, infelizmente, pareceu não ter junto ao público a fama que merece. Pelo menos para mim, foi mais um momento apoteótico.
O InSoc fechou o show com What's On Your Mind sacudindo a galera. No bis, a balada Repetition, trilha sonora de muita fossa e de muitas reconciliações. Eu aproveitei para dar uma descansada, porque ai de mim lá em casa se eu fosse dançar coladinho!
Antes do show do Double You, um produtor apareceu para dar mais informações sobre a notícia triste da noite, antecipada em um folheto entregue de mão em mão aos espectadores: William Naraine, a voz e a cara da banda italiana (o nome, a propósito, é uma referência à letra W), não veio a Porto Alegre, por motivos de saúde. Estava internado em um hospital de São Paulo, motivo pelo qual também não cantou em Goiânia, no sábado (21). Não foi dito no Araújo Vianna, mas segundo uma matéria do Jornal Opção, de Goiás, uma nota da organização da turnê reveleu que na manhã de quinta-feira (19) William, 58 anos, teria sofrido "um princípio de infarto".
Com um substituto brasileiro (cujo nome não foi anunciado) e a empolgada vocalista Francine Missaka, o Double You buscou compensar essa grande ausência fazendo um show bastante enérgico. O baterista deixou o pique lá em cima, e o guitarrista fez várias citações a clássicos do rock, como Satisfaction, dos Rolling Stones, e Smoke On the Water, do Deep Purple.
Mas Naraine fez muita falta, sobretudo no grande sucesso da banda, Please Don't Go, que, contrariando expectativas, não foi a primeira nem a última canções do show, mas a segunda. Não teve pompa e circunstância.
A solução encontrada pela trupe foi empilhar músicas dançantes, oferecendo uma salada estranha de épocas. Ora vinha Run to Me (1994), do próprio Double You, ora uma cover de Feel So Close (2011), de Calvin Harris, ora uma versão para as pistas de Because the Night (1978), de Patti Smith. Ainda que fizesse todo sentido intepretarem um hino da eurodance, What Is Love (1993), de Haddaway, no que talvez tenha sido o único momento de fato apoteótico, no conjunto ficou uma coisa sem personalidade.
Depois do show do Double You, haveria uma mini-edição da festa Balonê, só que daí meus joelhos me lembraram que não tenho 15, mas 51 anos.