Quando a fisioterapeuta Nathalia Camargo Machado, 32 anos, deixou Porto Alegre para trás e embarcou com o marido para morar em Capão da Canoa no início do ano passado, levou nas malas o desejo de recolher os pedaços de si perdidos em algum lugar. A depressão drenava as energias, mas ela teve a ideia de investir na aproximação com a natureza para retomar o foco.
Ao digitar três palavras no Google — "ioga Capão da Canoa" —, deparou com um refúgio em uma reserva natural que promovia a atividade no meio do mato e, no verão, adaptava-os para praticá-los no stand-up paddle — espécie de prancha de surfe — em um açude. A partir daí, ela passou a praticar a modalidade até, ao entrar em contato com a paisagem exterior, organizar sua paisagem interna.
— Ficamos isolados da natureza, fechados em prédios, e isso nos faz mal. A natureza faz parte do homem, quanto mais nos afastamos dela, mais ficamos doentes. Por que centros de recuperação ficam afastados da cidade? Porque é preciso disso para se reconectar — diz.
Nathalia se reúne semanalmente com cerca de 20 pessoas na Reserva da Laguna, área verde de 40 hectares localizada perto do km 40 da Estrada do Mar, em Capão da Canoa, para praticar ioga. Zero Hora acompanhou, na manhã da última quarta-feira (7), um desses encontros. Tudo começa com uma caminhada em meio às árvores, em silêncio, para relaxar antes de ir para a água. Motivo: o stand-up paddle ioga exige foco. Como a prancha se movimenta na água ao sabor do vento, a base do praticante não é fixa, o que exige mais técnica e, claro, concentração.
Quem guia as atividades é a professora Celina Murliki da Silva, 49 anos, também formada em Educação Física.
— (O stand-up paddle ioga) É para quem já tem o básico. Ao buscar a concentração para manter o equilíbrio na prancha e superar o medo de cair, você não presta atenção aos pensamentos que vêm à mente. E aí você esquece tudo, o que favorece a concentração e a meditação. A prancha é um material de auxílio para meditar — explica.
O percurso é uma mistura de trilha no mato com arvorismo — é preciso caminhar por cima de um tronco, que se inclina para cima até se tornar uma passarela que costura entre as árvores. A caminhada reconforta, ouve-se apenas os sons de pássaros e os mantras de relaxamento que pululam de uma caixa de som portátil trazida por uma aluna. O trajeto sobre a madeira desemboca em um piso redondo, sobre o qual o grupo estira toalhas e se acomoda para praticar posturas.
Nessa parte, todos se concentram como se estivessem ligados por um fio invisível, emitindo a mesma vibração. Aos poucos, iniciam o primeiro movimento. Na ioga tradicional, é a famosa saudação ao sol, na qual o adepto realiza uma sequência de posturas para agradecer ao universo. Mas Celina a transformou na saudação à garça, com movimentos que lembram o pássaro de pernas finas. Após alguns minutos de posições, a professora recita mantras de amor próprio e leva todos a se dirigirem, em silêncio comungado, ao açude.
Metade vai à água, enquanto a outra fica na grama. Nathalia escolhe ir para a prancha, sobe tranquilamente e, o mais curioso, acompanhada da cadelinha Clara. Durante toda a prática, a tutora estica pernas, levanta braços com leveza, joga-se por cima do bicho que fica quietinho, como se absorvesse a calma que é emanada. O estado de espírito dela é oposto ao que vivia antes.
— Aqui me ligo ao meu eu interior, estou muito feliz de ter me mudado. Sou outra pessoa. Gosto de praticar na prancha, é um pouco mais difícil pela instabilidade, mas já nos acostumamos. Isso ainda ativa a musculatura abdominal e ajuda na respiração — conta Nathalia, demonstrando seus conhecimentos de fisioterapia.
Outra que se beneficia do refúgio é a escritora Sueli Caetano, 57 anos, que começou a praticar ioga na reserva em fevereiro do ano passado. No dia da visita da reportagem, estava com a filha Clarissa, de 12 anos, que fazia aniversário no dia.
— Se a ioga normal exige equilíbrio, no stand-up paddle é o dobro. Mas aqui tem a conexão com a água, o que é maravilhoso. Ou me equilibro, ou caio. E com isso você se supera — reflete a mãe.
— É mais divertido de fazer na água, nem tive medo de cair — conta a filha.
Quem, com certeza, não teve medo de molhar-se foi a terapeuta Lorien Tonial, 58 anos, praticante há seis meses de ioga. Destemida, arriscou-se pela primeira vez a praticar posturas na prancha. Por duas vezes, perdeu o equilíbrio e tombou no açude, emergindo com gargalhadas. As colegas a aplaudiram pela tentativa.
— É um remédio natural, é maravilhoso — diz ainda de dentro da água nadando tranquilamente, como se estivesse em seu hábitat natural.
As aulas
São realizadas todas as quartas-feiras, às 15h, na Reserva da Laguna. A prática em grupo custa R$ 25. Contato da Reserva da Laguna: (51) 99612-2973.