Não se trata de dizer que está claro o "efeito gangorra" na retomada do Gauchão. Nem dá para fazer uma comparação profunda entre a dupla Gre-Nal com uma amostragem tão pequena, de apenas dois jogos, e com o Inter utilizando dois times diferentes. A verdade é que as atuações tricolores foram melhores, seja ganhando o clássico com justiça em Caxias do Sul ou no empate apenas suficiente com o Ypiranga. Os colorados não foram bem com os titulares contra o Grêmio e deixaram muito a desejar com os reservas diante do Esportivo.
Isto não é de todo surpreendente. É típico de quando há uma estrutura mais sólida e constante e outra ainda propondo mudanças e interrompendo drasticamente uma fase de evolução que ainda não tinha criado casca.
Os méritos do Grêmio de Renato Portaluppi vão, ao logo de quase quatro anos, além de uma proposta de jogo ofensiva que preconiza a posse de bola e cria um futebol plasticamente agradável e competitivo. O funcionamento interno do grupo de profissionais tricolores já se mostrou imune a diversos sobressaltos neste período. Dentro de campo, houve perdas supridas de maneira surpreendente como Douglas, Walace, Arthur, Pedro Rocha ou Luan.
O próprio departamento de futebol já teve alteração no comando em mais de uma oportunidade e nada de grave atingiu o rendimento da equipe. Há uma regeneração natural que não causa grandes efeitos dentro das quatro linhas e que mais uma vez está se fazendo sentir agora. Foi esta capacidade de se resolver internamente que levou o time, depois de 120 dias, a entrar em campo e, como um carro bem regulado, ligar a chave a sair andando. Todos sabem, há muito tempo, o que e como fazer, mesmo alguns integrantes mais recentes do elenco.
No Inter, a interrupção de trabalhos brecou uma evolução sob alicerces ainda instáveis até março. Esta evolução tinha por base a ideia de ruptura, de novo trabalho e de mudanças radicais como a presença de um técnico estrangeiro. Não basta, após quatro meses, dar a partida e largar de onde parou. É possível que as regulagens, seguindo a analogia com uma máquina, tenham sido perdidas, seja na equipe titular ou entre os suplentes. Eduardo Coudet estava construindo certezas com seu grupo de jogadores. O prejuízo da falta de atividade é muito maior nestas condições, independente da qualidade do grupo. O coletivo colorado não havia sido ainda uma perfeição antes da pandemia. Não pode se cobrar que agora o seja. A desvantagem em relação ao rival é absolutamente natural, mas não definitiva, inclusive para o Gauchão.
Enquanto o Grêmio nunca começaria do zero por ter um trabalho de longo prazo sob o comando de Renato, o Inter dá mostras de ter voltado alguns passos numa caminhada que era pequena até então. Os colorados não estão proibidos de ganhar o Gauchão, mas dificilmente atingirão uma maturidade de jogo nas próximas duas semanas. Quem sabe isto venha com o tempo, talvez no decorrer do Brasileirão e da Libertadores. Aos gremistas surge o desafio de seguir fazendo o que sabe fazer, mas aperfeiçoando pontos que andam desgastados e que já custaram dissabores como a perda do primeiro turno para o Caxias. A memória tática e coletiva já determinou vantagem azul na retomada, mas não significa título diante de um rival que apostará na superação e na intensidade.