Era um refeitório grande. Atendia mais de 500 pessoas por dia. Depois de trabalhar algumas semanas na plantação de algodão e na ordenha das vacas, eu agora limpava mesas e banheiros na área de alimentação. Chegava às cinco e meia da madrugada e começava a preparar o café da manhã. O kibutz é uma espécie de fazenda coletiva, muito popular em Israel até o final do século passado. A mudança da matriz econômica, com foco na inovação, esvaziou esse modelo, que ainda tem alguns bravos representantes. Quando eu tinha 17 anos, passei cinco meses em um deles, no norte do país, exatamente na fronteira com o Líbano.
Entre os meus afazeres, estava a preparação de omeletes. Desenvolvi uma técnica própria. Quebrava dois ovos ao mesmo tempo, um com cada mão. Despejava as claras e as gemas em uma jarra. As cascas eu jogava para trás, uma espécie de arremesso duplo de basquete, de costas. As cestas eram dois tonéis de plástico.
Um dia, na hora do almoço, fui encarregado de servir os bifes, no setor de alimentos quentes. Era a chance de testar meu hebraico. Uma senhora grisalha, apoiada em seu andador, chegou sorridente. Olhou-me com aquela cara de vó querida e perguntou: “Akol metugan?”. Akol quer dizer tudo.Barbada. Mas metugan... não conseguia encontrar no meu dicionário mental. Foi fácil. Em uma fração de segundo, deduzi. O que uma simpática avó poderia estar me perguntando? Akol = tudo. Metugan = bem. “Tudo bem?”. Óbvio. Ela estava sendo gentil. De bate-S pronto, respondi, todo pimpão, na língua dela: “Eu estou muito metugan, obrigado. Tudo metugan com a senhora também?”. A senhorinha fez uma cara estranha. Uma mistura de interrogação e surpresa. Em seguida, deu um tapa no ar, como quem diz: “deixa pra lá”. E saiu em direção às saladas.
Depois do almoço, enquanto recolhíamos os saleiros para limpá-los, contei essa história para um dos meus colegas israelenses. Ele se contorcia de tanto rir. “Sabe o que quer dizer metugan?”, me perguntava, entre uma gargalhada e outra. “Metugan quer dizer frito”. Ela queria saber se a comida era toda frita. Estava preocupada com o seu colesterol, e não em me dar bom-dia. Apesar da minha vergonha, ri junto. Lembrei-me da fisionomia da simpática senhora ao ouvir a minha resposta. “Eu estou muito frito, obrigado. Tudo frito com a senhora também?” Sim. Ambos, naquela hora, estávamos fritos, por razões diferentes.