Aquaman 2: O Reino Perdido (Aquaman and the Lost Kingdom, 2023) pode ser a gota d'água em um ano muito ruim para os super-heróis, que colecionaram fracassos de público e de crítica.
O retorno financeiro é obrigatório para os filmes da DC e da Marvel, pois as produções são caras — Aquaman 2, que por três vezes voltou ao estúdio para refilmagens, custou US$ 215 milhões. O top 10 das bilheterias de 2023 pode dar a falsa impressão de que está tudo bem com o gênero, já que há três aventuras de super-herói na lista: Guardiões da Galáxia Vol. 3, quarto colocado com US$ 845,5 milhões; o longa de animação Homem-Aranha: Através do Aranhaverso, sexto, com US$ 690,5 milhões; e Homem-Formiga e a Vespa: Quantumania, que fecha o ranking com US$ 476 milhões.
Mas Besouro Azul (US$ 129,2 milhões), Shazam! Fúria dos Deuses (US$ 135,8 milhões), As Marvels (US$ 204,8 milhões) e The Flash (que merecia bem mais do que US$ 270,6 milhões) puxam para baixo a média de arrecadação por filme na temporada: US$ 393,3 milhões. Claro que é sacanagem comparar com 2019, o último ano antes da pandemia que fechou a maioria dos cinemas em 2020 e que provocou uma mudança no comportamento dos espectadores — com quatro títulos superando a marca do US$ 1 bilhão (Vingadores: Ultimato, Homem-Aranha: Longe de Casa, Coringa e Capitã Marvel), o faturamento médio foi astronômico. O ponto é que o número de 2023 é significativamente inferior ao de 2021 (US$ 546,6 milhões) e ao de 2022 (US$ 658 milhões).
Vários fatores explicam a queda, desde a aposta em personagens de popularidade duvidosa até os movimentos de boicote de uma turma que se queixa da diversidade étnica e sexual nos títulos de super-herói. Talvez o principal motivo seja o cansaço do público com a fórmula — aí incluída a estratégia da Marvel de interligar todos os seus filmes e as suas séries — e a falta de risco emocional.
Em cartaz a partir desta quinta-feira (21) nos cinemas, Aquaman 2 não tem esse problema. O único filme que você precisa ter visto antes é Aquaman (2018), que foi assinado pelo mesmo diretor, James Wan, e que é o campeão de bilheteria da DC, com US$ 1,15 bilhão. Se não viu, um prólogo resume os fatos. Por outro lado, nada do que acontece na trama terá consequências no futuro, porque este título encerra o Universo Estendido da DC como o conhecemos. Após assumir com Peter Safran a presidência do DC Studios, em outubro de 2022, o cineasta James Gunn anunciou a decisão de recomeçar tudo do zero. Ou seja: Henry Cavill não voltará a ser o Superman, Ben Affleck não vestirá mais o uniforme do Batman, nem Jason Momoa continuará sendo Aquaman (mas há rumores de que a Mulher-Maravilha de Gal Gadot sobreviveu à reformulação).
O problema de Aquaman 2 é outro. E pior: uma história absolutamente genérica, com direito a cenas e diálogos que vão causar déjà vu nos fãs do gênero — Pantera Negra (2018) parece ser a maior "inspiração" no roteiro escrito por David Leslie Johnson-McGoldrick.
No começo do filme, Arthur Curry divide seu tempo entre as obrigações como rei de Atlântida, o combate a piratas e contrabandistas como o super-herói Aquaman e os afazares domésticos como pai do bebê que teve com Mera (Amber Heard, que aparece pouco, mas bem mais do que se poderia esperar depois de tanto bafafá). Logo surge uma ameaça ao planeta, tanto para a vida na superfície quanto para o mundo marinho: o vilão Arraia Negra (Yahya Abdul-Mateen II), que deseja se vingar da morte de seu pai pelo personagem de Momoa, se apossou de um tridente superpoderoso e está acelerando as mudanças climáticas. Para detê-lo, o herói terá de tirar da prisão seu meio-irmão, Orm (Patrick Wilson, parceiro de James Wan na franquia Invocação do Mal), que era aliado do Arraia Negra.
O resto da história segue uma cartilha básica, com cenas de ação que evaporam da memória em instantes e com pouquíssimas surpresas para contrabalançar o tédio. Entre essas, está a divertida participação de Martin Short emprestando a voz a um bastante roliço chefão do submundo (que na caracterização, no status e no cenário remete ao Jabba the Hut da saga Star Wars). Visualmente, Aquaman 2 já não causa o estranho deslumbramento do primeiro filme, que, ao equilibrar os aspectos épicos do personagem com seu lado ridículo, proporcionou uma espécie de desfile aquático de Carnaval. Também já ficou desgastado o carisma de Jason Momoa como uma mistura de rei bárbaro e surfista marrento (ilustrada repetitivamente pelo uso de Born to Be Wild, do Steppenwolf, na trilha sonora), e a tentativa de retratar Aquaman e Orm como uma dupla cômica dá com os burros n'água. É tudo tão previsível, é tudo tão mastigado, que sabemos exatamente o que vai acontecer assim que começa a cena pós-créditos.