Pelo desempenho em A Voz Suprema do Blues, que estreou na Netflix na sexta-feira (18), Chadwick Boseman vem sendo cotado como um favorito ao Oscar 2021 de melhor ator. Seria um prêmio póstumo — o astro de Pantera Negra (2018) morreu no final de agosto, aos 43 anos, vítima de câncer colorretal —, mas os votantes da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood não estariam apenas prestando uma homenagem: na pele de seu personagem, o ambicioso trompetista Levee, Boseman tem a grande atuação de sua carreira.
Há um monólogo de cinco minutos que vale um Oscar. É quando Levee explica a sua estratégia no combate ao racismo. De repente, o sorriso malicioso e o jeito apressado de falar dão lugar a um rosto crispado e uma voz mais cadenciada. O adulto sensualizador se transforma em um garotinho assustado. Somem os sonhos de sucesso pessoal, entram as dolorosas memórias coletivas.
Se o nome de Chadwick for confirmado nas indicações, em 15 de março, e anunciado na hora da entrega da estatueta, em 25 de abril, será a 17ª vez que a Academia laureia um candidato morto antes da premiação — na verdade, alguns morreram até antes de o filme ser concluído. Foi o caso de Heath Ledger, vencedor da categoria de ator coadjuvante pelo Coringa de Batman: O Cavaleiro das Trevas (2008), que estava na pós-produção quando o australiano de 28 anos faleceu, por overdose acidental de medicamentos.
Ledger é um dos dois únicos intérpretes mortos já premiados. O outro foi o escocês Peter Finch, que levou o Oscar de melhor ator pelo âncora de um programa jornalístico de TV de Rede de Intrigas (1976). Ele morreu aos 60 anos, de ataque cardíaco, em janeiro de 1977, pouco menos de um mês antes de saírem as indicações. No filme, interpreta Howard Beale, que, depois de 25 anos no posto, é demitido. Em sua última aparição no programa, faz um discurso contundente no qual revela ao público os bastidores do canal.
Houve mais cinco atores concorrendo postumamente, começando por Jeanne Eagels, morta aos 39 anos, por overdose de substâncias químicas, indicada a melhor atriz na segunda edição do Oscar, em 1929, por The Letter.
James Dean, morto em setembro de 1955, aos 24 anos, em um acidente de carro, competiu duas vezes pela estatueta de melhor ator: em 1956, por Vidas Amargas, e no ano seguinte, por Assim Caminha a Humanidade.
Completam a lista Spencer Tracy, melhor ator por Adivinhe Quem Vem para Jantar? (1967), Ralph Richardson, ator coadjuvante por Greystoke: A Lenda de Tarzan (1984), e Massimo Troisi, que, por O Carteiro e o Poeta (1995), recebeu indicações nas categorias de ator e roteiro.
Outros destaques
- Entre os 16 prêmios póstumos, há mais alguns que merecem destaque. Walt Disney (1901-1966) ganhou seu 26º Oscar (você leu bem: 26) três anos após sua morte, como produtor do curta de animação Ursinho Pooh e o Dia Chuvoso.
- O diretor de arte William A. Horning (1904-1959) teve duas vitórias após a morte: por Gigi (1958) e por Ben-Hur (1959) — que valeu ao produtor Sam Zimbalist (1904-1958) um troféu póstumo de melhor filme. Horning concorreu ainda por Intriga Internacional (1959).
- O compositor Howard Ashman (1950-1991) também recebeu três indicações, mas pelo menos filme: A Bela e a Fera (1991), em parceria com o letrista Alan Menken. Foi premiado pela canção título do desenho animado.
- Os diretores de fotografia Geoffrey Unsworth (1914-1978) e Conrad Hall (1926-2003) foram laureados, respectivamente, por Tess (1979) e Estrada para a Perdição (2002).
Eles não ganharam
- Entre os não premiados, há alguns casos curiosos. O dramaturgo August Wilson (1945-2005), o mesmo de A Voz Suprema do Blues, foi indicado ao Oscar de melhor roteiro adaptado mais de uma década após sua morte, por Um Limite Entre Nós (2016). Um intervalo de tempo ainda maior pode ser registrado se Jack Fincher (1930-2003), o pai do diretor David Fincher, concorrer ao troféu de roteiro por Mank.
- Indicado a melhor filme, O Leitor (2008) tinha como produtores Anthony Minghella (1954-2008) e Sydney Pollack (1934-2008).
- E o célebre compositor Bernard Herrmann (1911-1975), parceiro em vários filmes de Alfred Hitchcock, recebeu duas indicações em 1977: Taxi Driver e Trágica Obsessão.