Talvez a Bélgica não esteja entre as suas viagens dos sonhos. Acho até que é um pouco negligenciada por quem visita a Europa (ou será que falo só por mim?) Demorei para incursionar por lá, da primeira vez indo só à capital, Bruxelas. Na segunda, há menos tempo, os destinos foram a surpreendente Ghent (ou Gent, ou Gand) e a mais popular, mas não menos interessante, Bruges.
Com pouco mais de 11 milhões de habitantes, população equivalente à do RS, a Bélgica é um dos países mais densamente povoados da Europa (363 hab/km² contra os 232,24 km² da Alemanha ou, se quiser uma comparação mais local, os 42,5 hab/km² do RS) e faz fronteira com França, Alemanha, Holanda e Luxemburgo. No país há três comunidades diferentes (flamenga, francesa e a germanófona) e três idiomas oficiais (holandês, francês e alemão), o que torna tudo mais diverso.
Diversidade, aliás, também é a palavra quando se fala de turismo, lazer e cultura – dos passeios de bicicleta às visitas a castelos e pequenas vilas, de caminhadas em florestas a feiras de antiguidades, dos festivais de música aos eventos e exposições internacionais.
Este texto destaca duas cidades citadas lá no início, mas Bruxelas, uma das sedes do Parlamento Europeu, com um importante conjunto de arquitetura Art Nouveau, não deve ser deixada de lado. Das exposições temporárias às permanentes, não esqueça que a Bélgica é terra de artistas e pintores como Rene Magritte (a visita ao seu museu é indispensável) e criadores como Hergé, que deu vida a Tintim (conheci um pouco mais da história no Belgian Comic Strip Center). Sim, é a terra da cerveja, dos queijos, da batata frita e do chocolate, mas eu destacaria, pelo menos em Bruxelas, os doces árabes: as vitrines parecem de joalherias. Antes que eu me estenda mais, vamos aos recortes:
Ghent
Minha base nesta viagem, a cidade surpreende pela vitalidade e pela iluminação cênica criada por designers. Como não está entre as principais opções turísticas da Bélgica, não à toa ela apela aos visitantes que permaneçam “mais de uma noite”. Sem saber do slogan, fiquei. Aqui não é preciso andar muito para dar de cara com o Castelo dos Condes, construído em 1180 e hoje bem no miolo de Ghent, ou para surpreender-se, não muito longe, com o moderno prédio da biblioteca universitária, erguida sobre um canal nos anos 2000. Por todo lado, grafites convivem com prédios medievais, sem agredi-los.
Essa mistura a deixa vibrante sem tirar-lhe o ar de tranquilidade. Além do já citado Castelo dos Condes, visita obrigatória, eu quis ver o painel (na verdade, um total de 18 painéis) conhecido como A Adoração do Cordeiro Místico, dos irmãos Van Eyck, de 1432, uma das maiores obras de arte já produzidas, na Catedral de São Bavão. Na mesma praça, subindo ao Campanário, no alto do qual fica o dragão símbolo de Ghent, vê-se a cidade quase inteira. Acho que não mencionei que a comida, na Bélgica, é celebrada de maneira especial – é um dos pontos onde há mais restaurantes com estrela Michelin por metro quadrado...
Mas você não precisa ir tão longe. Mesmo nos lugares mais simples come-se muito bem, dos cones de papel com batatas e legumes aos waffles. Ah, um presente ou lembrança especial pode ser um potinho de cerâmica com a celebrada mostarda produzida aqui. E ainda que possa torcer o nariz, literalmente, para eles, é preciso provar os “cuberdons”, balas de goma arábica em formato de nariz – a mais tradicional, arroxeada, vem no sabor framboesa.
Bruges
O centro histórico inteiro foi tombado como Patrimônio da Humanidade pela Unesco em 2000, após vários prédios merecerem a distinção em anos anteriores – arquitetos costumam chamar a atenção para a unidade visual da cidade, sem ruídos ou deturpações. A peculiar rede de canais que faz sua ligação com o mar lhe deu o título de “Veneza do Norte”. Bruges é tão arrumadinha que parece de mentira.
A primeira bolsa de valores (em frente à casa dos comerciantes “Van der Beurse”) nasceu aqui e ela chegou a ser um dos centros comerciais mais importantes da Europa. Apesar disso, a cidade foi abandonada e entrou em decadência, mas ressurgiu no século 19 e, mesmo tendo sido base para os nazistas na Segunda Guerra, acabou poupada da destruição. Para além do patrimônio arquitetônico, em Bruges é valorizado o patrimônio imaterial, como as procissões (desde 1304, um desses eventos transporta a relíquia do Sangue Sagrado pela cidade) e a arte flamenga. Outro espetáculo tradicional é ouvir os carrilhões do Campanário, na Praça do Mercado, também tombado.
Por último, mas não menos importante, a cerveja é igualmente patrimônio imaterial (na cidade, há duas cervejarias e um museu da cerveja, e nos arredores há cervejeiros artesanais). Como eu passei um dia apenas, o que é sempre pouco, degustei cervejas no 2Be, na área conhecida como Rozenhoedkaai, que concentra a maioria dos bares e restaurantes e é um lugar lindo para se estar e fotografar.