A primeira reação do presidente Jair Bolsonaro ao saber da prisão preventiva do ex-ministro da Educação Milton Ribeiro indica que ele vai jogar aos leões o pastor por quem, em março, botaria não só a mão, mas “a cara no fogo”. Em entrevista à Rádio Itatiaia, de Minas Gerais, Bolsonaro disse algumas coisas óbvias, mas que contrastam com a defesa cega que fazia do ex-ministro. Em síntese, disse que Ribeiro deve responder por seus atos (óbvio), que se a polícia prendeu é porque tinha alguma coisa contra ele (óbvio) e que o ex-ministro “estaria com uma conversa informal demais com algumas pessoas de confiança” (lero-lero, porque o foco da operação é a cobrança de propina por dois pastores e não uma conversa informal).
Foi o próprio Bolsonaro quem admitiu que a prisão do ex-ministro respinga nele. Eis a frase textual, para que não se diga que a declaração foi tirada do contexto:
— Se tem prisão, é PF, é sinal que a PF está agindo. Que ele responda pelos atos dele. Peço a Deus que não tenha problema nenhum, mas se tem problema, a PF está agindo, está investigando. É sinal que eu não interfiro na PF, porque isso vai respingar em mim, obviamente.
Vai respingar, obviamente, porque foi a descoberta de um gabinete paralelo no Ministério da Educação a causa da queda de Ribeiro. À época, o Centrão pressionava pela demissão, já convencido de que se continuasse no cargo Ribeiro seria um peso morto na campanha, mas Bolsonaro resistia em afastar seu quarto ministro da Educação e dizia que o pastor estava sendo “vítima de uma covardia”.
É fato que um presidente não tem como saber de tudo o que se passa nos gabinetes dos 23 ministros e de centenas de secretários, mas no caso do tráfico de influência no MEC existe uma gravação do próprio Ribeiro dizendo que dava preferência na liberação de verbas às prefeituras indicadas pelos pastores Gilmar Santos e Airton Moura, a pedido de Bolsonaro. Os dois eram lobistas e, de acordo com a denúncia de prefeitos, cobravam propina para liberar verbas do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação. Propina em dinheiro, em barras de ouro e na compra de bíblias superfaturadas, uma educação com foto do pastor Milton Ribeiro. O nome disso é corrupção.
A simplificação feita por Bolsonaro na entrevista à Itatiaia chega a ser risível, dada a abundância de material publicado em março sobre o escândalo:
— Pelo o que estou sabendo, é aquela questão que ele estaria com uma conversa informal demais com algumas pessoas de confiança dele. Houve denúncia de que ele teria buscado prefeito, gente dele, para negociar, para liberar recursos, isso e aquilo.
O episódio da prisão do ex-ministro (que tende a ser revogada a qualquer momento) não é nem o mais grave no Ministério da Educação de Bolsonaro. É o absoluto descaso com a área mais importante de um país em desenvolvimento, a omissão durante a pandemia, o tratamento desrespeitoso com as universidades, a falta de apoio à pesquisa, o obscurantismo em relação aos temas que deveriam ser o foco da pasta.
Desde o primeiro ministro, o colombiano Ricardo Vélez Rodrigues, o dedo podre de Bolsonaro só escolheu pessoas despreparadas para o cargo. O que parecia mais afeito à área durou poucas horas porque resolveu enfeitar o currículo com títulos fictícios e acabou desmascarado. Abraham Weintraub, que saiu de fininho rumo aos Estados Unidos e hoje desafeto do governo, não resta qualquer lembrança positiva. O MEC sob Bolsonaro é uma página borrada que agora, com a Operação Acesso Pago, vira caso de polícia.
ALIÁS
Entre as postagens de Ribeiro no Twitter, chama a atenção uma de 9 de setembro de 2021. O ex-ministro publicou uma foto ao lado de Bolsonaro e escreveu: "Orgulho em fazer parte de um governo que não é corrupto".