Mais de 48 horas depois de o mundo assistir à invasão da Ucrânia, o medo agora é de que a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) seja tragada para a guerra no Leste Europeu, o que poderia resultar em um confronto direto entre países da aliança militar do Ocidente e a Rússia. Durante toda a sexta-feira (25), enquanto Kiev sofria intensos bombardeios e tropas russas avançavam pelas ruas enfrentando resistência maior do que o esperado pelo Kremlin, o clima em diferentes partes da Europa era de preocupação com o risco de transbordamento do conflito para além das fronteiras ucranianas.
Na Alemanha, onde GZH fez escala em Frankfurt antes de chegar a Varsóvia (Polônia), o governo planeja oferecer soldados, sistemas de defesa aérea e navios para fortalecer países do Leste Europeu. Seria possível enviar rapidamente pelo menos 150 militares e 10 blindados para nações como Polônia e Hungria, além de deslocar as embarcações que atualmente estão no Mar Mediterrâneo para a região do Mar Negro.
Enquanto a principal economia da União Europeia fazia cálculos sobre o tamanho do apoio, quem tomou a frente foi a Polônia, país vizinho à nação em guerra e com quem divide uma extensa fronteira que se tornou, nas últimas horas, refúgio de milhares de ucranianos em fuga. O ministro da Defesa polonês, Mariusz Błaszczak, confirmou a remessa de um comboio com munição ao país em guerra, tornando-se o primeiro carregamento de ajuda militar publicamente reconhecido para a Ucrânia desde o início da invasão russa. No entanto, não se sabe o tipo de munição a Polônia enviou aos ucranianos nem a quantidade.
A mobilização da Otan em apoio à Ucrânia pode melindrar o presidente Vladimir Putin, que já afirmou que "quem tentar interferir (na questão ucraniana) sofrerá consequências nunca vistas". O presidente ucraniano, Volodimir Zelensky, conversou com líderes poloneses nesta sexta-feira (25) para tentar maior auxílio por parte dos países do Leste Europeu e, assim, levar a Rússia à mesa de negociações.
Os governos dessa região nos arredores da Ucrânia (Polônia, Estônia, Letônia e Lituânia) acionaram o artigo 4 da Otan, pelo qual são lançadas consultas entre os membros para uma ação coletiva: "As partes se consultam sempre que, na opinião de qualquer membro, a integridade territorial, a independência política ou a segurança estão ameaçadas", explica a organização, em seu site. Essa ferramenta é diferente do artigo 5, segundo o qual "um ataque contra um membro é entendido como um ataque contra todos".
O secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg, disse nesta sexta-feira que a aliança "fará o que for preciso" para defender todos os seus aliados e "cada centímetro do território da Otan", confirmando que uma Força de Resposta (NRF) foi ativada pela primeira vez como efeito da invasão da Ucrânia pela Rússia.
— Isso vai muito além da Ucrânia, trata-se de como a Rússia está realmente desafiando e contestando os valores fundamentais de nossa segurança e exigindo que a Otan retire todas as forças e infraestrutura de quase metade de nossos membros — disse Stoltenberg. — Temos de levar isso a sério, e é exatamente por isso que agora estamos mobilizando a Força de Resposta da Otan pela primeira vez em um contexto de defesa coletiva — acrescentou.
A ativação das tropas de resposta não significa que quaisquer militares dos Estados Unidos ou da aliança irão para a Ucrânia. O presidente dos EUA, Joe Biden, até agora, tem deixado claro que não enviará forças americanas para o país em guerra - seus militares estão sendo deslocados de nações vizinhas do Leste Europeu para ajudar a fortalecer os parceiros de Otan temerosos com as ações agressivas da Rússia.
Falando durante uma coletiva de imprensa após uma rara reunião de chefes de estado e de governo da Otan em Bruxelas, Stoltenberg esclareceu que, embora EUA, Canadá e aliados europeus tenham “posicionado milhares de tropas adicionais” para o Leste Europeu, a Otan não está mobilizando toda a força de resposta.
— Temos mais de cem jatos em alerta máximo, operando em mais de 30 locais diferentes e mais de 120 navios — disse Stoltenberg.
O clima de medo de uma guerra total na Europa (e não circunscrita à Ucrânia) aumentou à noite, quando a Agência de Segurança da Aviação da União Europeia (EASA) decidiu dobrar o tamanho da zona de alerta ao redor da Ucrânia, temendo “mísseis de médio alcance penetrando no espaço aéreo controlado”. A entidade disse que a área expandida agora leva em consideração o “risco representado pela ameaça de lançamentos de mísseis de e para a Ucrânia”.
A ameaça é real: em 2014, o voo 17 da Malaysian Airlines foi abatido sobre o leste da Ucrânia por um míssil terra-ar, matando quase 300 pessoas a bordo. Autoridades ocidentais e uma investigação liderada pela Holanda disseram que o governo Putin foi responsável pelo incidente. A Rússia nega.
No início da noite desta sexta-feira, quando GZH desembarcou no Aeroporto Frédéric Chopin, em Varsóvia, havia pouco movimento. A Polônia é uma espécie de caixa de ressonância do que ocorre na Ucrânia - especialmente por ser vizinha à região até agora mais poupada pelos ataques russos, que, em geral, são feitos a partir do Leste (da própria Rússia), do Sul (Crimeia anexada) e do Norte (Belarus).
É pelo Oeste que a maioria dos refugiados está fugindo. Culturalmente, Polônia e Ucrânia são muitos próximos. A Polônia tem a maior comunidade ucraniana da região, com cerca de 1 milhão de pessoas - espera-se que esse número dobre com a chegada dos refugiados. As autoridades disseram que o tempo de espera para cruzar a fronteira tem variado entre seis e 12 horas em alguns lugares.
Em relação a quem mora aqui, a orientação do governo às famílias é para que mantenham o tanque de combustível do carro cheio e que se tenha dinheiro em espécie em casa. Os valores de saque nos caixas eletrônicos são limitados, principalmente nas regiões próximas à fronteira com a Ucrânia.
Mais de 50 mil refugiados deixaram a Ucrânia em menos de 48 horas, informou hoje o alto comissário para refugiados da Organização das Nações Unidas (ONU), Filippo Grandi, em uma publicação nas redes sociais. Segundo o diplomata, a maioria dessas pessoas se dirigiu para a Polônia e a Moldávia.