Anunciado como "um plano de paz entre Israel e Palestina com proposta de dois Estados", o projeto que Donald Trump exibiu ao mundo nesta terça-feira (28) não passa de um rascunho superficial, incapaz de atender às complexidades das questões exigidas pelo Oriente Médio. O projeto, pelo pouco que foi apresentado, está longe de um mapa do caminho para uma paz duradoura entre israelenses e palestinos. Ao contrário, atiça ainda mais rivalidades históricas devido a suas lacunas e contradições.
Não se pode brincar com temas como o status de Jerusalém, a Cidade Sagrada para três religiões monoteístas — cristãos, judeus e muçulmanos — e um dos principais pontos de divergência entre palestinos e israelenses. E Trump brincou. Ao anunciar seu plano, disse que Jerusalém se manterá como "capital não dividida de Israel". Depois, olhou para o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu e tascou:
— Mas eu já fiz isso para você, não é?
Ele referia-se à transferência da embaixada americana de Tel Aviv para Jerusalém, postura seguida apenas por Guatemala e Paraguai e criticada pela comunidade internacional.
Além da falta de noção geopolítica embutida na gafe, a contradição fica por conta do anúncio de que pretende inaugurar uma segunda embaixada na cidade, justamente em Jerusalém Leste, área reivindicada pelos palestinos como capital de seu futuro Estado. Afinal, qual o status para a cidade que Trump está propondo?
As imprecisões e os hiatos do plano foram preenchidos por frases de palanque – não a toa de dois líderes cujas carreiras políticas estão ameaçadas – Trump com o impeachment e Netanyahu respondendo na Justiça por corrupção. Uma dessas frases partiu do premiê israelense, que afirmou que os refugiados palestinos não terão direito de voltar a Israel.
A questão é outro dos pontos complexos do impasse entre os dois povos. Para os palestinos, o direito ao retorno de centenas de milhares de pessoas que fugiram ou foram expulsas durante a guerra de 1948, após a criação do Estado de Israel, é fundamental de sua causa. Israel afirma que, se permitir o retorno, o país se tornaria mais islâmico do que judeu – o que é verdade.
O plano que Trump chama de "acordo do século" é puramente unilateral porque não contou com nenhum representante dos palestinos – porque não quiseram, o que também é verdade. A Autoridade Nacional Palestina (ANP) rompeu com os EUA desde o episódio da transferência da embaixada.
Não se pode considerar essa terça-feira um dia histórico. O anúncio de Trump não está a altura de iniciativas como a do democrata Bill Clinton, que mediou em 2000 as negociações de Camp David, entre Ehud Barak e Yasser Arafat, ou do republicano George W. Bush, o primeiro presidente americano a falar na criação de um Estado Palestino.
Eleitoreira – EUA e Israel realizam pleitos este ano –, a proposta pode incendiar o Oriente Médio ao dinamitar bases mais profundas da tentativa de coexistência entre os dois povos: os acordos de Oslo, que renderam o Nobel da Paz a Yitzak Rabin, a Shimon Peres e a Yasser Arafat e que, até agora, senão garantiram a desejada paz ao menos evitaram uma guerra total.