Primeiro, pausa para um suspiro.
Não entramos na Terceira Guerra Mundial na tarde desta quarta-feira (8).
Agora, mais aliviados, vamos à análise: acompanhado pela cúpula militar, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, estava incrivelmente calmo em seu primeiro pronunciamento após os ataques contra as bases americanas no Iraque, realizados na madrugada desta quarta-feira (terça pelo horário de Brasília). Cercado de expectativa, o discurso, que durou 10 minutos, serviu para Trump colocar panos quentes na crise, falar como estadista e sair por cima da situação — ao menos a curto e médio prazos, suficientes para a reeleição, em novembro.
Para os americanos, saiu barata a reação iraniana. Nenhum militar foi morto, segundo Trump, que confirmou o que já se suspeitava: um aviso prévio permitiu a dispersão das forças nas bases de Al-Asad e Erbil.
A frase que fez o mundo respirar aliviado foi a seguinte: "Parece que o Irã está se acalmando". Está claro que o Pentágono, ao colocar na balança a eliminação do general iraniano Qassem Soleimani ("o maior terrorista do mundo", nas palavras do presidente) e a destruição de algumas estruturas nas unidades militares, considerou a manobra dos últimos dias uma vitória.
Trump primeiro falou como estadista. Depois, como candidato: atacou o acordo nuclear costurado durante o governo do democrata Barack Obama, com o aval de Rússia, China, União Europeia e ONU, e que, segundo o republicano, mostrou-se fraco. E engrossou a voz ao deixar a porta aberta para novas medidas contra os aiatolás: "continuamos a avaliar respostas" e novas sanções econômicas.
A ponderação já havia sido percebida nas primeiras manifestações pelo Twitter, ainda na noite de terça-feira (7), quando Trump afirmou que "tudo está bem" e adiou para quarta-feira o pronunciamento. O fato de não haver mortes na reação iraniana certamente pesou para o degelo: diante de novas imagens de caixões com a bandeira americana embarcando do Iraque, provavelmente a resposta seria recalculada.
A porta para o desescalada da tensão já havia sido aberta pelo chanceler iraniano, Mohammad Zarif, que, pelo Twitter, passou a ideia de que Teerã considera a morte do general Soleimani vingada com as "represálias proporcionais", nas palavras do governo. O argumento de Zarif é de que o país tomou medidas de defesa previstas no artigo 51 da Carta das Nações Unidas.
A situação ficou conveniente tanto para Trump quanto para os aiatolás. O americano, a 10 meses da eleição, sai como estadista, defensor da América e o responsável pela eliminação de um alto oficial iraniano responsável por ações no Exterior. Tudo isso sem precisar reengajar tropas dos EUA no Oriente Médio – isolacionista, Trump defendeu exatamente esse discurso de campanha de 2016, confirmado no pronunciamento desta quarta-feira: "Não precisamos do petróleo do Oriente Médio".
Os aiatolás, por sua vez, também saem fortalecidos internamente, podem bancar os fortões para o público interno. Um ataque externo costuma amalgamar a população – e calar críticos. A resposta iraniana não foi proporcional à perda do general. Mas, como não há liberdade de imprensa no Irã, o que o regime dos aiatolás disserem para sua população será aceito pela maioria. Seus militares, afinal, enfrentaram o grande Satã em uma ação de guerra direta, convencional, com o uso de foguetes e mísseis. E isso não é pouco.
Esta é uma análise a curto e médio prazo. A longo, a decisão americana de eliminar Soleimani trará novas consequências nem tão otimistas para os interesses estratégicos americanos na região. O Iraque está praticamente entregue aos xiitas, à influência do Irã e da Rússia, que já manda e desmanda na Síria. As cenas dos próximos capítulos da crise, que obviamente não termina aqui, trarão pressões para que os americanos deixem definitivamente o Iraque.