Depois de mais de um mês de espera, a leitura preliminar do pacote de corte de gastos decepcionou economistas, deixou perplexos especialistas em contas públicas e frustrou o mercado. A tradução imediata foi o novo recorde nominal histórico do dólar, que alcançou R$ 5,912. O que era para ser um pacote teve como primeira impressão um embrulho.
O que mudou a relativa boa vontade com que se esperava o pacote foi a informação de que incluiria isenção de Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil. A explicação é matemática: para redução de despesas ao redor de R$ 35 bilhões ao ano, haveria perda de receita estimada em até R$ 70 bilhões anuais. O detalhamento ficou para a quinta-feira (28).
A leitura foi de que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva fez uma escolha política e populista. Há dias, havia se queixado que o corte não poderia atingir apenas o "andar de baixo". Até aí, mesmo o plano B que vai disputar com o pacote o formato do ajuste fiscal reconhece. Mas daí a fazer uma cortina de fumaça com esse teor tóxico é outra história. A função do anúncio de isenção seria desviar a atenção para o menor reajuste do salário mínimo.
A primeira consequência dessa escolha de Lula é o desgaste do fiador do ajuste, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Ficou claro que a equipe econômica era contrária à mistura das estações – corte de gastos com uma mão, perda de receita com outra. E ainda coube a Haddad, com a fidelidade zen que lhe é peculiar, fazer anúncio tão medonho.
A segunda é o risco de contratar uma crise: o salto do dólar vai pressionar ainda mais a inflação, por consequência, o juro e em seguida, elevar ainda mais o endividamento que já preocupa dentro e fora do Brasil.
Tem nuances? Tem. A isenção pode estar embutida em outra manobra política. A fonte para compensar a perda de receita seria a taxação de quem tem renda superior a R$ 50 mil por mês. E uma coisa seria condicionada à outra. Então, se o Congresso não aprovar a taxação, não haverá isenção. De quebra, o governo ganha uma distração para o ponto crucial do pacote, que é a limitação do aumento real do salário mínimo a 2,5%.