
Seja ponto de encontro para um café, para garantir o pão do dia seguinte ou ainda para ter uma experiência mais demorada e completa, o fato é que as padarias são parte da rotina e da memória afetiva dos caxienses. Os perfis variam: enquanto algumas carregam a essência familiar e a fama por determinado produto, outras inovam no cardápio e no ambiente para se adaptarem aos novos desejos da clientela.
Conforme dados da Receita Federal, o município soma 858 estabelecimentos com CNPJ ativo neste segmento. Desses, 618 têm predominância de produção própria e outros 240 são voltados para a revenda de produtos. Os bairros que centralizam mais padarias e confeitarias são o Esplanada, Desvio Rizzo, Santa Fé, Centro e Santa Catarina.
A gestora de projetos de gastronomia do Sebrae RS e mestra em Ciência e Tecnologia de Alimentos, Micheli Maria Bueno, observa que, especialmente na área central de Caxias do Sul, os conceitos de padaria e de lancheria se confundem. São estabelecimentos que podem ser considerados pontos de passagem e atendem, principalmente, os trabalhadores que buscam por um café quentinho, um sanduíche ou um salgado antes de iniciar a jornada diária ou para um lanche nos intervalos do trabalho.
— É um tipo de empreendimento muito típico, muito da cultura da região, que pode ser observado na extensão da Avenida Itália, da Sinimbu e da Avenida Júlio de Castilhos — comenta Micheli.
Já as padarias consideradas tradicionais resistem ao tempo e à concorrência dos supermercados e, como aponta Micheli, são caracterizadas por "resolver a vida das famílias", do café da manhã ao café da tarde:
— São aquelas que fazem os pães, os bolos, os produtos padrão, que atendem a necessidade do dia a dia do consumidor. Também tem uma parte de fiambres e itens de empório — detalha a profissional do Sebrae.
Em uma ponta mais contemporânea do segmento estão centradas as padarias caracterizadas como especiais. São ambientes com características similares aos de cafeteria, cujos produtos têm maior valor agregado e reforçam o conceito de oferecer uma experiência ao consumidor.
— São padarias que captam o público "do eu mereço, eu me permito, esse é o meu momento de lazer". Esse tipo de negócio tem um investimento menor, porque muitos dos produtos que estão ali são de finalização. Eles fazem parcerias com outros estabelecimentos que têm já know-how para fazer os itens. Há uma outra ambiência, a proposta é que o cliente fique mais tempo lá, que converse... — explica Micheli.
Massa folhada por ficha de ônibus e bolo para filme nacional: as histórias da Confeitaria Flórida

Mais do que um negócio que produz um alimento milenar, as padarias ocupam um lugar de apreço na vida dos consumidores.
— Existe um valor emocional nestes estabelecimentos, porque são lugares onde se criam relações. Vemos padarias em que o avô comprava e hoje os netos frequentam — evidencia a gestora de projetos de gastronomia do Sebrae RS, Micheli Maria Bueno.
É o caso da Confeitaria Flórida. Localizado em um ponto privilegiado, na Rua Os Dezoito do Forte, no bairro São Pelegrino, o estabelecimento já viu gerações de clientes nos últimos 46 anos. Consumidores atraídos pela farta variedade de tortas, doces, salgados ou ainda as famosas massas folheadas e empadinhas de frango — itens preferidos do cardápio, segundo os administradores.
Feita com creme artesanal, na própria cozinha da confeitaria e sem preparações prontas, a massa folheada é quase um patrimônio do estabelecimento. A receita, mantida desde os primórdios, conquistou tanto os consumidores que ainda há quem ligue só para saber se o produto já está à venda no balcão.
— Teve uma época que a gente trocava ficha de ônibus por massa folhada — relembra o confeiteiro Gilmar Malgarezi, que, dos 49 anos de vida, 33 são dedicados ao empreendimento familiar.
Dentre as outras histórias que habitam a memória dos empreendedores está a fabricação de um bolo que aparece em uma das cenas do filme brasileiro O Quatrilho, de 1995.
— Pediram para a gente fazer um bolo bem simples que representasse a época — recorda um dos sócios da confeitaria, Nelson Bareta Junior.

Com apelo considerado ainda tímido nas redes sociais, a Flórida aposta na propaganda boca a boca para manter as vendas em alta. Outros segredos, dizem os administradores, são os produtos sempre fresquinhos, o bom atendimento e a empatia com as necessidades do consumidor:
— Se o cliente não encomendou, mas precisa de uma torta, nós pedimos para ele esperar uns minutinhos e montamos na hora. Como os cremes são feitos semanalmente, conseguimos ter essa facilidade — diz o gastrólogo Lucas Giacomelli dos Santos Bareta.
— Tem que servir o cliente. No momento que ele entrou na loja, tem que sair com o seu produto — ensina o confeiteiro Gilmar.
Além dos produtos do balcão, a Confeitaria Flórida atende a empresas, eventos e jogos da dupla Ca-Ju, com uma equipe de 13 funcionários e três sócios.
Aposta na panificação artesanal

A produção atual de cerca de 10 toneladas de pão por mês e as três unidades estabelecidas em Caxias do Sul em pouco lembram o início tímido e corajoso do padeiro Rodrigo Gomes, fundador da Pane & Salute. Carioca, ele deixou o cargo em uma indústria caxiense para se dedicar ao hobby que fazia o coração pulsar: a gastronomia.
Foi no forno de casa e vendendo para vizinhos e amigos que surgiu o gosto pela panificação e o sucesso da marca, reconhecida na cidade pela fabricação de pães artesanais.
— Eu não tinha dinheiro pra montar um restaurante e achei que padaria ia dar. Eu realmente não sabia onde eu estava me metendo (risos). Fui fazendo, fui crescendo, comprando um item por vez e aí chegou uma hora que em casa não dava mais. Foi um passo por vez e hoje dou consultoria, ajudo as pessoas abrirem seus negócios — conta Gomes, que abriu o negócio em 2013 e atualmente lidera 21 funcionários.
Com o desejo de oferecer um alimento mais saudável, a Pane & Salute é especializada em pães de fermentação longa e natural, que exigem um descanso mínimo de cerca de 16 horas em câmara fria — alguns podem ficar até dois dias no local. Na prática, o produto que chega à mesa do cliente é mais leve, saboroso e oferece mais saciedade e melhor digestão.
O carro-chefe do empreendimento é o pão italiano, seguido pelo croissant laminado com manteiga. As vendas no balcão respondem por 70% da demanda, mas também há comercialização para rede de hotéis, pousadas e restaurantes. Toda a fabricação ocorre na unidade da Avenida Júlio de Castilhos, onde está instalada a cozinha e um forno de lastro, onde o alimento é assado diretamente na pedra.
— A nossa variedade de pão é grande, tem dias que chegamos a oferecer mais de 12 tipos, de vários sabores, recheados com azeitona, com gorgonzola, com outros tipos de queijo — comenta o padeiro.
O segredo geracional da Rio Branco

— Com oito aninhos eu já atendia no balcão. Então, está no sangue. Aliás, não é sangue, aqui corre farinha!
A fala bem-humorada do diretor da Panificadora e Confeitaria Rio Branco, Pedro Ciro Mantovani, reflete um dos princípios que regem o empreendimento familiar há mais de 60 anos: oferecer um bom atendimento aos consumidores.
Da mensagem positiva que acompanha o cafezinho aos sorteios surpresa realizados nas três padarias da marca, o objetivo é encantar quem chega em busca de um lanche, de uma fatia de torta ou mesmo o tradicional pão, que é fabricado e vendido em diferentes versões.
— A Rio Branco faz parte da história de Caxias e nasceu no bom atendimento, no produto de qualidade. O nosso lema, inclusive, é 'feito com amor'. As pessoas querem vir aqui e conversar com nosso vendedor, querem ser lembradas e chamadas pelo nome — sinaliza Montovani.
Fundada em 1962 por Thomaz Mantovani, pai de Pedro, a Rio Branco reflete o conceito de padaria tradicional e familiar. O empreendimento está indo para a terceira geração, com a filha do atual diretor, Daniela Mantovani, se unindo à administração do negócio nos últimos anos.
— (Daqui para frente) é preparar a sucessão e manter a tradição e a longevidade da marca. É um desafio, porque sou muito centralizador, mas estou aprendendo e sei que tenho que ir abrindo mão aos pouquinhos — confessa o diretor.
Além das três padarias, o empreendimento conta com uma fábrica que atende a demanda do próprio negócio e de mercados da Serra e da Região Metropolitana de Porto Alegre. São cerca de 120 funcionários em toda a operação.